"Alina"
Em meus longos dias a bordo do Vingança Real, tendo explorado cada centímetro do navio, nunca me atrevi sequer a chegar perto da cabine do capitão. Sei que sempre fui um pouco levada, agitada e curiosa, mesmo para a minha idade, mas nunca consegui ficar parada num lugar só, sempre busquei por um pouco de aventura e até mesmo pode-se dizer que possuo certo gosto pelo perigo, a animação de correr riscos, se arriscar e conquistar um objetivo, é uma sensação que eu sempre busquei, explorar o desconhecido, e ser acolhida em um navio, pirata ainda por cima, era uma aventura que ninguém poderia imaginar.
Sim, eu sempre soube os boatos, sempre ouvi histórias de saques e os ataques que muitos piratas ao longo dos anos vinham fazendo e cheguei a conhecer pessoas que sobreviveram a esses acontecimentos. Quando me foi dada a chance de fazer parte disso, tudo em meus instintos me mandavam me afastar e sair correndo como sempre fiz, mas meu corpo sozinho não se movia. Aceitei a proposta que me foi feita e mesmo possuindo total conhecimento dos riscos que isso representaria à minha vida, não tinha o porquê de negar.
Não há ninguém me esperando em terra firme, ninguém para retornar e dizer "cheguei" ao abrir a porta da entrada e muito menos um lar para qual eu pudesse regressar.
Talvez tivesse exagerado nesses últimos tempos, agindo de forma muito imprudente e causado problemas ao Capitão Jones, então tudo o que poderia fazer era encará-lo de frente como outrora e ouvir tudo o que ele tem a dizer.
Diante da porta, levei minha canhota a madeira de Teca, desferindo três batidas leves na mesma.
— Entre Alina. — Era a voz do capitão.
Respirei fundo e dirigi a mesma mão para a maçaneta.
Pela primeira vez, a porta que vivia trancada estava aberta para mim. Não posso negar que sempre estive curiosa para saber como era a cabine do capitão, como era o espaço que o velho Lorde do Mar escondia.
Ao abrir a porta, meus olhos ficaram abismados com tamanha simplicidade. Talvez eu fosse apenas uma garota inocente que acreditava que o seu capitão era algum tipo de ser sobrenatural pelas coisas que ouvia, mas a cabine não se diferenciava de um quarto, talvez com um escritório como diziam os mais afortunados nas ruas das cidades.
Uma grande mesa de madeira escura, talvez feita em carvalho, com entalhes que fariam qualquer um que apreciasse esse tipo de coisa pensar estar diante de uma obra de arte, um trabalho de marcenaria da melhor qualidade que já vi.
— Feche a porta. — Disse o capitão, com sua voz rouca e desgastada pela idade, me encarando seriamente enquanto ainda sentado à própria mesa com os braços apoiados em sua cadeira.
Obedeci, fechei cuidadosamente a porta atrás de mim e me dirigi a ele.
— Sente-se... — Dizia mais uma vez imponente.
Meu corpo não conseguia reagir de forma contraria a sua vontade. Diferente de todas as vezes que o capitão e eu conversamos, nunca me senti tão indefesa, tão fraca e vulnerável como neste momento.
Caminhei em passos curtos, ainda um pouco atônita, e por fim me sentei na cadeira diante do mais velho.
Não sei dizer quanto tempo passou, quantos segundos ou se ficamos minutos nos encarando reciprocamente em um silencio ensurdecedor. Seu olhar parecia penetrar em minha alma. Apenas podia dizer que ainda estava viva graças aos meus outros sentidos e ao forte cheiro de incenso que queimava noutra mesa diminuta logo atrás do pirata, gerando uma fumaça que parecia ser um nevoeiro denso.
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A Coroa do Mar
FantasíaToda Dinastia tem um início, mas tudo aquilo que começa em algum momento deve chegar ao fim. Num mundo onde a política entre Reinos, Impérios e Nações Livres se ameaçam constantemente, manter o equilíbrio e a paz se torna cada vez mais um desafio, p...