Paraquedas

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Deserto da Patagônia, Argentina, Ano de 2017.

Rebecca Point Of View

Pular de paraquedas.

Aquela sensação de pura adrenalina. Em um segundo você está a salvo no avião e no outro você está nos ares, sentindo o vento forte contra seu corpo, contra sua pele, contra seus cabelos. Você precisa usar protetor para os olhos para que eles não sejam lesionados. Seu coração vai de bater 60 vezes por minuto à 120 batidas por minuto e seu peito chega a doer de tanto que seu coração martela contra ele. Todos os músculos de seu corpo parecem acordar e uma enorme onda de eletricidade cruza todo o seu corpo. Você até tenta se concentrar na paisagem, mas a verdade é que na maior parte do, aproximadamente, um minuto e meio que você está em queda livre antes de seu paraquedas se abrir, você passa reparando nas reações que seu corpo sente.

Em uma queda livre de 250 à 300 Km/h você se sente livre, se sente como se pudesse fazer tudo. Todas as reações de seu corpo diminuem o ritmo assim que o paraquedas se abre. Você começa a sobrevoar tudo em uma velocidade bem menor e seus batimentos cardíacos começam a se normalizar. Bom, eu sinto como se cada vez que Freen se aproximasse de mim eu pulasse de paraquedas, o paraquedas se abre quando ela se afasta e volto a enxergar com clareza.

O único problema de estar me apaixonando por ela é, eu não tenho certeza se meu paraquedas irá se abrir. Talvez ele não se abra e talvez, só talvez, eu morra na queda.

"Ainda babando por ela?" Escutei a voz de Nam e virei minha cabeça para ela. Ela estava com duas xícaras de café em suas mãos e estendeu uma delas para mim. Aceitei e agradeci. A noite era muito mais fria por aqui. Freen, Irin e Noey estavam rindo de algo. Elas estavam próximas a nave de Freen e eu estava no trailer, a admirando de longe, tentando gravar cada mínimo detalhe dela. A forma como ela olhava para a lanterna de 1 em 1 minuto cada vez que ria, a forma como ela se encolhia quando o vento gelado esbarrava em seu corpo, a forma como ela me olhava e me mandava uma piscadela antes de sorrir e voltar sua atenção ao assunto.

"Amanhã à essa hora ela estará partindo." Falei, soprando logo em seguida o vapor do líquido antes de provar de seu gosto ligeiramente amargo.

"Exatamente." Falou exalando o ar de seus pulmões.

"Espero que ela seja feliz por lá." Falei tristemente.

"E tenho certeza de que ela espera o mesmo para você." Falou e assenti. Deixei um longo suspiro sair.

"Nós nos beijamos." Confessei em voz baixa, sem ter coragem de olhar para Nam.

"Vocês o quê?" Perguntou com um tom surpreso.

"Nos beijamos. E foi tão bom Nam." Falei me lembrando do momento. "Pelo menos eu pude beijá-la, pude matar essa vontade que me consumia."

"Hey garotas, juntem-se a nós." A voz de Irin ecoou por todas as partes da imensidão vazia. Assenti e caminhei com Nam até as três garotas.

"Eu estava falando para elas que a nave já liga, ela já poderia partir hoje, mas preferiu adiar para amanhã mesmo." Noey explicou. Freen pareceu analisar a minha expressão e fingi um sorriso.

"Mês que vem é aniversário de Rebecca e ela poderá se gabar por ter concretizado um feito histórico." Irin falou orgulhosa.

"Quem concretizou o ato histórico foi Noey, eu não fiz nada." Falei sincera. Eu realmente não havia feito.

"Fará aniversário?" Freen perguntou curiosa.

"Sim, completarei 28 anos."

"Eu gostaria de ver isso." Freen falou sorrindo.

"Então porque você não fica? Um mês passa voando, menina. Fique conosco mais um mês." Irin propôs.

"Eu não sei. Não quero atrapalhar." Falou direcionando o olhar para mim.

"Você sempre será bem vinda em minha casa, Freen." Falei e ela olhou para todas.

"Então acho que eu vou ficar." Falou e eu não pude evitar sorrir verdadeiramente. Eu terei mais um mês ao seu lado.

"Eu te amo, Becky. Obrigada por deixar Freen ficar." Noey falou me abraçando e todas me abraçaram em conjunto.

"Então vai poder participar do streaptease que presentearei a Rebecca." Irin falou animada. "Vou contratar umas loironas gostosonas e umas morenas dos olhos claros porque eu já vi que ela se dá bem nessa área." Falou e a belisquei. "Ouch, Becky. Eu só estou falando a verdade, oras. Como eu dizia, contratarei umas gostosonas para dançar exclusivamente para Rebecca, vai ser demais." Falou e Freen franziu os olhos para mim.

"Não quero isso, Irin." Exclamei.

"De presente você não pode reclamar. Vai ter streaptease SIM." Ficamos nessa até Nam interferir e mudar o assunto.

O restante da noite foi agradável, Freen nos contou mais sobre seu planeta e eu estava atenta a cada nova informação. Nos contou que em seu planeta é possível duas mulheres terem um filho apenas delas, sem precisar da doação de homem nenhum. Isso sim seria maravilhoso de se evoluir em nossa ciência.

A vi se sentar próxima de mim enquanto Irin falava algo sobre os peitos de Noey.

"Oi, Rebecca." Sussurrou e a olhei. A neblina em volta de nós estava intensa e eu garanto que poderíamos pegar um resfriado por ficarmos no tempo a essa hora.

"Oi, Freen." Sussurrei de volta.

"Becky, fala pra ela que se eu gostasse de mulher eu a comeria. Ela está dizendo que se eu gostasse ela não seria o meu tipo." Olhei Irin.

"Noey, você já é o tipo da Irin mesmo que ela não tenha provado da fruta. Ela é sapatão, cuidado." Brinquei e vi Irin arregalar os olhos.

"Você disse o quê?" Irin falou se levantando. Droga. Eu sabia o que isso significava.

"Vem, Freen." Falei me levantando e puxando Freen comigo. Freen sem entender nada me seguiu mesmo assim. Corremos e olhei para trás vendo Irin gargalhando e correndo atrás de nós.

"Se ela me pegar ela fará cóssegas." Falei rindo enquanto corria, a respiração acelerada pela corrida e a mão de Freen na minha. Irin gritava vários palavrões e fazia várias ameaças porém depois de certo tempo ela desistiu de nos seguir. Parei de correr, levando minhas mãos ao joelhos e arfando. A neblina estava mais intensa naquela região e olhei Freen, ela olhava em volta parecendo estar encantada.

"Você não gosta dessa sensação, Rebecca?" Falou abrindo os braços e rodopiando.

"Como assim?" Perguntei, maravilhada com a cena dela girando com os braços abertos. O frio não estava tão forte agora, pois nossos corpos estavam quentes, porém o ar gelado que adentrava minhas narinas era fascinante.

"Está ouvindo esse barulho?" Perguntou sorrindo, com seus olhos fechados.

"Que barulho?."

"O som da liberdade. O cheiro da liberdade, o gosto da liberdade." Falou e enfim abriu seus olhos, me encarando fixamente.

"Se sente livre?" Perguntei me aproximando dela.

"Sim, e eu amo essa sensação. Nada nos prende ou impede de nada. Sinto como se eu pudesse fazer qualquer coisa que eu quisesse." Falou sorrindo abertamente. "Quero morrer sentindo o cheiro dessa liberdade." Enlacei meus braços ao seu redor.

"Então presta atenção..." Falei aproximando meu rosto do dela. "Estamos livres, bem aqui no meio do nada, cercadas por ninguém..." Encarei seus olhos. "O que sente vontade de fazer agora?" Aproximei mais minha boca da sua. "Apenas faça o que sente, afinal de contas, você é livre pra isso. Desfrute dessa liberdade." Falei e ela passou seus braços por meu pescoço, acariciando minha nuca e tocando seus lábios frios no meu. E lá estavam novamente as borboletas em meu estômago.

"O mais engraçado de tudo é saber que sou livre, que posso ir para qualquer lugar do mundo..." Falou me dando outro delicado beijo nos lábios. "Mas o único lugar que realmente quero estar é aqui, com você." Sussurrou finalmente aprofundando nosso beijo. Sabe aquela sensação de pular de paraquedas que eu mencionei? Então, sejamos bem vindos a mais um salto.




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