VI - Evasivas

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Fui covarde. Minha intenção original era devolver o diário diretamente, explicar o que tinha acontecido e como o encontrei, me desculpar por ter lido e talvez, se ele não estivesse irritado demais, tentar entender porque Bradley vinha me evitando. Mas fui covarde e não consegui, só de pensar no que ele faria se descobrisse que li seu diário... Era uma imagem mental que eu não queria ter e uma coisa que não queria viver.

Acabei levando o caderno para os achados e perdidos na Reitoria e, enquanto saia do prédio depois do meu ato de covardia, tentei pensar em formas de começar uma conversa com Brad, uma que não acabasse em uma discussão ou com ele fugindo, e, convenientemente, ele veio direto para os meus braços, literalmente.

Bradley esbarrou em mim e quase nos jogou no chão. Me senti muito sortudo, minha oportunidade de esclarecer minhas dúvidas caiu bem em cima de mim, sem me deixar tempo para refletir muito e acabar perdendo a coragem, como foi o caso com o diário. Teria sido perfeito, se nossa interação não tivesse escalado daquele jeito. Não sei por que, mas não esperei que ele falasse comigo daquela maneira, o que não fazia sentido nenhum, eu sei que o cara me odeia, não era só por ter lido as palavras carinhosas dele sobre alguém que ele começaria a falar comigo daquela maneira.

Fui um idiota, me surpreendi pelo tom da conversa, fiquei chateado e não medi bem o que estava dizendo, acho que o chateei e seus olhos azuis magoados voltavam a mim naquela noite de insônia. Como ia resolver aquilo? Quando teria uma oportunidade para falar com ele de novo? Bradley provavelmente não queria nem ver a minha cara, quem dirá conversar comigo.

Parecia que naquele dia eu só tinha cometido erros, tantas coisas poderiam ter evitado aquele resultado, para começar se eu tivesse seguido o plano inicial na cafeteria e ido atrás dele. Nunca teria encontrado o diário, nunca o teria lido e nunca teria chateado Brad em frente à Reitoria. Em um universo paralelo talvez eu tivesse conversado com ele, nós teríamos nos resolvido, estabelecido uma amizade, eu perceberia os meus sentimentos com o tempo, talvez em algum momento arranjasse coragem para me declarar e nós dois poderíamos...

Aquela ilusão era linda, mas tão longe da realidade que chegava a ser dolorosa. Aqueles curtos minutos em que tive Bradley nos meus braços... Queria que aquilo se repetisse milhares de vezes, queria o abraçar sempre que possível, dançar com ele em festas, o ver sorrir com sinceridade, um sorriso que nunca foi dirigido a mim. O cara por quem Brad estava apaixonado não sabia a sorte que tinha.

Os três dias seguintes foram terríveis. Tentei me aproximar de Bradley nas aulas que tínhamos juntos, mas ele sempre conseguia um jeito de me evitar, as vezes Tank me lançava olhares recriminadores, como se me xingasse por chatear o amigo dele. Me sentia cada vez pior todas as vezes que Brad virava as costas e saía rápido de perto de mim e, como se isso não bastasse, as palavras daquele diário ficavam rondando a minha cabeça me fazendo procurar o "Ele", mas, até onde sei, ele pode nem ser das aulas que compartilho com Bradley e com certeza não é saudável tentar saber quem é.

Mesmo sabendo disso não conseguia evitar ficar tenso sempre que algum cara ia conversar com Brad, mas para a minha sorte, ou azar, nenhum batia com as características descritas por ele, então eu continuava sem saber quem é, talvez isso fosse bom, mas o peso no meu peito insistia em me fazer pensar naquilo com uma frequência dolorosa.

Na sexta-feira fui ao café com P.J e Bobby, Mocha ia se apresentar e P.J sempre insistia para que fôssemos com ele para dar apoio à arte da namorada. A ideia não me desagradava, o café era bom e o ambiente agradável, Mocha é uma garota legal e boa artista então ouvir seus poemas não era ruim, mas naquele dia não me sentia com ânimo para nada daquilo.

Quando achamos uma mesa perto do palco Bobby saiu para fazer os nossos pedidos, me deixando sozinho com P.J, que ultimamente vinha incorporando a vibe de estudante intelectual, acho que para combinar com a namorada.

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