Capítulo Um - Os Blackblood procuram uma noiva.

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Levi Blackblood era assombrado pelos sonhos de sua quase morte. A dor em seu pescoço dilacerado, seu sangue vertendo e esfriando por entre seus dedos e sua respiração falhada pareciam tão reais todas as noites como se estivesse acontecendo novamente. Sua visão falhava quando uma figura branca e laranja aproximou-se dele. Sabia que era uma mulher. O cabelo era liso e brilhante, incandescente, laranja como o por do sol.  Ela curvou-se sobre ele e segurou seu rosto com as duas mãos, que pareciam queimar a pele dele. Levi lembrava particularmente do cheiro, era algum tipo de combinação de especiarias e emanava do cabelo dela. Não conseguiu distinguir as características do seu rosto. Estava escuro e aquela era uma madrugada sombria. Os olhos de Levi falharam com ele. 

-Espero que você entenda, que isso é uma exceção e uma necessidade, não se ofenda e não me entenda mal.

Disse a figura, com uma voz suave e até ligeiramente condescendente, antes de beijar suavemente o pescoço de Levi, logo abaixo de seu maxilar, em um ato que parecia mais íntimo do que um beijo na boca. Um formigamento desceu até o rasgo no pescoço e então Levi apagou. Ou melhor, acordou.

Os grilos ainda cantavam e as cortinas de seu quarto exibiam um tom ligeiramente azulado, típico do amanhecer.

Levi não levantou da cama imediatamente. Nunca soube se a mulher do seu sonho realmente era real. De fato, quase morreu aos quinze anos, quando inventou que era forte o suficiente para caçar um vampiro que aterrorizava a região onde morava, mas seu poderes na época estavam longe, muito longe do auge. Sua peripécia causou-lhe uma cicatriz da base da mandíbula até a clavícula originadas pelas garras do vampiro, que não ousou morde-lo, e fugiu. Desmaiou encostado em uma arvore e foi resgatado por seu pai. Quando perguntou sobre a mulher não teve respostas. Poderia ter sido um delírio. Provavelmente era um. Afinal, depois disso suas habilidades regenerativas finalmente começaram a se manifestar. Levi se prometeu que investigaria, mas não teve tempo. Aquele foi um ano difícil. Muito difícil. 

Depois de olhar para a estampa do dossel o suficiente, Levi levantou. O dia ainda começava timidamente. O céu brilhava com as sete cores do arco íris, parecendo uma bolha de sabão sobre suas cabeças, um acontecimento normal em One Hall. Como seu humor estava estranho, Levi comeu no jardim. Os pássaros cantavam lindamente e seu mordomo serviu café. Era seu dia de folga do trabalho como Exterminador. E parecia um bom dia para tocar harpa, ou violino ou piano. E ler um livro. Ou dois. Talvez dormir no jardim, embaixo do dossel, é claro, para os pássaros não embranquecerem sua cabeça. Enquanto pensava o que faria e mordia seu pão com ovo, seu mordomo trouxe um convite. 

-Acabou de chegar, meu senhor. 

O mordomo ofereceu o convite em uma bandeja, junto ao abridor de cartas. Pela cor vermelha escura e o símbolo de foice preto e branco no selo Levi já sabia que era uma carta de seu pai. Levi largou o pão e limpou os dedos antes de pegar e abrir a carta. Seu pai não enviava cartas de manhã cedo. Ao ler o conteúdo as sobrancelhas de Levi se levantaram surpreso. 

-Vamos entrar no palácio hoje, William. 

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Ginger Garden olhava para sua irmã adubando o jardim com consternação. Suas narinas ardiam, enquanto ela segurava o saco de fertilizante.  Aquele cheiro azedo de dejetos, frutas podres e terra era terrível. Choraria se pudesse, mas estava nauseada com o cheiro. Ela até vomitaria, se não tivesse que limpar depois. Ginger se assumia uma jovem donzela fresca. Muito fresca. Não queria saber de coisas feias, podres ou fedorentas. Ninguém que tivesse a mente no lugar gostaria, mas para Ginger era pior! Não sabia lidar com elas, apesar de praticamente ser uma exigência da vida para qualquer adulto independente. Vermes a faziam tremer, buracos pequenos e escuros causavam arrepios e não comeria qualquer comida que a lembrasse minimamente o que se fazia na latrina.  No fim, Ginger ainda lidava com tudo isso com as poucas e parcas forças mentais que tinha, algumas vezes chorando. 

Amor na Terra dos MortosOnde histórias criam vida. Descubra agora