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Duncan é tão silencioso como a floresta em volta da minha casa, eu não sei o porquê, mas sempre que tentava ouvir o barulho dos animais ou de qualquer inseto, eu não conseguia, cheguei até a pensar várias vezes que era meio surda. Eu finalmente estava do lado de fora novamente, não literalmente, já que no momento estou dentro do carro. Duncan me trata como uma criança, vou ter problemas com ele se o mesmo continuar me tratando assim. Tenho quase vinte anos nas costas, e ele disse que era mais seguro se eu me sentasse no banco de trás, e ainda exigiu que eu colocasse o cinto, ele até verificou se eu tinha feito certo, me senti uma idiota.

Duas horas de viagem, por uma estrada absurdamente deserta, quando meus olhos avistaram um posto de gasolina com uma lojinha atrás, eles brilharam, sei que brilharam.
— Vamos parar,por favor!?- Ele não respondeu, continuou dirigindo em silêncio, sem me olhar.- Por favor, Duncan!
— O que você quer aqui? O tanque está cheio, não há necessidade de fazer nenhuma parada.- Me soltei do cinto de segurança, e abri a janela para ver melhor, estávamos nos aproximando do estabelecimento.
— Tenho um problema de mulher lá embaixo…- Ele me olhou pelo retrovisor, mas não expressou nenhuma reação, provavelmente sabia que eu estava mentindo.- E eu estou com fome.- Percebi quando o homem respirou fundo e segurou a respiração, em seguida estacionando o carro, ele deve me odiar.

Andei pela loja olhando todos os produtos, querendo comprar todos, só pra saber qual é a sensação de comprar algo.
— Oi, moça…- Um garoto apareceu ao meu lado, ele parecia meio tímido, e logo atrás mais três garotos rindo.- É, meus amigos te acham bonita, queriam saber se você poderia passar o seu número de celular…- O garoto estava claramente nervoso, seu rosto estava vermelho e suas mãos estavam inquietas, seus olhos azuis me lembraram os de meu pai, o que me deixou levemente triste. Os cabelos negros rebeldes bagunçados e as sardas pelo rosto, traços encantadores, ele era muito bonito, o engraçado, era que os outros meninos eram muito parecidos uns com os outros, parecia até que eram irmãos gêmeos.
— Ah…eu não tenho, me desculpa…- Duncan surgiu de repente, encarando de maneira assustadora os garotos.
— Pegou o que queria?- Ele perguntou, direcionando seu olhar assustador para mim.
— Eu não sei o quê comprar, eu nunca comi nada disso.- Ele suspirou, claramente irritado com a situação.
— Seu pai?- O garoto perguntou, o homem atrás dele pareceu ofendido, achei engraçado ele levantar a sobrancelha.
— Não, meu pai morreu.- Eu não sei por que mencionei esse detalhe, eu talvez não tenha aceitado isso ainda, mesmo dizendo isso em voz alta. 
— Ah sim, sinto muito.- Eu acenei, querendo logo sair daquela situação.- É seu namorado, então?- O mais velho ficou me encarando, sei que ele queria revirar os olhos agora.
— Não, eu preciso ir.- O garoto acenou com a cabeça.

No caminho de volta para o carro, me lembrei que essa é a primeira interação que eu tenho com um garoto. 
— É bom você comer tudo isso aí.- Acenei com a cabeça, eu estava triste agora, não queria o deixar irritado de novo.- Não suja o meu carro!- Ele falou, sem olhar para mim. Fui o mais cuidadosa possível, porém o carro estava balançando demais, eu não sei que tipo de comida é essa, parecia macarrão, uma sopa de macarrão. Não faço ideia de como ele esquentou isso, mas estava quente, eu tinha que soprar para colocar na boca para não me queimar. Porém o inevitável aconteceu, a sopa queimou as minhas pernas, ele encostou o carro quando percebeu, e eu corri para fora, sem conseguir conter as lágrimas e os soluços altos. Eu não chorava por ter me queimado, porém chorava encarando minhas coxas vermelhas, eu não conseguia parar, nem mesmo quando ele ordenou que eu voltasse para o carro. Eu estava de costas para ele, chorando encarando as minhas próprias coxas, me sentindo estúpida por não conseguir comer a porra de uma sopa como uma pessoa normal. Ele não pareceu se importar com o meu chororô, o cara me puxou pelo braço e me colocou señtada do banco da frente com as perna para fora, ele jogou a água de uma garrafa sobre as minhas pernas, mordi os lábios inferiores quando ele apertou com força a minha coxa quando eu tentei me afastar. 
— Me escute com atenção, eu vou falar só uma vez, e é bom você entender. Eu não sou sua babá, você não é uma criança, e eu não quero ter que ficar correndo atrás de você por aí, a cada coisa colorida e “ interessante “ que você vê, me entendeu? Você não é responsabilidade minha, você é responsável por si mesma.- Ele soltou a minha coxa e se afastou, eu apenas revirei os olhos, coloquei minhas pernas para dentro do carro e fechei a porta.
— Pode voltar lá pra trás.- Suas feições, como sempre, sem expressão alguma, eu não sabia se ele estava irritado ou não.
— Eu não sou uma criança.- Me encostei no banco e virei a cara para a janela, deixando claro que não iria sair dali.

Mais duas horas de viagem e finalmente chegamos, analisando o lugar, percebi que aquele definitivamente não era o nosso destino final. Duncan tirou algumas coisas do carro, que logo percebi serem as minhas, e levou até a entrada da casa. Um velhinho apareceu, sorriu docemente ao me ver.
— Nós vamos…- Como o esperado ele não me deixou falar.
— Nós não, você!- Ele passou por mim carregando as minhas coisas, adentrou a casa, e deixou as minhas coisas em um sofá.
— Isso é sério?- Questionei, indo atrás dele.
— Seríssimo.- O maldito nem sequer direcionava um olhar para mim, eu queria que ele olhasse para mim, então agarrei o braço dele, antes que ele passasse por aquela porta.
— Duncan, por favor!- Ele me encarou, não vi nada além de indiferença em seus olhos, ele iria mesmo me deixar naquela casa sozinha.- Não me deixe aqui sozinha, eu quero ir com você!
— Não está sozinha, Alan irá te fazer companhia, sei que você tem dinheiro, pode conhecer a cidade, procurar um outro lugar para morar se quiser…
— O quê!? Eu não conheço ninguém aqui!- Ele quase revirou os olhos com a minha fala.
— Então conheça, não era o que você tanto queria? Conhecer pessoas, visitar lugares! Está livre para fazer isso agora, comigo você vai viver isolada de todos, trancada dentro de uma cabana, estou te dando a liberdade que os seu pais não deram, aproveite já que está segura.- Ele saiu, simplesmente saiu, sem se despedir, sem olhar para trás.  

𓇢𓆸

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⏰ Última atualização: Sep 04 ⏰

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