Capítulo 2 - O Funeral

2 0 0
                                    

Martina acorda assustada no fim da madrugada com seu celular tocando, Gatorro se aninha a ela com medo e perturbador pelo barulho. Joaquim segue dormindo tranquilamente ao seu lado. Ela atende e alguns segundos se passa até seu mundo desmoronar,
Joaquim acorda uns minutos depois, estranhando a amiga chorando de soluçar no canto da sala e vai até ela.
— O que foi? Martina meu Deus você está tremendo o que foi? — Ele agarra sua cintura e a ergue sentando no sofá novamente, ela tenta falar sem conseguir formular uma frase possível de entender, Gatorro vai novamente para o seu lado e Joaquim aproveita para ir pegar um copo de água com açúcar. — Lembra aquela aula de yoga que te levei? Inspira, conta até 3 e expira. Faz isso em sequência ok? -Martina segura as próprias mãos e faz o que aprendeu 2 vezes, Joaquim chega com a água e um pedaço de bolo de chocolate considerável em um pratinho raso. Ele coloca mechas do cabelo dela atrás de sua orelha após deixar a água e o bolo na mesinha ao lado, se ajoelhando frente a ela, pega seu rosto e fixa as testas junto.
— Pode-me dizer o que aconteceu, não fique com medo, ok? Eu tô aqui.
— Ela morreu. Alana. — Ele se distancia e olha a amiga voltar a chorar. Então é esse o problema? A vaca da ex dela morreu? Que se exploda Alana. Mas ele sabe que não pode ser insensível assim com Martina, então ele reúne todas as suas forças para ser falso e parecer preocupado.
— Agora?
— Faz uns 30 minutos que a tia dela me ligou contando. — Martina pegou o copo.
— Como foi?
— Um acidente de carro na Avenida Cristiano Machado — “Claro que ela ia morrer em um acidente de carro” pensou Joaquim e deixou escapar um som parecido com uma risada.
— O que tem de tão engraçado?
— Nada, é só que eu estava lembrando como ela gostava de dirigir de noite.
— Ah, isso é. Mas parece que essa noite ela tava com o carro cheio, o que não é típico dela sabe ela gosta mais de coisas calmas e pequenas e… — Martina então percebeu, não poderia mais se referir no presente quando se tratava de Alana, agora era tudo no passado. Isso fez com que ela voltasse a chorar mais e mais. Joaquim abraçou sua cintura e deixou as lágrimas da amiga caírem em seu cabelo.
— O funeral vai ser quando?
-Hoje às 8:00. — Ela pega o copo de água e vira de uma vez tremendo, depois agarra o prato com o bolo e vai comendo o pedaço como se não houvesse amanhã.
— Eu vou com você, só vamos esperar o dia amanhecer e vou até em casa me trocar. Pode ser? — Ela faz que sim com a cabeça e lambe os dedos da mão suja de cobertura. Joaquim pega um lencinho de papel em cima da mesinha e limpa as lágrimas e o rosto sujo de Martina. — Vai ficar tudo bem, ok?
— Acredito em você.

O velório foi lindo para a visão da falecida, mesmo contendo poucas pessoas, suas tias Margarete e Suzana, que a criaram, estavam despedaçadas mas choravam baixinho envolta de seu caixão fechado, mesmo que Alana odiasse essas demonstrações, por mais mínimas que fossem. Também havia seu primo Gabriel e sua meia irmã Ruth. Ao invés de flores, que Alana detestava, haviam cactos de diferentes tamanhos mandados por seu primo Elias, como ele gostava dela, mas infelizmente não pode comparecer por ter que realizar uma cirurgia naquela manhã em Curitiba. Ninguém usava vestido, Alana também os detestava, palavras não foram ditas por ninguém já que ela achava tudo dramático demais. Martina estava usando um macacão preto que Alana havia lhe dado, “cores demais são fúteis, ninguém precisa de nada além de preto” ela dizia. Tudo estava perfeitamente no seu lugar e tudo seguia como o Plano de Funeral Perfeito, que Alana tinha escrito aos 13 anos e deixado com Ruth. Mas Martina não conseguia segurar, ela não conseguia segurar as lágrimas, sentia que precisava falar sobre o grande amor que viveu com Alana, mas foi impedida pela tia Suzana. “Ela não queria drama então não daremos isso”.

Joaquim? Não estava lá, ele falou que iria em casa se arrumar e simplesmente desapareceu, não falou nada, não explicou nada, não atendeu nada. Mais tarde naquele dia, Martina encontraria uma carta deixada na portaria de seu prédio em que nela Joaquim dizia todos os seus sentimentos ruins sobre Alana, sobre como ele a detestava e esperava ansiosamente que ela queimasse no inferno, ele nunca a perdoaria pelo que foi feito a Martina. Covarde, acima de tudo não conseguiu ir acompanhar a amiga e ir no funeral de alguém que ajudou tanto, nem mesmo depois de tudo que ela fez por ele.

MelancolimaOnde histórias criam vida. Descubra agora