Quarenta e Sete

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“Estou sentada com os olhos bem abertos
E estou com uma coisa martelando a minha mente
Me perguntando se me livrei de uma cilada
Ou se perdi o amor da minha vida”
– I Don't Wanna Live Forever, ZAYN, Taylor Swift

30/07/1996

Cassiopeia encarou o delicioso bolo de morango com chocolate na vitrine da loja.

Tudo ali cheirava a doce, apesar de seu olfato parecer ter sido dissipado a semanas atrás, como se o cheiro de açúcar, creme e leite não pudesse a satisfazer como fazia antes. Os morangos no topo da camada de glacê daquele quitute formavam uma flor quase idêntica a uma Camélia. Cassie ficou parada ali até que a garota loira atrás do balcão lhe chamou atenção pela terceira vez.

━ Senhorita? ━ Perguntou ela, o sorriso simpático de sempre ainda em seu rosto e em seus olhos azuis.

Cassiopeia tornou a encará-la, e por um motivo não esboçou nenhuma expressão. Somente assentiu, lhe passando a quantia exata em pequenas moedas de euros. O dinheiro estava contado ultimamente, segundo Andrômeda, mas Cassiopeia ainda tinha metade da herança de Sirius Black em sua conta e não fazia a mínima ideia do que fazer com aquele tanto de dinheiro.

Nas duas semanas que passara na antiga casa dos Black, no largo Grimmauld, se empanturrou de seus doces e quitutes favoritos. Doces eram, desde que chegara no Reino Unido, a única constante em sua vida. É claro que o preço a se pagar foi alguns quilos extra que faziam seu corpo se tornar levemente mais curvilíneo. Nada que ela ligasse, obviamente. Não se interessava mais por sua aparência desde que seus cabelos loiros sumiram e deram espaço para aquelas longas mechas tão negras quanto eram cacheadas e difíceis de cuidar.

De vez em quando, tinha vontade de passar a tesoura e cortar o cabelo bem curto para que parasse de ver Bellatrix Lestrange toda vez que passava na frente de um espelho. Era inevitável e extremamente irritante que não conseguisse se livrar do legado ou da aparência que a marcava como uma Black.

Felizmente, no mundo dos trouxas, ninguém sabia quem era Cassiopeia. Era como se ela nem tivesse sobrenome, de qualquer modo. Andava livremente pelas ruas de Torridge com toda certeza que o pequeno vilarejo era formado somente por trouxas. Comprava doces quase todos os dias na mesma confeitaria, sentava-se e lia na livraria cujos livros não poderia simplesmente pegar para si, andava pelas ruas cujos outros presentes nunca a reconheceriam.

Como se nada nunca tivesse acontecido. Como se nada mais importasse, e ela não tivesse feito absolutamente nada errado para ninguém.

Quando voltava de ônibus para casa, Andrômeda e Ted estavam lá, lhe tratando bem como nenhum outro adulto jamais a tratou. Às vezes, Tonks aparecia por lá para dar um oi, pois tinha se mudado com Remus com a desculpa de ter que cuidar do noivo. Cassiopeia quase não entendia como aqueles dois tinham ficado tão próximos, mas parecia que Tonks realmente gostava de Remus e ele... bem, ele gostava dela também. Cassie só sabia, lá no fundo, que o verbo amar ainda existia naquele noivado súbito. Mesmo assim, estava contente pelos dois.

Remus era um amigo excepcional e fazia de tudo para que o "esconderijo" de Cassie não fosse descoberto e assombrado por aqueles que queriam a pegar quando ninguém olhava para completar os próprios objetivos.

Cassie podia se acostumar com aquela vida. Era o que pensava toda vez que se dirigia ao ponto de ônibus e se sentava ali sozinha.

Hoje, porém, se atrasou. Desassociou enquanto esperava na fila para comprar o próprio bolo de aniversário e pães para o chá da tarde. Para piorar, chovia muito e foi inevitável que se molhasse ao dar aquela corridinha até o outro lado da rua. O ponto se localizava numa estreita e vazia viela que ligava a área rural de Devon a Torridge. Por conta disso, a garota viu o ônibus ir embora sem ela.

𝒅𝒂𝒚𝒍𝒊𝒈𝒉𝒕 | 𝗇. 𝗅𝗈𝗇𝗀𝖻𝗈𝗍𝗍𝗈𝗆Where stories live. Discover now