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Mais um dia de luta.

Acabei de buscar a minha filha no infantário.  Só penso em chegar a casa, tomar um banho, comer e deitar-me.

Estou exausta.   Na fábrica de confecção não temos mãos a medir.   Trabalhamos 8 horas diárias sempre em alta rotação.
Felizmente o trabalho continua a chegar e o salário proporciona-me um tecto e comida na mesa.

Tenho 23 anos, mãe solteira por opção.  Pilar a minha menina tem apenas 8 meses.  O pai, que eu julgava ser o amor da minha vida, quando confrontado com a gravidez, deu-me uma surra que eu julguei que ia abortar, mas felizmente o meu bébe resistiu.

Apresentei queixa e ele quando soube, fugiu.  Até hoje a polícia não o encontrou e eu nunca mais o vi.  Tão depressa não deve aparecer porque corre o risco de ser preso.

Tomei o meu banho e dei banho à Pilar.   Depois de alimentadas fui com ela para a cama.

- Não é possível!!! De novo?

Levantei-me vesti o robe e fui bater na porta dos meus vizinhos.

- Querem fazer o favor de fazer menos barulho?  Tenho uma criança pequena e amanhã acordo cedo para trabalhar.

- Desculpe senhora.  Não se irá repetir. - respondeu o meu vizinho, homem alto, moreno, barba e cabelo bem feito.  Por estar em tronco nu foi possível ver a enorme tatuagem num dos braços.

- Quem é?  Porque estás a demorar?

- É a vizinha, Clara.  Diz que estamos a fazer muito barulho.

- Ela que se queixe às autoridades.  Vem pra dentro já!

- Se voltar a acontecer é isso mesmo que vou fazer.  Trate desse lábio.

Desculpe mais uma vez.

Juliette reparou no pequeno golpe nos lábios do vizinho.  Já era normal ouvi-los brigar.  Umas vezes ficavam pela discussão, mas por vezes como hoje, rolavam objectos atirados às paredes.

Entrou no seu apartamento e ficou a escutar.  O som estridente de algo que caía no chão fez-se ouvir em todo o andar.

- Já basta.  Não é possível este inferno todas as noites.  Resolveu ligar para as autoridades que não demoraram muito a chegar.

Ainda havia discussão quando eles bateram à porta do casal.

- Até parece que casais não discutem, senhores agentes.

- Discutir sem incomodar o prédio todo.  Nós ouvimos aqui de fora a discussão,  imagino os vizinhos com paredes comuns.

- Os vizinhos que se metam na vida deles.  Gente chata.

- Onde está o seu marido?  Queremos falar com ele.

- Está na sala.  Sofreu um acidente.  Escorregou e bateu a cabeça na quina do móvel.

- Vá chamá-lo se faz favor.

Um dos agentes levou o marido para um canto do corredor e perguntou o que tinha acontecido.

- Escorreguei sim.

- Sabe que a nós pode dizer tudo.  Não tenha vergonha pois o que você passa, muitos homens passam e não denunciam por medo e especialmente vergonha.  Raramente um homem denúncia a violência que sofre.
Podemos conduzi-lo à delegacia e apresenta queixa.

- Eu estou bem. Escorreguei mesmo.

- Deve ir ao hospital.  Esse ferimento na cabeça está feio.

- É superficial.  Foi só de raspão.

Juliette,  a vizinha, assistia a tudo  à sua porta e entrou quando os agentes foram embora.

Lamento, mas não estou bem.Onde histórias criam vida. Descubra agora