Em nossa fazenda

143 17 11
                                    

Tema 4: Beijo na mão

*

Era noite de sexta-feira quando Pac passou pelo Saloon da cidade; a música animada e o cheiro de comida eram completamente convidativos, mas a ideia de chegar logo em casa, tomar um banho e sentar na varanda junto do marido, tomando uma cerveja e observando as estrelas, era mais convidativo ainda.

Ele passou reto pelo Saloon, a picareta descansando confortavelmente sob o ombro. A mochila estava cheia de geodos e algumas pedras preciosas, e a espada na bainha na cintura estava suja de slime, sangue de morcego e pingava essência nula; ele precisaria limpar e polir a lâmina no dia seguinte, mas tudo bem.

Pac gostava de fazer visitas às minas, sempre buscando coisas para vender e poder aumentar a renda da fazenda, ou simplesmente para liberar energia enquanto matava monstros. Havia algo de terapêutico em procurar por escadas antigas escondidas atrás de pedras e descer mais e mais andares atrás de novas aventuras.

Fit era diferente dele. O marido preferia a calmaria de pescar no Willy's ou de ficar na fazenda e de arar a terra, plantar sementes, colher, recolher os ovos, ordenhar as vacas... mesmo que se esquecesse, às vezes, de deixar um carinho nas galinhas ou esquecesse o portão do celeiro aberto – já havia acontecido.

Pac continuou a caminhada tranquila, a mente focada apenas no som dos grilos ao redor. Ele não tinha pressa, deixava os olhos correrem pelo caminho tão conhecido depois de quase dez anos morando no Vale do Orvalho – primeiramente, trabalhava como veterinário e morava em um quartinho alugado na casa de Pierre, e, depois, começou a morar na Rose Farm com Fit e se dedicar a outras coisas.

A fazenda ficava perto do ponto de ônibus e, no caminho, Pac fez um pequeno desvio para pegar um punhado de amoras direto de um arbusto, jogando algumas na boca e forrando o estômago vazio com a fruta doce. Então, finalmente passou pelo portão de entrada, aproveitando para fechar o cadeado depois de entrar.

O grande casarão de dois andares ficava depois de um caminho de pedras, com uma grande árvore plantada perto. As luzes do andar debaixo estavam acessas, bem como a pequena luminária na varanda recebendo-o de volta; no andar de cima, a luz do banheiro também escapava pela janela pequena, fazendo Pac saber que os filhos estavam já cumprindo os rituais noturnos antes de jantar – depois de um dia inteiro brincando na fazenda ou acompanhando os pais pela cidade, Ramón e Richas sempre tomavam banho antes do jantar, e então os quatro sentavam perto da lareira, contando histórias até que as crianças estivessem dormindo.

— Fábio? Cheguei! — Pac chamou alto. Era a única ocasião onde eles usavam o nome real um do outro sem ser em brigas pela toalha molhada na cama ou pela lama no chão depois de uma limpeza geral. O brasileiro deixou as botas, a picareta e a mochila na varanda e atravessou a porta principal.

— Na cozinha, Pablo! — A voz grossa do marido soou pela porta aberta, e Pac seguiu o cheiro de comida fresca até estar encostado no batente, de braços cruzados, observando Fit quebrar alguns ovos e coloca-los na panela. O fazendeiro careca tampou a panela, descansou a colher que usava na bancada e, depois de lavar e secar as mãos, virou-se para encarar o marido, abrindo um sorriso convidativo e completamente apaixonado. Fit sempre sorria como se Pac fosse o próprio sol da vida dele.

— Bem vindo de volta, marido.

Pac sorriu de volta, revirando os olhos pelo cumprimento. Mesmo depois de anos, ainda não se acostumava com aquele título. Marido. Parecia bom demais pra ser verdade.

— Oi! Não deixou nenhum animal fugir hoje, né? — Pac brincou, fazendo o outro rir alto.

— Hoje não. — O fazendeiro estendeu as duas mãos, as palmas viradas para cima. — Vem cá, vem.

Assim que as mãos dos dois se uniram, Pac levantou-as e beijou os nós dos dedos de Fit, depois virou as palmas para cima, também beijando-as, com especial cuidado para não desfazer o curativo que o marido tinha na mão direita. Fit fez o mesmo, dando beijos leves por cima dos calos que Pac tinha de segurar a picareta por tanto tempo. Enquanto faziam isso, mantinham os olhos um no outro.

— Obrigado pelo que suas mãos fizeram hoje — Fit sussurrou.

— Obrigado pelo que suas mãos fizeram hoje — Pac respondeu, como sempre.

Era o pequeno ritual deles. Uma maneira de agradecer pelo esforço do dia, pelo que as mãos deles cultivavam ou trabalhavam para garantir a sobrevivência da família. Depois disso, trocaram um selinho rápido, se afastando em seguida.

A noite continuou normalmente, Pac subiu para abraçar os filhos e também tomar um banho, depois penteou os cabelos de Ramón e Richas, tomando cuidado para finalizar direito os cachos do mais novo. Ramón contava para ele sobre o dia que tiveram e sobre o cachorro caramelo que havia aparecido na fazenda. Richas estava mais calado, cansado depois de brincar tanto, mas perguntava animado sobre os andares das minas – ele insistia desde sempre para conhecer o lugar, mas Fit e Pac concordavam que era perigoso demais para uma criança.

Depois de jantarem ecolocarem as crianças na cama, Pac e Fit sentaram juntos na varanda, em umbalanço grande que Robin havia construído de presente, e ficaram observando asestrelas

Em todos os universos te beijei (e te amei)Onde histórias criam vida. Descubra agora