15. mudanças.

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— Eu não consigo entender vocês duas! - O homem se exaltou. - O que foi que você fez dessa vez?

— Eu estraguei tudo, Nelson... - Murmurou afogando o rosto nas papeladas que haviam em sua mesa.

Há uma semana atrás, Verônica resolveu dar um susto em Anita logo após a delegada ajudá-la a lavar sua moto. De fato, não fora algo muuuuito terrível, sabe? Porém, Anita era do tipo de fazer tempestade em um copo d'água.

— Aí, Verô. - Suspirou cansado apoiando as mãos na cintura. - Você é muito burra, não aguento mais te dar conselhos e você não seguir!

— Não me julga, por favor!

— Não vou te julgar, vou começar a te esmurrar pra ver se você aprende a ser gente.

— Nossa... você tem noção que eu tenho os dias contados?

— Lá vem você com essas paranóias...

— Fazer o que? É a minha realidade agora, Nelson... - Ironizou dramática.

— Para de ser louca, você não foi se consultar com a hepatologista esses dias?

— Fui

- E aí? O que ela disse?

— Nada demais, apenas falou para eu me cuidar. - Confessou contorcendo a boca.

— Hum, entendi. - Assentiu em concordância. — Vamos sair pra beber hoje?

— Acho melhor não, tô cansada. — Impôs uma desculpa não tão plausível.

- Você? Cansada? Eita... vai cair um pé d'água. - Riu

— Não entendi...? - Franziu o cenho.

— Tá bom, deixa eu ver se entendi... você não vai beber hoje? Em plena sexta-feira?

— É, ué. Por que a surpresa?

— Olha... eu sei que eu nunca falo o que você quer ouvir, mas se você quiser conversar, sabe... - Encostou em seu ombro, falando de forma sarcástica

— Eu não estou depressiva, Nelson. — Revirou os olhos - Só tô cansada.

— Bom, então eu vou nessa. Meu expediente já encerrou por hoje. — Espreguiçou-se em pé - Tchau, Verô! - acenou.

Verônica balançou a cabeça despedindo-se do rapaz que já não estava presente. A escrivã então, estava sozinha na delegacia, pois Anita já havia ido embora, afinal, a delegada já estava com o seu carro e não precisava mais depender de carona da escrivã.
Verônica vendo-se sozinha naquele lugar, decidiu arrumar as suas coisas e ir para casa.

Depois de um tempo, Verônica chegou em sua casa, afinal, ela havia negado o convite de Nelson, que lhe chamou para beber. Já havia um tempo que Verônica evitava beber, ela sabia que fazer aquilo poderia piorar a sua situação, e mesmo sendo negligente na maioria das vezes, ela não queria correr o risco de precisar ir ao médico novamente.
Tudo que ela menos queria era precisar ir ao médico, ela detestava ir ao médico.

Bom... Verônica até que estava tentando se manter saudável, porém era um pouco difícil, afinal ela não era muito boa na cozinha, principalmente quando se tratava de comida saudável.

A escrivã então, vendo-se sem saber o que fazer, arriscava assistir tutoriais no YouTube e ver se conseguia fazer algo comível. Verônica, mesmo falhando em quase todas as tentativas, ela acreditava que era melhor do que pedir marmita todos os dias. E por incrível que pareça, ela estava tentando se cuidar desde que voltou da consulta.

Uma coisa estranha que estava acontecendo esses dias, era que Verônica estava agindo muito diferente desde que voltou da consulta com a hepatologista. Nelson havia notado a mudança em seu comportamento, porém conjecturou ser mais uma briga entre ela e a delegada... e, até que ele estava certo em partes, mas não totalmente. Já Anita, notou muito bem o seu comportamento e percebeu que ela não estava agindo como costumava agir. Toda vez que Anita lhe dava uma brecha para fazer uma piadinha, Verônica nunca desperdiçava as oportunidades! No entanto... era algo que não estava acontecendo como costumava acontecer frequentemente...

De repente, Verônica estava agindo de um jeito mais... maduro?

Aquilo era muito estranho para Anita, tanto é que isso não saía de sua cabeça.

Ela queria entender o motivo da mudança de comportamento... o que estava acontecendo? Não é como se fosse a sua obrigação saber daquilo, mas ela só queria saber...

Querendo ou não, Anita se preocupava com Verônica, e muito! Não era atoa que a escrivã não saía de seus pensamentos.

De vez em quando, Anita desejava poder entrar dentro das pessoas e descobrir tudo o que se passa na cabeça de cada uma.

Para Anita, não saber das coisas lhe deixava inquieta, ansiosa e agitada.

Principalmente quando o assunto era Verônica.

Mesmo tentando relaxar, Anita não conseguia tirar a escrivã de seus pensamentos. Nesse momento, Anita se encontrava em sua varanda ouvindo músicas junto com Íris, a sua gata.

Na maioria das vezes, Anita gostava de conversar com a sua gata. De acordo com ela, a Íris é o único ser vivo que te entende (ela não fala, nem contraria a delegada).

— Íris... - Chamou em um suspiro enquanto acariciava os pelos macios do animal. — Eu não aguento mais pensar tanto nela. - Confessou olhando para o lado direito, mais especificamente para a casa que ficava naquela direção, onde havia uma janela que dava para o quarto da escrivã. Que por sinal, estava um pouco aberta.

Anita então, sentindo o vento bater em seu rosto, acordou do transe que estava quando notou para onde estava olhando.

Verônica estava em seu quarto, sentada em sua cama enquanto encarava um papel misterioso. Ela parecia estar muito focada naquilo que estava lendo, mal percebeu que estava sendo observada.

Mesmo estando distante, Anita conseguia visualizar se forçasse a visão. Ela enxergava Verônica, sentada em sua cama olhando fixamente para um papel.

A escrivã olhava de um jeito assustado, como se fosse uma carta lhe avisando sobre algo ruim que estava prestes a acontecer. Seu olhar carregava pavor, como se estivesse sendo sufocada. Era notável o quão apavorada ela estava, o seu peito subia e descia em uma respiração ofegante. Anita, forçando sua visão mais um pouco, pôde notar uma ação estranha, as mãos de Verônica passavam pelo o seu rosto em uma tentativa de seca-lo, a sua coluna se mexia freneticamente, como se estivesse soluçando. Anita, curiosa, se levantou para poder ver com mais clareza.

De imediato, viu Verônica se largar no chão de seu quarto, e afundar o seu rosto em seus joelhos; chorando como uma criança.

Anita então, vendo aquela cena, sentiu o seu queixo cair e o seu coração despedaçar.

Berlinger nunca havia visto a escrivã daquele jeito, para Anita, Verônica sempre foi alguém forte e confiante... mas agora, ela parecia uma criança alta. Chorando de uma forma totalmente vulnerável.

Verônica sentia sua visão distorcer ao olhar para o tal papel. De repente, uma enchente de lágrimas se fez presente em seu rosto, as lágrimas escorriam sem parar. Não havia nada que pudesse fazer com que ela se sentisse calma naquele momento. Tudo o que ela fez foi afundar o seu rosto em seu joelho, assim como fazia na infância para esquecer de tudo.

Anita, não suportando ver a escrivã daquela forma, decidiu entrar para dentro e tentar esquecer a cena que acabara de presenciar.

Mas era inevitável. Era inevitável não pensar naquela cena de uma Verônica totalmente vulnerável e diferente da Verônica que ela estava acostumada.

A vontade que ela teve de ir até a sua porta foi grande.

Mas Anita temeu, e resolveu tentar esquecer aquilo.

You belong to me • VeronitaOnde histórias criam vida. Descubra agora