•No Bar Com Mors•

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Suspirei, sentindo o peso do desastre que se abateu sobre mim. Disfarçadamente, continuei a busca pela minha carteira nos bolsos da calça. Tocava, revirava e vasculhava, mas me dei por vencido. Esqueci, afinal, aquele objeto tão simples em casa. Pigarreando, voltei minha atenção ao homem sentado à minha frente e senti a garganta apertada ao tentar falar:

⎯⎯ Se, veja bem, por algum acaso... Bem, um acaso, você poderia pagar a conta? Eu acabei esquecendo minha carteira em casa.

⎯⎯ Deixe disso, agora não é hora de ser pão-duro. Olha quem vem lá.

Desviei o olhar do meu amigo e franzi a testa. A porta do bar rangeu, causando um incômodo nos ossos. De lá adentrou uma mulher de vinte e poucos anos, talvez mais, era difícil dizer apenas com um olhar rápido. Trajava um vestido curto verde, com a pele morena e um sorriso caloroso no rosto. Fiquei admirando-a por um momento, algo dentro de mim se sentiu incomodado com aquele sorriso que parecia refletir um pequeno raio de sol.

⎯⎯ Lá vem ela. Finalmente pensei que nunca ia chegar. ⎯⎯ Meu amigo resmungou e pude vê-lo esfregar os cabelos, talvez estivesse chateado com algo.

⎯⎯ Não seja idiota. Ela viria, afinal estamos investigando há um bom tempo. ⎯⎯ Disse observando a moça pedir uma caneca de cerveja e sentar-se num banquinho no balcão.

⎯⎯ E coloque tempo nisso. Esse trabalho de detetive particular hoje em dia não está rendendo nada.

Balancei a cabeça, sabia que Kaio iria reclamar pelos próximos minutos, algo que era de se esperar. E como previsto, ele começou a falar com sua voz grossa, porém, calma e serena:

⎯⎯ Sabe, devíamos investir em outra coisa. Esse negócio de ficar indo de um lugar para o outro, disfarçando e investigando, não está mais dando certo. Pense bem, Watson, pense bem... Nem rende tanto dinheiro, já viu como o real está desvalorizado? É a firma, meu amigo, devíamos abrir um novo negócio...

⎯⎯ Kaio... ⎯⎯ Interrompi, deixando minhas mãos descansarem no bolso da calça, uma bela peça de alfaiataria que destoava completamente do ambiente do bar de esquina, onde uma música sertaneja preenchia o ar através de um pequeno rádio antigo, assim como os quadros nas paredes. ⎯⎯ Trabalho é trabalho, e você não vai encontrar um melhor do que esse.

⎯⎯ Fala isso porque você tem o cargo mais alto, e, afinal... ⎯⎯ Kaio me encarou com seus olhos astutos e acastanhados. ⎯⎯ Já pensou em largar o cargo?

A pergunta me atingiu como uma pedrada, se é que posso expressar meu sentimento dessa forma. É fato que Kaio não tinha papas na língua. Desviei o olhar para a janela. Havíamos escolhido uma mesa para dois, simples, encostada rente à parede, agraciada por uma janela emperrada, que ainda me permitia acalmar o ser ao observar a banalidade de quem ia e vinha.

Avistei um homem correndo, olhando frequentemente o relógio em seu pulso. Ergui a sobrancelha. Curioso como as pessoas estão sempre apegadas aos minuciosos ponteiros. Ele corria com alguma dificuldade, e, analisando a situação, estava impregnado em mim analisar tudo, um efeito colateral do trabalho. Imagino que ele tenha acordado naquela manhã decidido a mudar a si mesmo, após horas de vídeos de autoestima. Felicidades para ele.

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