''O CIRCO CHEGOU A CIDADE!''
- Grande bosta... É só mais trabalho - Falei olhando para a placa.
Sou o palhaço de um maldito circo quase falido.
Entrei no meu camarim para fazer a maquiagem e vestir minha roupa, um macacão azul claro com bolinhas um pouco mais escuras. Peguei um litro de vodca para esperar até minha hora.
Costumava ser ''Bug, o magnifico palhaço azul'' fazia as piadas mais sujas e engraçadas para adultos e as melhores brincadeiras para as crianças, mas fui ficando velho e sem graça. Minhas piadas começaram a ficar repetitivas e estava sem ânimo para brincadeiras, comecei a ficar ranzinza como todo velho. Sentia fortes dores de cabeça e vomitava direto.
- Vamos Bug, sua vez - Era o apresentador - Ruunf... Ta cheirando a pinga! - Ele fala quando passo do seu lado.
- É vodca.
Entrei no palco com um copo de vodca, acendi um cigarro e parei na frente do microfone.
- O QUE VOCÊ ESTA BEBENDO PALHAÇO? - alguma criança da plateia tinha gritado.
- Água do Diabo! - Falei aproximando a boca do microfone e dei uma tragada no cigarro.
Dei uma olhada na plateia, devia ter no máximo umas 40 pessoas. Eu não estava com nenhuma vontade de fazer piadas. Senti náuseas
- O que é que tem cem perninhas, mas não anda? - Olhei para todos e ninguém sabia responder - cinquenta crianças paraplégicas!
Ninguém riu e olharam com suas caras feias.
- Ei você meu rapaz, já viu corrida de homem pelado? - apontei aleatoriamente para alguém
- NÃO!
- Então chegue mais cedo na casa de sua mulher - Alguns riram e pelo jeito ele ficou ofendido. Não me importo.
Tomei metade do copo de vodca e o derrubei no chão sem querer, ignorei.
- O filho pergunta para a mãe, mãe, o que eu vou ser quando crescer? E a mãe responde, Nada meu filho, você tem câncer.
Ninguém riu de novo e eles conseguiam ficar cada vez mais feios.
- Acho incrível a capacidade vocês de ficarem mais feios a cada piada que eu conto.
Alguns dele estavam indo embora e resmungavam.
- Ei! Não vão embora, me ensinem a ficar tão feio assim antes - dei uma ultima tragada no cigarro e o joguei no chão pisando em cima.
-Ei, Bug, já deu sua hora, volte logo para o seu camarim - Era o apresentador.
- Adeus babac... - Nem terminei de falar e me ajoelhei vomitando, levantei, limpei a boca com a manga do macacão e voltei para o meu camarim. Abri outro litro de vodca.
- Bug, seu idiota, tivemos que devolver o dinheiro para alguns deles e estamos falindo por sua culpa - O apresentador cuspia enquanto falava. Estava extremamente nervoso
- Aê, foda-se, não me importo.
- SEU MONTE DE MERDA, QUERO QUE VOCÊ ARRANJE UM JEITO DE PELO MENOS ENCHER METADE DA PLATEIA.
- E VOCÊ QUER QUE EU FAÇA O QUE? SÃO TODOS IDIOTAS QUE NÃO ENTENDEM HUMOR DE VERDADE!
- Humor negro?
- É
- Está proibido de usar qualquer piada do gênero e se usar ou não encher pelo metade da platéia estará demitido, tem uma semana para isso.
- Ah vai à merda!... Vou dar um jeito - Voltei para o meu litro de vodca e as náuseas ficavam cada vez mais fortes.
As dores de cabeça iam ficando cada vez mais forte durante a semana e vários outros problemas iam surgindo rapidamente. Pedi um aumento do prazo para lotar o circo, precisava ir ao médico e ele me deu até a última apresentação naquela cidade, então teria um mês. Nas primeiras duas semanas fui ao médico e descobri que estava com um tumor cerebral e ele ia piorando rapidamente.
Na terceira semana pensei no que ia fazer na minha, talvez última, apresentação. Na quarta e última semana espalhei vários cartazes, folders e convites pela cidade. Avisei em todos os mercados, lojas e bares.
Enfim o grande dia.
- AGORA! COM VOCÊS, BUG, O MAGNIFICO PALHAÇO AZUL!
Passei pelo lado do apresentador.
- Olha lá o que você vai fazer em - Ele sussurrou no meu ouvido.
- Vai ser o melhor espetáculo de todos.
Entrei em cena com meu cigarro, o copo de vodca e um sorriso no rosto. Tinha conseguido encher aquele lugar.
- Então... semana retrasada de-descobri que eu tenho c-câncer - Estava com dificuldade na fala.
Todos ficaram atônitos, principalmente meus colegas e companheiros de circo, não tinha falado para ninguém.
- E é um t-tumor cerebral... r-resolvi que não vou me tratar... q-quero acabar come ele de uma vez - tomei um grande gole de vodca e traguei o cigarro - E e-essa v-vai ser minha ú-última a-apresen.. tação -suspirei- E s-sabem qual é o me-melhor jeito de acabar com um t-tumor?
Tirei um revolver do meu bolso e apontei para minha cabeça. Ficaram todos assustados, até parece que nunca tinham visto uma arma antes.
- Você o locali... za e o d-destrói - apertei o gatilho.
Ouvi um não coletivo, já era tarde de mais. Aquela foi a minha última apresentação, a falência total do circo e a traumatização de centenas de pessoas.
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Contos sem título.
Historia CortaSão só alguns contos feito com muito amor, ou nenhum, sobre prostitutas, drogados, bêbados e fodidos.