Qualquer hora e qualquer lugar

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Quando compraram o terreno, Lúcifer imaginou filhos correndo ao redor do gramado, fazendo bagunça na sala e rabiscos nos corredores. A casa foi construída para receber um grande número de pessoas, pois ele adora estar próximo da família ou amigos. Morningstar ama Charlie e adoraria ter mais filhos com Alastor. O moreno nutria o mesmo desejo, ainda que demorasse um pouco. Visitaram alguns abrigos e até pensaram em entrar com o processo certas vezes.

Demorou anos e eles não adotaram. Após o episódio de Eva, a ideia de crianças morreu.

'Charlie basta. Você já tem uma filha, não precisa de outra.'
'Estou ocupado com o trabalho, criança demanda atenção.'
'Uma responsabilidade desnecessária.'

No fim, nunca usaram os quartos extras.

Parte de sua mente reflete as vontades antigas do casal, talvez pela situação inteira provavelmente resultar em um divórcio. Luci perdeu o fio de esperança quando o maior o derrubou de um barranco. O chefe, Deus - como costuma chamá-lo -, deu 48 horas para assassiná-lo. Divórcio ou morte. Caso Hartfelt decida sair da cidade e fingir de morto, o loiro pode continuar atuando sem problemas. Fácil. Entretanto, o contrário é o asassinato. Pela Heaven, Satan mataria o Cervo. Pelos quase nove anos de matrimônio, Lúcifer quer tentar deixá-lo vivo. Ele realmente não quer ter que matá-lo.

Ainda que surte de raiva ou exploda, não conseguiria matá-lo.

Lúcifer e Adão estão na varanda, encarando um ao outro.

"Vai, entra." O moreno dá espaço.

"Não, pode entrar primeiro." Força um sorriso e empurra o amigo para a porta, que estava encostada e abre sem problemas.

Adão tropeça e se apoia na parede. Imóvel. Os olhos rolam pela entrada, com medo de pisar em qualquer metro quadrado e causar uma explosão - e sua consequente morte.

Morningstar o empurra de novo.

"Caralho, viado, para com isso!" O loiro fica atrás do outro com uma pistola em mãos. Ele apoia a arma no ombro de Adão, usando-o como escudo.

"Só vai andando." O mais alto bufa e continua o caminho, apreensivo.

A casa está silenciosa. Silenciosa demais. O ar pesado, os móveis revirados, porta retratos espalhados e vasos quebrados. A lareira ainda quente. Aproxima a cabeça do local e observa um montinho de cinzas. Ignora, preferindo direcionar-se ao jardim e sua amada casinha de ferramentas. Tudo usando o maior como escudo, é claro.

Quando chega ao quintal, o portão estava destrancado. Deixa Adão de lado e corre até o local, desesperado. As caixas abertas e o alçapão escancarado, mostrando a passagem subterrânea. Em passos pequenos, aproxima-se. A respiração pesada. Acharam. A merda da outra agência achou seus bebês. Os filhos que criou durante mais de uma década. Havia armas que nem são vendidas em território norte-americano. Algo florescia no âmago, uma azia crescente, a bile subia. As orelhas vermelhas de um sentimento que ainda não pode nomear. Ele desce as escadas.

Escuridão. Liga as luzes da saleta.

Vazio.

O querido armamento levado. Não deixaram sequer uma bala ou roupas. Limpo.

Lúcifer paira na entrada, boquiaberto. Descrente da atrocidade que fizeram. Levaram tudo. Todos os seus bens preciosos. A sua herança de guerra. A vida que construiu durante dezesseis anos.

Chuta com força os degraus, que gritam um barulho estridente de metal.

"Porra! Filho da puta de merda!" Pragueja ao subir de volta. Adão está parado na porta da casa de ferramentas de braços cruzados. "Eu vou matar esse desgraçado. Caralho. Buceta. Eu vou matar ele." Soca a caixa de utensílios no meio da bagunça. Os ossos dos dedos são feridos. "Arrombado de bosta, eu sei aonde tu trabalha, escroto! Isso vai ter volta!" Esfrega os olhos.

Sr&Sr. Morningstar || RadioappleOnde histórias criam vida. Descubra agora