Antes que o trio tivesse cruzado a porta da sala de aula, uma cachoeira de lágrimas já anunciava sua chegada por meio dos olhos marejados de Valentina. De repente, as já tão rotineiras tremedeiras nas mãos e pernas, respiração ofegante, e crise de ansiedade apareceram para acompanhar a menina naquela situação de enorme desconforto e infelicidade.
Decidiu fechar a porta da sala e sentar-se mais uma vez em sua carteira; pelo menos, ela poderia chorar o quanto quisesse antes que algum professor chegasse para adentrar a sala, mas isso não aconteceria antes do término do horário de almoço dos professores.
E durante 40 minutos, Valentina chorou. Suas crises de ansiedade estavam ficando cada vez mais fortes e carregadas de outros sintomas, como sensação de sufocamento e pensamentos suicidas. Ouviu, então, o barulho da sirene, anunciando as 13:00hs da tarde, horário que se iniciavam as aulas do período vespertino. Rapidamente, Valentina enxugou as lágrimas e respirou fundo para recompor-se.
Resolveu descer de elevador, para que, além de chegar mais rápido até o térreo, ninguém a visse com o rosto vermelho, de tanto chorar, nos corredores da escola. Saiu da escola rapidamente e cruzou o portão menor, que por alguma sorte, estava aberto, passando assim despercebida pelo porteiro da escola.
Enquanto andava, perdida em seus pensamentos, ouviu barulhos de tiro. Nunca os havia ouvido antes em sua vida, então ficou extremamente assustada com isso. Em Guarapari, Espírito Santo, onde morava, não se era comum ouvir sons tão estrondosos no início da tarde.
Valentina correu o mais rápido que conseguiu em direção a uma igreja que estava aberta. Não pensou muito antes de entrar, afinal, ela poderia ser atingida por uma bala perdida facilmente.
Ao entrar, ofegante, ela esbarrou em uma mulher elegantemente vestida, com um blazer banco com botões dourados, e uma blusinha de seda branca, além de uma saia preta muito bonita.
Valentina derrubou o copo com água que Ana segurava, molhando parte da sua roupa. Quando olhou para a moça, notou que ela estava com um olhar bastante surpreso, não se sabe se era pela cara de pânico da menina, ou por suas roupas estarem molhadas, atacada por um gesto tão abrupto.
- Ahh, senhora, me desculpe! N-não era minha intenção! E-eu, sinto muito! Me desculpe!– Suplicou Valentina quase chorando.
- N-Não tem problema querida, é só um pouco de água. Mas, porquê você estava correndo tão rápido? Está tudo bem?
Ao terminar de proferir essas palavras, Ana se assustou com o som de outro tiro. Valentina notou que estes pareciam estar mais perto, e, em seguida, Marcos, o obreiro que estava recepcionando à porta, pediu que os irmãos que estavam na recepção entrassem para o salão da igreja. Ao dizer essas palavras, fechou bruscamente as portas da congregação, e também entrou.
Ana levou Valentina para o salão da igreja. Ao chegar lá, Valentina surpreendeu-se com a beleza do ambiente e com a paz que emanava daquele lugar. As paredes e colunas bem ornamentadas, os instrumentos e músicos sobre o altar, tocando uma suave melodia, as irmãs que participariam do Círculo de Oração naquela tarde conversando calma, mas ao mesmo tempo, animadamente, deixaram-na, de alguma forma, certa de que, naquele lugar, existia algum tipo de força capaz de espantar qualquer tipo de preocupação; isso era o que pensava Valentina, que ainda não conhecia o Deus que habitava ali.
Em poucos instantes, Valentina se viu calma. sua ansiedade, que há pouco estava atacada, a deixou. Suas mãos pararam de tremer, sua respiração normalizou e seu coração voltou a bater na velocidade normal.
Após passado o breve momento de pânico, e notando a curiosidade em seu olhar, Ana resolveu introduzir a menina àquele ambiente, até então desconhecido:
- Então pequena, qual o seu nome? - Indagou, na tentativa de fazê-la sentir mais confortável.
- Valentina. Me perdoe por não ter me apresentado antes. E qual o seu nome, senhora? - Retrucou, espantada consigo mesma por ter sido tão cordial com uma desconhecida, acontecimento que, até então, nunca vivenciara.
- Que nome lindo, Valentina. O meu nome é Ana, muito prazer. E, a propósito, pode esquecer o "senhora" e me chamar de irmã, tudo bem?
- Irmã? Como assim? - Questionou, Valentina, realmente confusa e curiosa pelo motivo da forma de tratamento que Ana desejava que ela seguisse.
- Sim, querida. Nós somos irmãs em Cristo Jesus. Por isso pedi para que me chamasse assim. – Resoluta, sorriu, e sentindo o Espírito tocar ao seu coração, emocionou-se.
Ana sentou-se com Valentina em um dos bancos vazios da igreja e começou a explicar-lhe o sentido de serem "irmãs em Cristo". Por ser seu primeiro contato com o Evangelho, ela não compreendeu muito, até porquê, não era um assunto que se ouve falar com muita frequência. Mas, por outro lado, estava realmente interessada em saber como os cristãos - que Valentina descobriu ser a forma como aquela denominação era conhecida - se relacionavam entre si.
Então, a pastora Ellen chamou as mulheres para iniciarem o culto. Naquela tarde aconteceria o primeiro dia do movimento "Déboras"; um movimento implementado ao Círculo de Oração corriqueiro, que guiaria as mulheres para a intimidade espiritual e para serem colunas das suas casas. Por ser um culto para mulheres adultas, com uma linguagem coerentes para tal, Ana sugeriu que Valentina voltasse no sábado, quando ocorreria o próximo culto para adolescentes.
- Tudo bem, sem problemas. Vou ver com minha mãe se consigo vir. E muito obrigada pelo convite. - Assentiu, sorrindo.
- Você não quer uma carona até em casa? Pode ser meio perigoso andar sozinha depois desses tiros. - Sugeriu Ana, verdadeiramente preocupada com a segurança da menina.
- Ah, não precisa, obrigada. Eu não moro tão longe daqui, rapidinho chego.
- Tem certeza? Não será incômodo nenhum!
- Bom, tudo bem. Mas só se não for incomodar mesmo.
Aliviada e estranhamente feliz, Ana sorriu e foi buscar sua bolsa, que estava alguns assentos à frente. Comunicou à pastora que em alguns minutos estaria de volta, e apressou os passos em direção a Valentina, animada com a ideia de deixá-la em casa. Claramente, Valentina estranhou a situação, sem entender o motivo da animação de Ana. A verdade é que Ana, além de estar um pouco curiosa para saber onde a menina vivia, também estava com fortíssimo desejo no coração de falar de Jesus para a família de Valentina, e deixar um convite formal para que eles pudessem visitar a igreja.
Seguindo as coordenadas dadas por Valentina, rapidamente chegaram ao destino. Ana analisou, sem ser invasiva, a aparência da residência, que ficava em um bairro de classe média baixa, mas que se diferenciava das casas ao seu redor por ser mais humilde que as demais. Na verdade, concluiu Ana, aparentava fazer bastante tempo que alguém havia podado o pé de cipó em frente a casa, ou que davam uma demão de tinta nas paredes.
Valentina sabia do estado deplorável que sua casa aparentava, por isso, abaixou o rosto envergonhada. Sem deixar sua educação de lado, agradeceu à Ana por sua carona, e fez que iria abrir a porta para sair. No entanto, Valentina sentiu que deveria esperar mais.
Não era essa uma sensação muito comum, o que a assustou um pouco, ainda mais quando ouviu uma voz suave, vinda de algum lugar, que ela não sabia onde, e que dizia: "Espere, não saia agora." Confusa e temerosa, Valentina travou no assento do carro, procurando inquietosamente a voz que ouvira.
Incrivelmente, Ana estava receosa em fazer ou falar algo; sabia em seu coração o que deveria fazer, porém, algo a impedia, o que também a deixou confusa e inquieta. Alguns segundos se passaram antes que uma das duas fizesse alguma coisa. O clima estava estranho entre ambas, pois não tinham certeza de como se dirigir uma a outra. Aquele "Algo" ainda as incomodava.
Elas não sabiam, mas o Senhor estava preparando a situação certa para agir.
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Lance sobre Ele toda a sua ansiedade
SpiritualDiante de inúmeros problemas na escola, em casa, e consigo mesma, Valentina encontra-se fechada e cativa de seus próprios sentimentos e pensamentos ansiosos. Ana aparece de repente em sua vida, uma renomada doutora que quer ajudá-la a superar as ama...