05. Almas gêmeas

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ANTES

Não liguei para Simone. O que eu iria dizer?

Oi Simone, estou ligando porque não consigo parar de pensar no quanto você é incrível e como desejo encontrar você novamente.

Mas também seria hipocrisia da minha parte negar que todos os dias eu olho para o post-it que colei na porta da geladeira. Pelas manhãs, quando preciso fazer meu lanche, rebobino, no mínimo três vezes, a ideia de ligar.

Hoje eu tenho um encontro com uma cliente em uma doceria aqui do bairro. Fiquei de mostrar para ela o meu trabalho e, quem sabe, fechar mais um contrato. Então, não tive tempo de divagar olhando para o poema e o número de Simone estampado na minha geladeira.

Coloco um macacão azul escuro, um cinto no mesmo tom e uma camisa manga longa de tecido tricoline, que coloquei por cima para compor o look. Nos pés, um salto fino bege.

Pego meu carro estacionado na garagem do prédio e saio em direção ao trabalho.

Quando adentro a doceria, Liana já me espera sentada em uma mesa perto da janela de vidro. Deixo um beijo de cada lado do seu rosto e sento na cadeira da frente.

Retiro da bolsa o meu portfólio e entrego nas mãos de Liana para que ela veja exemplos do meu trabalho. Observo o sorriso surgir em seus lábios e sei que o contrato já está fechado. Questão de meia hora depois, já estamos combinando o local e a data das fotos.

Liana despede-se de mim, pois deveria comparecer em um evento beneficente dentro de algumas horas.

Aproveito que estou na melhor doceria do mundo, na minha opinião, e me dirijo ao caixa para realizar meu pedido habitual de um brownie, uma fatia de torta de morango e uma mini torta de pão‐de-ló.

— Oi, menina Soraya! Você me tinha abandonada, fazia tempo que você não aparecia.

Solange é a dona do lugar. Ela está aqui desde que me conheço por gente e é a responsável por fazer as delícias expostas na vitrine.

— Ain Solange, que saudades de você — me debrucei na bancada para deixar um beijo estalado na bochecha de Solange — Minha vida tá um correria, você me perdoa?

— Eu vou pensar se perdoo — ela aperta a minha bochecha, com um sorriso enorme na cara — se você aceitar um macaron de brinde.

— Mai' eu não sou nem doida de não aceitar.

Dei um sorriso maior do mundo e Solange disse que eu fosse me sentar que alguém levaria meu pedido.

Você não ligou! — a voz rouca ressoa atrás de mim.

Sinto um tremor passar por todo o meu corpo. Não era possível que até nos momentos que eu não pensava nela, Simone dava um jeito de aparecer.

Respiro fundo e decido virar para encarar a mulher que eu desejei ver durante todos esses dias.

Giro o corpo lentamente e perco um pouco do fôlego quando me deparo com o olhar de Simone. Minha cabeça cheia de poesia não me permite fugir do clichê de delirar olhando nos olhos dela, porque a deusa da minha rua tem os olhos onde a lua costuma se embriagar.

— Oi — paro constrangida, a alguns passos de distância dela.

Minha reação ridícula diante da presença dela a faz sorrir.

— Esperei sua ligação — ela fala ao passo que se aproxima mais de mim.

Dou de ombros, como se eu não tivesse me importado com o número de telefone e o poema que estão colados na geladeira da minha casa.

Com amor, Simone.Onde histórias criam vida. Descubra agora