Capítulo Oito - O Peso de uma Coroa Parte - II

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Reino de Rezzo

Sentindo uma gosto amargo no fundo de sua boca Lydia avistou o casal e filha mais nova se aproximarem cautelosamente.
O olhar da mãe para si, fez o coração da monarca errar algumas batidas, a senhora sabia que o motivo da ordem da real para sua família ir ao palácio no meio da noite, tinha haver com sua filha mais velha.
Durante todo o caminho ela sentiu seu coração disparado, chegava a doer o peito e a sua cabeça. Olhou para o marido ao lado e não viu preocupação ou medo em seus olhos, como imaginava os seus próprios, avistou... curiosidade?
Como não tinham com quem deixar a filha mais nova, a mesma foi junto.
Quando se aproximaram do pé da escada as quatro pessoas pararam, o guarda real se curvou em respeito a sua majestade, os outros seguiram os movimentos do militar, para demonstrar o mesmo sentimento. Logo depois ergueram suas cabeças e avistaram os par de olhos azul esbranquiçados os observando com seriedade. Lydia foi a primeira a se pronunciar.
— Boa noite a todos, desculpem chamá-los neste horário inoportuno. — A voz da mesma transmitia uma leve melancolia que passou despercebida para a criança no local, e o pai.
— Não, não majestade, está tudo bem — Gesticulou a mãe, sentindo os braços da mais nova lhe rodearem, a abraçando de lado fortemente, a mais nova estava com frio.
Os cantos dos lábios finos de Lydia se ergueram minimamente com a ação da mais nova, ela não era parecida com a irmã. Seu cabelo comprido em um tom de loiro, a mesma tinhas poucas sardas pelo seu rosto infantil, que carregava uma expressão de frio e talvez de medo também. Seu olhos eram castanhos como os de sua mãe. Na verdade Yasmim não era parecida com seus pais, ambos eram loiros, a mãe tinha olhos castanhos e os do pai eram azuis. Estanho, porém deixou isso de lado por enquanto.
Lydia não queria falar as próximas palavras na frente da criança e também não queria o homem junto naquele momento, seu olhar foi em direção ao guarda que os trouxe, então disse:
— Senhor Sysyz, poderia levar a jovem para comer ou beber alguma coisa na cozinha?
— Sim, minha senhora.
O mesmo foi em direção a menina, essa que segurou sua mãe com mais força, em um gesto automático, a senhora Kenys protegeu sua filha com seus braços, a rodeando.
— Minha rainha, porque Lily precisa se retirar? — Pergunta com certo temor na voz, desde que sua filha mais velha sumiu, não conseguia tirar os olhos de Lily. Olhou para o marido esperando que o mesmo fizesse alguma coisa, mas parecia que ele tinha virado uma estátua, apenas observando a monarca. Lydia se sentiu desconfortável, com aquele olhar nojento.
— A conversa que teremos a seguir, não é adequada para uma criança. — A voz de Lydia quase vacilou, e ainda não tinha nem começado. A mesma não sabia como prosseguir com isso, mas precisava. Khalista observava tudo em silêncio, procurando alguma coisa de errado, e o modo que o homem agia estava estranho. Alguma coisa estava errada.
Após ouvir as palavras da jovem majestade, sentiu seu coração se partir, como se uma espada o cortasse em vários pedaços. Seus olhos começaram a marejar, piscou algumas vezes rapidamente, para espantar o choro e olhou para baixo, em direção a Lily.
— Pode ir com o guarda, minha querida, tenho certeza que tem alguma coisa bem gostosa para você comer lá na cozinha. — Seus lábios tremia levemente, assim também tremendo sua voz — Vai lá, eu e o seu pai vamos ficar aqui, para ouvir sobre sua irmã.
A mais nova mesmo querendo ficar com seus pais e ouvi sobre sua irmã, se soltou relutante sua mãe e se aproximou do grande guarda. O som dos passos dos dois caminharem até a porta, era o único barulho do local, assim que saíram por ela, o silêncio se fez presente no salão do trono.
Lydia não conseguia fazer com que as palavras saíssem da sua boca, seu coração estava batendo tão rápido que sentia o peito doer como se estivesse sendo martelado. Isso estava a matando por dentro, principalmente olhar para o homem, esse que parecia perdido em seus pensamento. Os pais queriam respostas da sua filha mais velha, mas também não conseguia dizer uma palavra. Khalista sendo a única racional naquele ambiente, decide tomar a frente da situação.
— Senhores Kenys, há rainha fez uma investigação sobre o caso da sua filha e descobriu coisas muito importante em relação á Yasmim. — Pronunciou a conselheira.
— Mesmo? O que são essas coisas? — Suplicou á mãe, sua voz tremendo de ansiedade e medo.
— Khalista, antes que eu revele as informações sobre o assunto, poderia levar o senhor Kenys para o cômodo sudoeste? — Lydia queria falar com a mãe sozinha, sem Khalista por perto para ajudar a mais nova e principalmente não queria ver aquele verme perto da mulher.
A mais velha estranhou o pedido da jovem rainha, afinal o cômodo sudoeste era...
— Porque ele tem que sair majestade? — Perguntou aflita pelo marido.
— Quero falar somente com a senhora, mais tarde irei falar com o seu marido, enquanto isso Khalista vai fazer algumas perguntas para ele. — A monarca abriu um sorriso gentil para a dama, o que acalmou o coração da mãe, a mesma balançou a cabeça concordando.
Khalista desceu os degraus com uma elegância invejável, se aproximou do homem, que estava olhando para si com medo.
— Me siga.
Sem esperar uma respostas saiu andando na frente, o senhor Kenys parecendo que finalmente saiu daquele transe, olhou inseguro para a esposa nervosa, e logo em seguida se dirigiu para a rainha. A expressão no rosto de Lydia deixava transparecer seu ódio pelo homem na sua frente, a pele da monarca estava começando a ficar pálida e seus olhos esbranquiçarem quando uma voz feminina ecoou pelo salão, trazendo de volta Lydia em seu estado natural.
— Eu disse, me siga. — A conselheira estava na porta de braços cruzados, a forma imponente e crueldade que a mesma exalava, dava medo em qualquer um.
— Certo, certo... — O mesmo parecia perturbado, como se estivesse drogado. Caminhou até a conselheira em passos tortos. O homem não estava assim quando chegou, estava bem, pelo menos, era o que parecia. Quando os dois saíram do salão, deixando somente as duas mulheres no local.
Lydia notando o nervosismo da pobre mãe, se levantou do seu trono congelado, desceu os poucos degraus, quando chegou no último parou seus movimentos e se sentou nos degraus, aquela ação tão normal, surpreendeu a mulher mais velha, que arregalou os olhos de surpresa. A monarca lançou um sorriso gentil, com a mão direita bateu fraquinho no mármore do seu lado.
Um pouco receosa por sentar do lado da sua rainha, foi se aproximando em passos hesitante. Sentou-se onde Lydia batido no mármore, virou o seu rosto para o lado ficando cara a cara com a monarca. Nos olhos azuis dela transmitia uma tristeza profunda, seus lábios carregavam um pequeno sorriso triste. Lydia com suas mãos frias segurou as mãos quentes da mulher.
— Senhora Kenys... eu sinto muito, a Yasmim faleceu — Cada palavra foi uma flechada no coração da pobre mãe.
Os olhos castanhos dela transformaram-se em duas cachoeiras dolorosas, colocou o mão na boca para abafar o grito que saiu da sua garganta. Sua visão desfocou-se não conseguindo ver nada ao seu redor, somente o rosto da sua Yasmim sorrindo para si, podia ouvir sua risada... podia... podia...
Maitê sentiu braços gelados a envolvendo em um abraço apertado, não se importando quem era, deixou-se ser abraçada pela friagem que jurava ser da morte. Sentia uma mão passando pelos seus cabelos loiros envelhecidos, deitou sua cabeça no ombro gelado, tão frio... sentia seu corpo tremer, não sabia se era pelo choro descontrolado ou por sentir seus ossos gelificar aos poucos. Talvez fosse somente a dor no seu peito que a fazia pensar que estava sendo abraçada pelo primordial da morte.
As duas mulheres não sabiam por quanto tempo ficaram naquela mesma posição. Ninguém ousou incomodá-las por ondem da conselheira quando saiu da sala. Tudo que se podia ouvir era os soluços da pobre mãe ecoar pelo cômodo, Lydia duvidava que conseguiria falar qualquer palavra sem sua voz tremer, a mesma tinha medo de perder o controle, como na torre de sepultamento, Khalista não estaria aqui para pará-la, mas ela também não estava na torre junto de si. Seus pensamentos foram cortados, por uma respiração falha perto da sua orelha.
— Sab-sabe quem fez isso com a minha filha? — Um sussurro rouco rente ao ouvido da monarca. Aquela pergunta como desejava não ter que responder.
— Acho que podemos deixar essa parte para depo...
— Não! Eu quero saber quem foi o desgraçado que fez isso com a minha filha! — Maitê se desprendeu do abraço da monarca, levantando-se do chão e encarando a mais nova. A imagem da sua garotinha vivida em sua mente. Queria saber do nome do monstro desalmado que destruiu a vida da sua preciosa filha.
Lydia mexeu seus dedos tentando conter a sua ansiedade, focou seu olhar na expressão da mais velha, e notou seus lábios tremendo, seus olhos estavam vermelhos por conta do choro recente, suas bochechas estavam rosadas, tinha caminhos de lágrimas secando nelas. Maitê possuía uma melancolia no olhar. Será que ela aguenta a verdade?
— Está bem, sente-se, acho que é melhor a senhora ouvir a história sentada. — Ainda mexendo seus dedos nervosamente, esperou a madame sentar novamente do seu lado, a mesma olhava para seus pés não querendo avistar os olhos da rainha.
— A Yasmim...
A monarca contou todos os detalhes que tinha conhecimento da história, desde os abusos até seu relacionamento com Julius. Cada palavra que saia da boca da jovem majestade, o horror crescia dentro do peito da Maitê, sua respiração estava descompensada, ainda mais quando a Lydia acusou seu marido de abusar da Yasmim, isso foi demais para ela.
— Mentira!
Sem os pensamentos claros, Maitê levantou sua mão para ir em direção ao rosto de Lydia; porém, a rainha segurou o pulso da mais velha no momento em que a palma da mão se chocaria com sua bochecha esquerda. Lydia se negava a apanhar por causa dele.
— Por favor, Sra. Kenys, deixa eu explicar. — gesticulou a mais nova, ainda segurando o pulso da mulher com força, pois Maitê tentava se soltar para aplicar outra tentativa de golpe.
— Eu não quero ouvir suas mentiras! Meu marido nunca machucaria uma mulher, ainda mais nossas filhas! — Gritou, enquanto mexia seu braço esquerdo fortemente para se livrar do aperto da morena.
Lydia afrouxou o aperto, liberando o pulso da mais velha, que se levantou furiosa, andando de um lado para o outro; sua respiração estava mais irregular do que antes, seus olhos olhando para qualquer canto da sala, tentando achar uma resposta para sua rainha.
A mais nova observava o comportamento de Maitê, estava esperando algo assim, mas não esperava que ela tentasse lhe bater na cara! Se Khalista estivesse aqui, faria com que a mulher perdesse a mão por isso. Torceu a boca com esse pensamento, o qual foi interrompido por um grito. — Me entendeu?! — Lydia nem tinha ouvido o que Maitê dissera, mas concordou com um movimento de cabeça.
— Ele jamais faria isso! E esse amante da Yasmin? Já passou pela sua cabeça que ele pode estar mentindo? — A monarca fez uma careta por conta dos gritos. Os ouvidos de Lydia estavam começando a doer de tanto ouvir os gritos da mulher.
— Sim, senhora, já pensei nisso, mas tenho provas que mostram que Julius é inocente. — A mais nova comentou, enquanto se levantava do chão, ficando de frente para a mulher. E também arranquei um braço dele por acidente com esse mesmo pensamento, pensou Lydia, mordendo seu lábio inferior.
— Quais são? Quero vê-las agora! — Ordenou a rainha.
A monarca não gostou de receber uma ordem, como se ela estivesse mentindo, mas tentou entender o lado da mãe em luto. Depois de um longo suspiro e uma olhada rápida em Maitê, Lydia andou calmamente até o leste do cômodo, onde havia uma pequena mesa que continha a bolsa de Julius com as cartas trocadas. A soberana vasculhou um pouco a bolsa e tirou de lá uma carta que já estava aberta, olhou o que estava escrito no papel, e levantou seus olhos para a mulher que a observava. Levantou seu braço direito em direção a ela, oferecendo a carta. — Imagino que uma mãe reconheça a caligrafia do filho. — comentou, olhando para a Sra. Kenys com seriedade. Em passos relutantes, Maitê se aproximou, temendo o que havia naquele pedaço de papel, mas caminhou até ele. Quando estava a dois passos da rainha, parou de caminhar e pegou a carta em suas mãos tremendo. Lydia a encarava com uma expressão fria no rosto.
Desviou o olhar para o papel dobrado, abriu o mesmo de maneira lenta e assustada. Quando começou a ler a carta, suas pernas cederam com o seu peso, caindo no chão de joelhos. Aquela era a carta que Lydia tinha lido na cabana, onde Yasmim contava sobre o pai e sobre Lily. Maitê desejava desesperadamente que isso fosse um engano, não podia ser real, seu Lorenzo nunca faria uma coisa dessas, ainda mais com as filhas que tanto desejou proteger. Suas mãos estavam no seu rosto tentando o esconder, sua dor, vergonha, luto... A governante observava em silêncio o sofrimento da mulher, a mesma mexia seus dedos atrás de si, para não demonstrar sua angústia com essa situação. Queria abraçar a mulher, mas imaginava que ela precisava do seu espaço e do seu próprio tempo. As duas não sabiam que horas eram, mas podia-se ouvir os pássaros cantando pela manhã.
— Por isso pediu para a conselheira tirá-lo daqui. — Era mais uma afirmação do que uma pergunta. Ela olhava para baixo, fixada na carta no chão, uma saia preta com detalhes em dourado se fez presente no seu campo de visão; logo depois, sentiu mãos frias tocando suas bochechas, levantando sua cabeça para seus olhos castanhos encontrarem os olhos azuis da rainha, que possuía uma expressão esmorecida.
— Eu não imagino o que deve estar sentindo neste momento, tanto pela perda da sua filha quanto pela descoberta do seu marido. — A voz de Lydia tentava transmitir gentileza por meio da dor que ela estava sentindo também. — Lamento que isso tenha acontecido no meu reino, na sua casa e família. Essa dor talvez nunca desapareça, mas precisa ser forte, por você, Lily e Yasmim. Não acho que ela iria gostar de ver a senhora deste jeito.
Maitê se jogou nos braços da soberana, abraçando-a com força, e Lydia retribuiu o abraço apertado da mãe. As duas estavam sofrendo, de maneiras diferentes, mas estavam. Após alguns instantes, soltaram-se. Lydia se levantou do chão sem esforço, ajudou a mais velha a se levantar, suas pernas ainda estavam trêmulas.
— O... O corpo da Yasmim... — A Sra. Kenys não conseguia formular a frase.
— Ele está na torre de Sepultamento, posso levá-la até lá se quiser. — Ofereceu.
— Quero me despedir da minha filha. — Sua voz passava de um sussurro sofrido.
— Claro. Colocou a mão da Sra. no seu antebraço e seguiram para fora do salão. Os guardas na porta abriram a porta dupla e as duas caminharam pelo corredor em silêncio. Maitê não queria conversar naquele momento, e Lydia não forçaria, mas queria fazer algumas perguntas sobre o marido e falar com Lily também, afinal, Yasmim não ficava 24 horas em casa com a mais nova.
O pátio do castelo tinha empregados indo de um lado para o outro, para cumprir com seus deveres. Tinha botânicos cuidando das plantas, afinal Rezzo estava sempre no inverno. Não era um frio extremo, era de certa forma frio, mas tinha algo de diferente. Isso ajudava também com as plantas, elixires e remédios medicinais, pois o frio conservava as descobertas da medicina. As pessoas que viam a rainha passar com Maitê prestavam seu respeito à monarca e cumprimentavam a mulher mais velha com um simples manejo de cabeça. No entanto, a Sra. Kenys não retribuía, não conseguia focar em nada que não fosse a torre um pouco distante de tudo, na parte noroeste do terreno do castelo. A cada passo dado, a pobre mãe sentia uma parte do seu coração desaparecer. Era como se um profundo buraco fosse feito no seu peito, deixando-a sem oxigênio, somente com um peso que carregará para toda a vida.
A mesma conseguia sentir o toque gélido da morte ao olhar de perto a torre; ela era antiga, possuía detalhes como se fossem letras em outra língua espalhadas ao longo da torre estreita. Lydia se aproximou da porta principal do local, abrindo-a com um empurrão um tanto forte, pois a madeira era pesada. A monarca levou Maitê para uma das portas que havia na parede ao lado de longos bancos feitos de madeira de eucalipto. A porta levava para um lance de escadas para baixo. Durante todo o percurso nas escadas, Lydia ajudou a mulher; ela conseguia ver as pernas da mais velha tremendo durante todo o percurso até aqui. Não desejando que ela escorregasse e caísse, tratou de ser cuidadosa. Mesmo com a sua atenção, a mais velha escorregou umas três vezes, e em todas as vezes Lydia a segurou para que não se machucasse muito. Ao chegarem no final da escada, depararam-se com um curto corredor largo feito de pedras, sendo iluminado por tochas em suas paredes.No final do corredor, havia uma porta preta feita de uma madeira desconhecida, com uma frase gravada no meio da porta:
"A morte chega para todos, até para você".
Lydia não sabia quem tinha tido a ideia dessa frase, mas não gostava dela, nem quando criança, quando foi levada nesta câmara para ver seus pais uma última vez, nem agora, nesse momento. Logo, quando empurrou, uma nuvem de fumaça cegou momentaneamente suas vistas, o cheiro de madeira queimada junto com o odor da morte se misturando, fazendo o estômago da mais nova se embrulhar, desejando expulsar sua última refeição. Maitê não estava muito diferente da mais nova; aquele lugar era assustador. Não tinha janelas, as paredes cinzas por causa dos pedregulhos, misturados com um barro vermelho para prendê-los juntos. Incensos acesos em abundância, alguns para mascarar o cheiro de podridão, outros para chamar os ceifadores e levarem a alma do falecido para descansar em Mako ou viver em agonia no Abismo; somente o primordial da morte poderia escolher para onde a alma iria. Bom era o que diziam os sacerdotes.
O lugar era amplo, tinha quatro fileiras de dez macas, algumas estavam ocupadas, mas em uma delas estava o corpo da Yasmin. Os legistas que estavam no local se surpreenderam ao som da porta sendo aberta, revelando sua rainha e uma mulher mais velha por volta dos quarenta e poucos anos. Suspeitaram que fosse a mãe da garota que Sua Majestade trouxe em suas próprias costas. O que estava mais perto se aproximou das duas.
— Minha rainha, o que devemos à sua visita? — Perguntou educadamente, mostrando respeito, curvando-se levemente, deixando seus cabelos castanhos caírem um pouco para frente.
— A mãe da menina que eu trouxe ontem à noite está aqui para reconhecer o corpo. — Informou o jovem homem.
— Certo, me acompanhem, por favor. — Ele levantou o braço, em sinal para que elas seguissem o caminho.
Fizeram o que lhes foi pedido, o homem as acompanhou até o meio da segunda fileira, onde pediu para ambas pararem. Maitê apertou o antebraço de Lydia com tanta força que provavelmente deixaria um hematoma no local; ela prendeu a respiração enquanto observava os movimentos do homem, ele se aproximando da maca e com as duas mãos puxando o lençol um pouco para baixo, deixando à mostra o rosto da falecida.
A mãe sentiu algo se quebrar dentro de si, era a sua menina... Ela se soltou de Lydia, se aproximando da maca. Com sua mão trêmula, tocou a bochecha gelada da filha, observou todos os seus únicos detalhes: as pequenas sardas em volta dos olhos, o nariz pequeno, os cabelos castanhos sedosos. Um soluço escapou de sua garganta, lágrimas escorregaram pelo seu rosto novamente; não sabia quantas vezes já tinha chorado até aquele momento. Em um movimento doloroso, beijou sua testa uma última vez, nesta vida.
Afastou-se relutante da sua primogênita, virou para a sua rainha e movimentou sua cabeça para baixo, saudando-a. Após isso, Maitê saiu da sala sozinha sem esperar a mais nova. Lydia ficou parada, observando tudo, principalmente o rosto jovial da garota morta. Elas tinham a mesma idade, mas uma não chegaria à fase adulta da vida. Isso era injusto, com Maitê, Lily, Julius e principalmente com Yasmim.
— Minha rainha?
A voz do homem a fez despertar para a realidade; parecia que ele estava chamando-a há algum tempo.
— Pode cobri-la novamente, muito obrigada pelos seus serviços. — Ele concorda com um mexer de cabeça, fazendo o que lhe foi pedido. Ela vai embora da sala, deixando os falecidos descansarem.
O caminho de volta foi silencioso, mas seus pensamentos gritavam em sua cabeça. Nunca entenderia o motivo de Lorenzo ter feito o que fez, nunca entenderia a razão de existir alguém que mata por prazer, dinheiro ou vingança. Jamais entenderia como Khalista e as outras rainhas conseguiam fazer isso e seguir em frente, conseguindo sorrir mesmo depois disso.
E se não tivesse nascido na realeza? Precisaria testemunhar algo parecido? E se não tivesse poderes descontrolados, viveria em paz? Poderia dormir sem medo de congelar todo o reino? Conseguiria viver ao lado de seus pais por mais tempo? Eram tantas perguntas, mas não tinha as respostas para elas, e isso a corroía por dentro todos os dias.
Chegando no saguão, avistou a Sra. Kenys sentada em um dos bancos de frente para as estátuas de homens e mulheres sem rostos que estavam ali, usadas para homenagear os primordiais e rezar para eles. Ninguém sabia como eram suas aparências, só sabiam seus nomes.Lydia se aproximou cuidadosamente da mulher e pôde ouvir sua prece.
Primordial dos mortos, Kanneky, aquele que guarda o portão de Mako e o portão do Abismo, o justo, o julgador de almas. Ouça minha prece, cuide da alma de minha filha, a leve para Mako, protegê-la em seu caminho espiritual. Por favor, puna a pessoa que feriu a minha doce Yasmim... Eu me casei com um monstro, jamais imaginaria que ele faria algo assim, Lorenzo sempre foi uma boa pessoa, ajudou os outros, cuidou de pessoas que não tinham nada, ele sempre foi um pai muito protetor com as meninas. — Lydia tentava ao máximo segurar o choro preso em sua garganta. Depois de um longo suspiro, Maitê continuou. — Eu também mereço um castigo por não ver o que ele fazia com as nossas filhas, minhas filhas! Por favor, cuide da Yasmim, algo que eu não pude fazer.
A mulher ficou repetindo a mesma prece várias vezes, mesmas palavras, mesma devoção. Isso desmoronou a barreira que Lydia estava tentando reconstruir. Pela primeira vez na vida, sentiu a vontade de matar, de sujar suas mãos com o sangue de uma pessoa. Em passos decididos, a rainha chegou mais perto da Sra. Kenys, colocou a mão sobre o ombro da mais velha. Esta se assustou com o toque repentino, não tinha notado que Sua Alteza estava atrás de si. Será que ela ouviu?
— Imagino que esteja cansada depois de tudo isso, desses acontecimentos? — Lydia perguntou com gentileza em sua voz suave, retirando a mão do ombro e sentando ao lado da mulher.
— Nunca estive tão esgotada como agora... Mas não quero deitar na mesma cama que eu dividia com aquele homem ou naquela casa. — confessou para a mais nova com a cabeça abaixada, olhando para suas mãos em seu colo, apertando o tecido do seu vestido.
— Podem ficar aqui, você e Lily, no castelo enquanto procuro uma casa nova para vocês recomeçarem. — Ofereceu a soberana, a mesma ganhou um olhar surpreso e ao mesmo tempo agradecido.
— Podemos mesmo? Não iremos atrapalhar a senhorita?
— Claro que não, o castelo é muito grande somente para mim e Khalista, vocês são muito bem-vindas e podem ficar. — Maitê abraçou Lydia fortemente, e a mesma retribuiu. Quando se afastaram, a mais velha deixou um beijo gasto na bochecha gelada e pálida. O gesto fez com que Lydia ganhasse uma cor rosada sobre sua pele de neve.
— Mesmo sendo tão nova, a senhorita é uma boa rainha. — Aquela frase foi o bastante para acalmar o caração e os pensamentos gritantes da mais nova.
— Fico muito feliz em ouvir isso, muito obrigada. Vamos procurar um quarto para você.

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