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Olivia

Eu sei que não deveria confiar em um estranho.

Eu não deveria mesmo. Mas estou no carro de Ares agora, segurando com toda a força a garrafa de vidro entre os meus dedos e esperando que ele faça qualquer movimento brusco para quebrá-la e enfiá-la bem profundamente na jugular dele.

Eu o faria sem pensar duas vezes e sem nenhum remorso, afinal, eu sequer o conheço. Ele é um homem alto, forte e atraente, mas é tudo que sei. Não o conheço como um amigo o conheceria, menos ainda como um familiar o conheceria, o que torna um assassinato muito mais fácil para mim.

Eu não deveria estar pensando em assassinar a única pessoa que me estendeu a mão. Eu não deveria bolar planos e mil maneiras de acabar com a sua vida, mas sendo uma mulher com as vivências que tenho, simplesmente não consigo deixar de pensar no pior.

Não me lembro de como foi a minha vida antes de toda essa merda. Não me lembro se fui uma boa filha, uma boa irmã, eu boa amiga... uma boa namorada, talvez?

Existe a chance de eu ter sido ainda pior do que sou hoje. De ser uma versão ainda mais insana e perigosa de mim mesma. O desejo de sobrevivência plantou em mim um sentimento primitivo e sombrio e eu estou sempre pronta para matar. Seja lá quem for.

Ele deveria saber que não pode confiar em mim. Será que ele é tão auto confiante que acha que eu nunca seria páreo para ele?

Minha cabeça se derrama em um turbilhão de pensamentos e eu só percebo que estou mantendo os meus olhos nele quando o carro para no sinal vermelho e ele me encara, erguendo as sobrancelhas grossas.

- Gosta do que vê?

Abro a boca para responder, as palavras não saem.

Minhas bochechas queimam e desvio os olhos, olhando para frente, encarando meu próprio reflexo no vidro. Estou vermelha. Que merda!

Quero xingar a mim mesma por ter sido pega bisbilhotando, mas eu mal reparei que meus olhos estavam focados nele - até que ele me fizesse a pergunta mais tosca do mundo.

- O gato comeu sua língua?

Um sorriso se espalha em seu rosto e eu volto a encará-lo agora. Engulo em seco, mas ergo o meu nariz e o encaro com toda a minha confiança:
- Não. Não gostei.

- Você parecia bem concentrada em me encarar, Olivia. - Seus dedos batucam o volante e ele encara o lado de fora, conferindo o sinal.

- Não deveria confiar em uma estranha.

- Não deveria confiar em um estranho. - Ele usa suas palavras contra mim.

- Nem que quisesse você poderia me machucar. - Blefo.

- Ah, é? - Ares dá uma risada sem humor e umedece os lábios, enquanto dá partida mais uma vez. Ele não me encara e parece concentrado na sua tarefa. - Tenho quase o dobro do seu peso, Olívia, além de ser vários centímetros mais alto que você.

- O que te garante que isso diz algo sobre mim ou minha aptidão para luta corporal?

- Bem, primeiramente, se você tivesse alguma, eu tenho certeza que suas pernas e braços não estariam ralados. E segundo, esse seu rosto inchado e roxo - Seus dedos vêm até a minha bochecha e seus olhos descem sobre mim antes que ele se ajeite e volte a olhar para fora. - se você tivesse mesmo alguma aptidão para luta, não estaria tão machucada.

- Meu adversário ficou pior. - Rosno, bufando.

- Tudo bem, vou fingir que acredito em você. Melhor? - Ele me lança um sorriso ladino.

Suspiro pesadamente, começando a me arrepender completamente da minha decisão impensada de entrar no carro dele, de aceitar a ajuda dele e estar conversando com ele.

Será que ainda dá tempo de pular para fora?

- Olívia, eu não vou tocar em você. Não contra a sua vontade. - Ele para o carro, agora definitivamente, é a primeira vez que olho de verdade para fora. - Quando eu for comer você, você vai olhar no fundo dos meus olhos e implorar.

Dou uma risada alta, mas sua frase mexeu com algo dentro de mim. Um choque me percorre, algo que não reconheço em meu próprio corpo.

Ele está próximo de mim. Tão perto, que posso sentir a quentura do seu corpo e sua respiração batendo contra a minha bochecha.

Tão perto, que se torna perigoso.

Aperto involuntariamente a garrafa entre os meus dedos e ele sorri, enquanto seus olhos desviam para mim e depois para a porta.

- Em seus sonhos molhados, talvez isso aconteça. - murmuro.

- Veremos.

E ele destranca a porta, se afastando de mim bruscamente. Sinto frio quando seu corpo deixa o meu e quase gemo em protesto, mas me recomponho.

Quando desço, tenho a visão do prédio magnífico e enorme. Meu corpo inteiro estremece quando me dou conta de onde estou.

Isso foi uma péssima ideia, a pior que já tive em toda a minha vida. Mas não tenho escolha e não existe volta...

- Seja bem-vinda ao meu apartamento.

OBSESSÃO INSANA | LIVRO 01Onde histórias criam vida. Descubra agora