Capítulo 7

1.8K 39 9
                                    

Quase uma hora de espera. Decido enviar outra mensagem para Olívia:

Oli, se estiver lendo isso, será que pode me responder? Não me importa se vai usar um emoji de dedão, tal qual um senhor carrancudo de cinquenta e nove anos, desde que dê ALGUM sinal de vida.

E espero. Espero impacientemente sentada em uma das arquibancadas do ginásio, observando de longe enquanto uma equipe contratada monta um palco onde o DJ irá tocar mais tarde. Espero enquanto uma manada de alunos invade a quadra com caixas de som, freezers entupidos de bebida alcoólica e globos de discoteca saídos direito dos anos 70. Espero, contra todos os meus instintos aflitos, que Olívia apareça de onde quer que tenha se metido sem deixar recado.

Então me canso da inércia interminável e digito outra mensagem. Desta vez sou bem mais apelativa:

Sua mãe vai mesmo te matar. Ela acha que estamos juntas, Oli. O que eu vou dizer se Ruth me ligar? Devo acobertar sua fuga? Sabe que vou cobrar uma taxa por isso, não é?

Clico em enviar e consigo aguardar um minuto inteiro sem escrever nada. Estou quase orgulhosa de meu autocontrole quando perco uma guerra contra o bom-senso e acrescento, mordendo o lábio inferior:

Talvez eu tome o Douglas de volta.

Isso é algo em que venho evitando pensar – Olívia e meu travesseiro de um metro e meio. Ele é ótimo para abraços noturnos e tudo mais, mas me pergunto... Me pergunto se ela o usa como eu costumava usá-lo – de madrugada, na penumbra do meu quarto, quando ninguém estava acordado para testemunhar os sons abafados que deixavam meus lábios enquanto eu me esfregava contra aquele amontoado de plumas com um CPF próprio – uma confissão vergonhosa, reconheço. Eu jamais admitirei em voz alta. Prefiro morrer.

Mas talvez e, veja, apenas talvez Olívia o esteja aproveitando da maneira correta, como eu o aproveitava. Para ser honesta, minhas intenções em presenteá-la com um objeto multifuncional não foram completamente altruístas. Havia algo em mim – perverso e frustrado e um pouco ambicioso –, que queria desfrutar da ideia de que, em algum momento de sua vida, Olívia poderia se divertir com algo meu. Algo que me pertenceu. Algo que me deu prazer e que, naquele momento, servia para lhe dar prazer.

Um travesseiro foi o melhor que consegui sem levantar muitas suspeitas, mas agora... As coisas entre nós haviam mudado. Eu havia dado prazer à Olívia pessoalmente. Havíamos rompido uma barreira, extrapolado um limite, quebrado uma regra. Um travesseiro não seria mais necessário, se eu pudesse evitar. Depois do que aconteceu naquele banheiro, meu corpo e minha mente entraram em uma sintonia divina, onde tudo o que existe é Olívia e as coisas maravilhosas que podemos fazer uma com a outra. E são tantas possibilidades...

Não consigo calcular quanto tempo se passou desde a última mensagem quando meu celular vibra em minhas mãos com uma nova notificação. Alívio me inunda quando vejo que é Olívia, em resposta à minha ameaça de talvez tomar o travesseiro de volta:

Olívia: Você não ousaria.

É irritante o modo como sou incapaz de reprimir um sorriso. Fico pairando os dedos sobre a tela, mordendo o lábio enquanto penso no que dizer.

Hellen: Posso saber onde você se meteu?
P.S: O Douglas ainda é um tópico sensível pra mim. Talvez eu tenha uma recaída e o roube de volta. Invasões na madrugada e tudo mais.

Um ruído agudo e ensurdecedor me faz tapar os ouvidos quando algum idiota conecta um microfone na caixa de som e começa a imitar uma sirene. Não demora para que uma das garotas arranque o som da tomada e expulse o engraçadinho da quadra aos chutes e empurrões. 

Olívia: Tive que ajudar uma amiga. Ela não estava muito bem depois do jogo e resolvemos trazê-la para casa. Desculpe se deixei você preocupada.

Franzo as sobrancelhas para a tela, repassando mentalmente qual das amigas de Oli pode ser a garota em questão, quando outra mensagem chega logo em seguida:

Olívia: Parabéns, aliás! Você foi espetacular, Hel. Como sempre.

E então:

Olívia: P.S: Não se atreva a roubar meu travesseiro na calada da noite. 

Simples assim, meu sorriso está de volta, largo, genuíno e radiante. Olívia me acha espetacular. Isso me faz ter saudade dela. Quero beijá-la incessantemente, pelo resto da noite, enquanto a mostro exatamente o quão feliz estou com seu elogio.

Como a pateta apaixonada e cheia de tesão acumulado que sou.

Hellen: Espero que ela esteja bem, quem quer que seja sua amiga. E obrigada! Vocês foram muito bem no jogo. Eu estaria igualmente feliz se seu time tivesse vencido.

Olívia: Não estaria, não.

Dou risada, porque ela tem razão. O que posso fazer? Sou extremamente competitiva. Mesmo que Olívia tenha sido minha adversária no jogo, vencer o campeonato foi questão de honra.

Hellen: Já tem uma data prevista pra voltar?

Olívia: Você não costuma ser tão dramática, Hel. E, respondendo à sua pergunta: não. Não sei se vou voltar para a festa. Meu pessoal quer fazer algo à parte, o que acho ótimo, visto que não fomos nós os vencedores e seria meio patético ficar olhando enquanto vocês comemoram.

Por algum motivo completamente irracional, me sinto traída.

Hellen: Isso é uma completa besteira, Oli. A festa é pra todo mundo. Inclusive para os quase vencedores.

Olívia: É muito gentil de sua parte dizer isso.

Mordo a unha do polegar, imersa naquela conversa e completamente indiferente ao caos da arrumação que acontece ao meu redor. Não me sinto culpada por não ajudar. Dois gols, um tornozelo torcido e um ombro com hematomas já foram sacrifícios o suficiente.

Hellen: O que posso fazer para convencê-la a vir?

Olívia: Está tentando me subornar?

Hellen: Talvez. Talvez eu denuncie você para Ruth por me abandonar.

Olívia responde com um emoji de cobra. No segundo seguinte, digita:

Olívia: Preciso ir, Hel. Curta sua festa. Por favor, não se preocupe comigo.

Estreito os olhos para a tela e fico esperando que ela diga mais alguma coisa. Uma provocação, talvez. Um comentário sarcástico sobre sua mãe. Uma ameaça sórdida. Mas o online desaparece e percebo que Olívia realmente encerrou a conversa.

Tento me convencer a não pensar muito nisso. Não posso obrigá-la a fazer o que eu quero. Se ela prefere se divertir com seus colegas de turma, tudo o que posso fazer a respeito é aceitar, resignada.

Mas isso não impede que eu ainda me sinta um pouco traída.

Meu Pecado Fraternal - Conto rápidoOnde histórias criam vida. Descubra agora