Capítulo 01

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- Kyra!

Acordo no sobressalto, estou suada e tremendo, minha mãe olha para mim com preocupação.

- Você está bem? É o mesmo pesadelo de sempre?

E então como um balde de água fria, todas as minhas lembranças voltam me atingindo de cheio. Meu pai, a casa, a magia, os sonhos, e uma suposta maldição, tudo o que aconteceu nos últimos seis meses me vem à mente.

Olho para minha mãe e não sei o que dizer a ela.

- Eu... é... bem, eu... não sei, eu acho que vi uma torre no sonho, ela estava longe de mim. – esse sonho me atormenta desde a morte do meu pai, todas as noites, sem exceção. O sonho sempre é igual, o céu azul, a maçã, depois a terra e as pedras, e sempre acordo na parte em que eu morreria. – Eu vou ficar bem mãe, nós vamos, ok?

Ela olhou para mim com seus olhos verde claro e seus cabelos ruivos presos em um coque bem feito e alguns cachos caindo sobre seu rosto fino e cheio de sardas. Minha mãe se parece muito comigo, a única diferença entre nós são meus olhos azuis e meu nariz que é mais fino e pontudo.

Ela segurou minha mão e me deu um beijo na bochecha, e disse quase em um sussurro:

- Certo, nós vamos ficar bem. – E sorriu para mim com o mesmo sorriso que me deu quando eu completei dezesseis anos, orgulho, confiança e um pouquinho de medo.

Quando eu sorri de volta, minha mãe se levantou e saiu do meu quarto, escutei ela descendo as escadas e um tempo depois o cheiro de café enchia a casa.

Então me levantei, arrumei minha cama e tomei um banho rápido, e enquanto a água morna escorria pelo meu corpo repassei os acontecimentos passados – eu fazia isso todos os dias depois que comecei ter esse mesmo pesadelo – relembrei a morte do meu pai e em como a magia pode salvar, mas também, pode matar alguém tão facilmente quanto assoprar um dente-de-leão. Relembrei a casa em que morávamos, e o pomar e todas as lindas macieiras queimando e virando cinzas em poucos segundos. Da fumaça me sufocando e minha mãe lutando contra quem quer que fosse o autor de tudo aquilo. Lembro-me também da última vez que vi meu pai.

- Saiam daí! - meu pai gritou entre as chamas que tomavam conta das árvores. Ele era o homem mais atencioso e romântico que conheci, ele trazia flores para minha mãe todos os dias e estava sempre por perto, era alto e seus olhos azuis eram tão lindos quanto os olhos verdes de sua esposa, e seu cabelo castanho escuro era tão belo que por muitas vezes desejei tê-lo herdado. - Venha aqui! Sophia! Kyra!

Eu e minha mãe corremos até ele e ele nos puxou em direção a casa, logo depois, ouvi um grito, que era terrivelmente cheio de dor, mas não qualquer dor, era a dor de quem levou um golpe de magia. Como ele costumava me dizer - armas são para matar o corpo, magia é para matar a alma - Meu pai sempre me disse que nunca deveria usar dons mágicos para o mal, e no entanto, lá estava ele, sendo morto por magia.

Olhei ao meu redor e vi que minha mãe não estava mais ao meu lado, ela estava no chão, a uns dez metros de mim. Então fui correndo até ela, e lá estava meu pai - ou o que um dia foi - morto aos meus pés. Minha mãe olhava para mim com os olhos cheios d'água e uma expressão de ódio que qualquer um temeria. Ela se ergueu do chão, beijou minha testa, e disse:

- Filha, entre em casa, e não saia de lá. - Com um movimento eu assenti e corri de volta para casa, entrei e fiquei olhando-a pela janela. Ela ergueu seus braços e sua magia de um tom de amarelo se modelou em suas mãos como uma bola de luz e então foi lançada ao ar, e ao longe consegui ver uma criatura caindo no chão, Sophia se aproximou da criatura com asas transparentes e lançou algum feitiço que fez a criatura se debater e morrer, porém antes de morrer, a criatura fez um gesto com sua mão e senti minha cabeça doer no mesmo instante. Logo que a criatura morreu a dor passou, e desde então um pesadelo vem me atormentando sempre que durmo.

Terras do Norte.Where stories live. Discover now