31 de Outubro de 2003
Eu corro, corro, mas nunca encontro a saída. Sinto que estou presa em um labirinto, não encontro a saída, eles vão me pegar. É halloween, a minha época favorita do ano, sempre gostei das travessuras, a forma como as pessoas pulam e suam frio diante do medo, a forma como se sentem vivas, eu amo o medo. A sua pupila dilata, seu corpo sente todas as sensações mais extremas e o nirvana de emoções é atingido. Eu ainda estou correndo, mas esse jogo não está nem um pouco divertido.
Me mudei para Nexus no final do ano passado, obviamente, por mais que a cidade seja cheia de mistérios e aventuras, nunca imaginei que existiriam pessoas realmente más, é muito mais do que a minha cabeça de dezessete anos processou nesse tempo. Eu amo parques de diversões, a casa de espelhos é a minha favorita, os reflexos se movem e em um instante é você e no outro são mil imagens fragmentadas. Qual é o seu verdadeiro reflexo? Quem é você de verdade?
E os carosséis? Ah! O mundo girando em câmera lenta, as luzes e a música macabra animada soando ao fundo, eu nunca vou ser velha demais para isso. Eu só não imaginava que também não chegaria a ser velha o suficiente para continuar aproveitando tudo isso, minha vida seria ceifada naquele dia. Sinto meus pés fraquejando, estou presa no labirinto fictício e, pela primeira vez na vida, não consigo achar a saída.
Resolvi, de última hora, me juntar a um grupo de "amigos" para curtir a festa, sequer cogitei que tudo isso não passava de uma emboscada. Eu devia ter pensado melhor, eles nunca haviam sequer reparado em mim antes, ou era o que eu pensava. Sempre andei cabisbaixa, os óculos de fundo de garrafa deixando as orbes gigantes, o cabelo loiro escuro caindo em cascata e o mesmo vestido rosa de frufrus e tules adornando meu cotidiano. Eu gosto de ser estranha, eu gosto da forma como o cetim me serve como uma luva, como os babados me tornam um anjo de porcelana. Não preciso ser igual aos demais, a Harriet Parson nunca será como as demais, ela é única.
Algo prende meu vestido e eu caio no chão, consigo escutar risos e os gritos ao redor do labirinto "bruxa!", eles entoam. De repente, me sinto em uma espécie de inquisição, um agarre surge no meu pé e eu grito, todas as sensações se aflorando dentro de mim. Não é esse medo que eu gosto de sentir. O homem parado acima de mim veste roupas escuras, a palavra "caçador" fora pichada descuidadamente em branco sobre o moletom. Reprimo um soluço e me debato o máximo que consigo. Eu sou uma lutadora, eu não desisto, nós mulheres aprendemos a lutar antes mesmo que nos fosse ensinado a falar, o mundo é uma porra quando se é uma mulher.
Atinjo seu rosto com o molho de chaves que prendi entre os dedos para formar um soco inglês, casa, eu quero ir para casa. Sinto o metal afundando em sua carne enquanto ele se contorce de dor, não demoro para continuar a correr. Pulo as grades insalubres e corro em direção a floresta, quando paro de escutar os passos, consigo enxergar o Jardim das Hespérides a frente. Meu coração está na garganta, sinto as lágrimas sobre as bochechas e as enxugo com raiva. Se eu fosse homem, isso aconteceria comigo?
Me recosto sobre um pinheiro, meu vestido favorito está em frangalhos, meu corpo lateja pela fuga e não tenho mais forças. Meus pés estão sangrando, as sapatilhas devem ter sido perdidas há muito tempo. Observo o Jardim, será que um dia chegaria a conhecê-lo? Puxo o ar com dificuldade, eu devia ter trazido a minha bombinha, mas justo hoje eu a esqueci em casa. Os ventos ecoam pela floresta, escuto os sussurros e agouros das corujas, tento puxar o ar enquanto sinto o mundo se fechar para mim. Caminho lentamente, quando vejo a figura vestida igual o homem que deixei no labirinto. Puta que pariu, reúno minha última força restante e corro enquanto sufoco.
Escuto seus passos apressados, quebrando os galhos e moendo as folhas secas pelo chão, olho para frente e paro, é um abismo, abaixo de mim só há a costa e a água do mar se chocando, é noite de maré cheia. Caio de joelhos, atônita, meus pulmões parecem estar colados, o ar não chega até eles, levo as mãos até a garganta, o mundo escurecendo de repente, o mundo, a cidade de Nexus que um dia tanto amei. E então ele ri, um tom de escárnio em sua voz, eu vou morrer. Me arrasto pelas pedras até a beirada, nenhum homem terá meu sangue em suas mãos. Quando ele se abaixa para me pegar, eu me atiro sobre o penhasco. Eu ainda sinto tudo, meus ossos, cada fragmento de meu ser se chocando contra as rochas, tudo se despedaçando em inúmeros pedaços. O sangue nublando as orbes, o óculos estilhaçando, estou caindo em câmera lenta pela eternidade. Então tudo para, eu não sinto mais nada, estou morta e minha família nunca irá encontrar o meu corpo.
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Hunth You
ParanormalTW: violência, luto, depressão, perseguição, dark romance A mansão Astley guarda seus segredos, mas o mais incompreensível é o seu único residente vivo, Hunther Astley III. OBS: História de um personagem de RPG de minha autoria, cada conto é comple...