Prólogo - A Lenda dos Espíritos

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“A humanidade, nascida da terra, nutrida pela água, aquecida pelo fogo e inspirada pelo ar, carrega dentro de si os quatro elementos."

O Antigo Livro dos Espíritos, escrito pelo Mestre dos Elementos

[Capital do reino de Outorya, oitavo ano da Guerra dos Quatro Reinos, luas de setembro]

Até mesmo a mais leve das brisas conta uma história. Passando de lugares para lugares, presenciando aquilo que ninguém mais vê e carregando consigo as verdades não ditas. Em uma terra dividida por conflitos e guerras intermináveis, as brisas são as testemunhas silenciosas das batalhas cansadas e das lágrimas derramadas. Elas passavam sobre campos devastados, vilarejos abandonados, cidades fervilhando de vida, com suas casas aquecidas pelas experiências.

Foi nesse mundo turbulento que nasceu Han Jisung, o filho do Lorde Jiwoon. Seu pai, assim como todos os outros Lordes dos Quatro Reinos, se dizia rei, travando alianças e batalhas com as mais diversas pessoas pela coroa que considerava sua. Sua mãe, a Lady Haesoo, por outro lado, era uma mulher simples e de fé, ela sempre o encorajou a ouvir seu coração e os segredos que as mais leves das brisas tinham a contar. Desde quando ele era um bebê, as histórias sobre os grandiosos Espíritos Elementais e os seus Guardiões nunca foram deixadas de lado. Era uma tradição entre eles.

Todas as noites, antes de dormir, Jisung rumava até o quarto da mulher, se estreitando pelos corredores de sua casa, apenas para ouvir as histórias dos Espíritos. E Haesoo as contava com todo o prazer. Aconchegando seu filho no seu colo, ela acariciava seus cabelos, enquanto dizia:

— Há muito tempo, antes dos reinos e dos humanos, o mundo era governado por quatro Espíritos Elementais, que eram como grandes mágicos da natureza. Cada um deles representava um dos elementos mágicos: Ar, Água, Fogo e Terra.

— E quem eram eles, mamãe? — perguntou Jisung, com os olhos brilhando de curiosidade.

A mãe sorriu e começou a contar:

— Havia Aeris, o Espírito do Ar, que fazia as nuvens dançarem e o vento soprar. Ignis, o Espírito do Fogo, que fazia as chamas arderem e as fogueiras brilharem. Naida, o Espírito da Água, que fazia os rios correrem e as chuvas caírem. E Gaea, o Espírito da Terra, que fazia as árvores crescerem e as montanhas se erguerem.

Ela enrolava os fios de cabelo de Jisung com ternura.

— Esses Espíritos cuidavam do mundo, fazendo com que tudo funcionasse em perfeita harmonia. Mas, quando os humanos apareceram, com suas grandes invenções e sonhos, mas também com suas brigas e confusões, os Espíritos perceberam que precisariam de ajuda extra.

Ela fez uma pausa dramática.

— Então, eles criaram os Espíritos Guardiões, que eram como animais mágicos. Esses Guardiões ajudavam a proteger e a guiar os humanos, para que o mundo continuasse a ser um lugar mágico e equilibrado.

Jisung sorriu, sonhando com os mágicos Guardiões e os antigos Espíritos.

— Somos filhos do Lobo, não é?

— Sim, somos. Ele é o grande protetor das florestas e das montanhas. E nos deu sua benção. Por conta disso, somos alfas, ômegas e betas.

— E o que eu sou? — ele ergueu a cabeça do colo da mulher, olhando em seus olhos, ansioso pela resposta.

— Você? Ainda é muito novo para sabermos. Quando já tiver idade, seu gênero lupino vai se revelar. — Haesoo tentou o tranquilizar, mas não funcionou. Jisung podia ser uma criança, porém ainda era muito esperto.

E sequer precisava ser um adulto para entender, seu pai sempre dizia, em claro e bom tom: ele precisa ser um alfa.

— O papai disse que...

— Não importa o que o seu pai quer, querido. Seu gênero lupino é escolhido pelo Grande Lobo, ele decide. — ela segurou o pequeno rosto da criança entre as duas mãos. — Se ele o fizer alfa, ômega ou beta, só cabe a nós aceitar e te amar do mesmo jeito, me entendeu?

Jisung concordou levemente com a cabeça, deitando-se novamente no colo da mãe. Eles ficaram alguns segundos em silêncio, até ele se pronunciar novamente.

— E o que aconteceu depois na história? — perguntou Jisung, com os olhos começando a fechar.

A mãe acariciou seus cabelos e começou a contar:

— Bem, depois que os Espíritos criaram os Guardiões, eles viveram felizes por muito tempo, ajudando os humanos e mantendo tudo em equilíbrio. Mas, com o tempo, começaram a surgir pequenas discussões entre eles. Aeris, que adorava voar livremente, às vezes bagunçava as águas de Naida sem querer. E Ignis, com suas chamas, às vezes queimava as florestas de Gaea, sem querer.

Ela apagou a vela ao lado deles e continuou com um tom suave:

— Um dia, uma grande briga aconteceu. Aeris, sem querer, criou uma tempestade enorme que deixou Ignis muito brava. Ignis, então, causou um grande incêndio que queimou muitas das árvores de Gaea. Naida tentou usar suas águas para acalmar a situação, mas já era tarde demais. Para evitar mais problemas, os Espíritos decidiram se separar e cuidar apenas dos seus próprios domínios.

Ela fez uma pausa, como se estivesse pensando nas palavras certas:

— Mas isso não trouxe paz, só fez o mundo ficar desequilibrado. Guerras começaram a surgir por todo lado e por todos os motivos. Os humanos se tornaram amargurados e sedentos por poder.

Jisung fechou os olhos, enquanto a mãe continuava a fazer carinho em seus cabelos.

— Desde que a nossa guerra começou, muitos perderam a fé neles, mas eu ainda acredito. Ainda acredito na profecia. Sei que um dia o Escolhido vai acordar, se juntar aos Guardiões e restaurar a harmonia no mundo novamente. Então, essa guerra interminável vai, finalmente, chegar ao fim. Eu rezo por isso...

Com isso, Jisung adormeceu nos braços de sua mãe, embalado pelas histórias antigas e pelo conforto de sua voz. No entanto, as palavras da profecia ecoavam em sua mente, semeando sementes de um futuro incerto e repleto de desafios. Ele não entendia ainda, mas nas profundezas de seu coração, uma voz suave cantava uma melodia misteriosa, que parecia ser carregada por uma brisa gentil.

Enquanto ele dormia, a brisa leve e melodiosa continuava a sussurrar pelos corredores escuros da casa, carregando consigo as esperanças e sonhos de um futuro melhor.

O Escolhido do Ar - MinsungOnde histórias criam vida. Descubra agora