Quando Simone chegou à Nova York pensou ainda estar dormindo e sonhando. Era tudo exatamente como ela tinha visto na internet. Aquela movimentação de pessoas quase insana, carros de luxo, taxis amarelos, metrô antigo e às vezes deixando a desejar pelo seu estado precário, um Starbucks em cada esquina e pessoas das mais diversas etnias. Tudo era mágico. Líbano tinha o calor humano, aquele ideal de igualdade e construção de uma nação sem excessos, beldades e uma culinária invejável. Mas essa igualdade a deixava pobre, antiga, marcada por um sofrimento diário, limitando os habitantes a um futuro incerto. E aos seus pés estava a contradição. O excesso, a desigualdade onde mendigos pediam esmola na calçada de uma loja Gucci, o consumo desnecessário e o país da oportunidade. Não há impossível para aquela cidade e até mesmo para aquele país. Era como sair do preto ao vermelho. Mas com tudo isso, ela estava feliz. Sorriu ao ver um senhor vendendo cachorro quente com um sorriso e continuou andando. Estava no bairro Queens, o taxi acabava de deixá-la na porta de um prédio com uma fachada antiga, um branco amarelado coberto d e janelas e alguns decorados com algumas plantas. Olhou pra cima com as malas ao seu lado e respirou o ar poluído de seu novo lar. Conferiu novamente o endereço e confirmou ser o certo. Procurando na internet achou um anuncio para compartilhar uma casa pequena e humilde naquele bairro com duas garotas. Leila Barros, uma jovem de pele cor caramelo e cabelo loiro, alta e com um corpo de tirar o fôlego, estudante de música e dança em Julliard. A outra, Anielle Franco, negra e com um sorriso perfeito. Aparentemente carismática e apaixonada por tudo que tivesse diamante artificial e brilho. Também estudava dança em Julliard, porém preenchia o aluguel com alguns trabalhos como modelo.Simone não tinha certeza no começo, era um país completamente novo onde ela estava completamente só. Porém depois de muitos dias conversando com as meninas por whatsapp e investigando qualquer coisa relacionada com Leila Barros e Anielle Franco, ela decidiu que era a decisão correta. O aluguel seria relativamente barato já que seria dividido entre as três. Ela sabia cozinhar, lavar e passar. Não era mimada e estava acostumada a andar de ônibus. O pouco dinheiro que seus pais haviam juntado era suficiente até ela conseguir um emprego. Então no final das contas, tudo estava indo conforme o plano.
Quando chegou à entrada do prédio, havia um cartaz no elevador indicando que estava quebrado, mas isso não a deixou frustrada. Com muita paciência e grande esforço foi subindo com as duas malas até chegar ao quarto andar, apartamento 33. Limpou o suor da testa com a mão e suspirou, endireitando a coluna e sentindo uma leve dor, devido ao esforço de se abaixar para arrastar os objetos, e finalmente tocou a campainha. Escutou a madeira reclamar do peso e segundos depois uma negra com um coque perfeitamente colocado no alto da cabeça, um short elástico apertado e meio curto, uma camisa roxa de alça do mesmo material e uma meia fina branca apareceu. Simone logo soube que era Anielle pela foto, mas não deixou de se sentir surpreendida pela beleza e corpo da garota que imediatamente a olhou de cima a baixo e sorriu abertamente ao finalizar a inspeção, sendo correspondida por uma Simone tímida.
- Oi... - Simone disse meio sem graça e Anielle não pensou duas vezes, avançou e abraçou a garota como se elas fossem amigas de longas datas. Simone no começo se surpreendeu, mas logo respondeu ao abraço sorrindo e apertando a outra garota. Conversavam há um mês e era como se conhecessem durante a vida toda, claro que ela ainda tinha que saber se tudo aquilo era verdade, mas até agora estava sendo.
- Você é muito mais bonita pessoalmente! – exclamou a morena ajudando-a com as malas. - Leila! – gritou com vontade provocando um leve susto em Simone, imediatamente uma garota mais alta que as duas, com o cabelo loiro preso em um rabo de cavalo e a cara toda verde, vestida apenas com um roupão aparece una sala.
- Você está maluca? Que gritaria é essa? – perguntou chegando ofegante a sala, até que viu Simone ao lado da morena e gritou. - AH!!!! – seu grito era agudo e alto, Simone gargalhou e abriu os braços. Leila prontamente correu e aceitou o gesto. - Eu estava louca para te abraçar.- disse ao se separar de Simone, analisando-a da cabeça aos pés.- Vamos sentar, me conta tudo! Meu sonho é viajar para a América Central, aqueles mulatos gostosos e aquela salsa. Gente do céu, que loucura! – disse se abanando com a mão.
Simone começou a responder as perguntas com a mesma emoção, sendo observando por quatro olhos que brilhavam de alegria e curiosidade. E ali ela soube que aquela havia sido a melhor decisão que tomou em sua vida. Ela só não imaginava o quanto.
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A última semana do verão passou rápida em Nova York e logo o vento do outono se fez presente. Aquilo significava também que era hora de voltar às aulas.
Durante a semana, Simone aproveitou para arrumar suas coisas em seu quarto, que era simples e contava com uma cama de casal, uma mesa que já estava cheia de livros e catálogos da Dior e Chanel, e algumas revistas; finalmente um armário. As paredes eram brancas e um pouco desgastadas. O teto tinha marcas da umidade e do tempo que aquele prédio levava em pé, mas isso não tirou o sono de Simone. Faltava muito para o frio apertar e enquanto isso ela ia economizar para um aquecedor portátil, porque isso também faltava.
Aproveitou o tempo para conhecer as companheiras de quarto e a cidade. Anielle a levou nas melhores lojas e centros de moda, chegando a passar pela entrada da Vogue onde Simone teve que reprimir as lágrimas, tamanha foi à emoção. Finalmente estava conseguindo lutar por seu sonho.
Leila se encarregou de levá-la a bares e cafeterias "bons, aconchegantes e baratos". Já que na época do frio estudar em casa era quase impossível. E a levou até a faculdade para conhecer as instalações e seu prédio. Simone ficou fascinada com a decoração. Até o estilo de alguns alunos e professores que passavam por ali era diferente, eles respiravam arte. Logo depois, aproveitou para comprar alguns materiais e comida para o resto do mês. Aprendeu que nos jornais os grandes supermercados publicavam ofertas e o ticket de desconto, fazendo-as economizar uma quantidade relativa.
Em outras palavras, ela estava praticamente adaptada. Com a internet em casa e o seu velho notebook ela mantinha contato com os pais a través de skype, que conheceram as meninas e estavam felizes. De vez em quando Simone comentava sobre estilos e cortes que estavam na moda ali com sua mãe, que estava surtando querendo viajar para viver tudo aquilo com a filha, e prometeu economizar agora para isso.
Assim passaram aqueles dias e a empolgação de Simone só aumentava. No domingo preparou a roupa do dia seguinte e os materiais na mochila. Mal conseguiu dormir pensando em como seria estar sentada em uma sala de aula da NYU, até que adormeceu.
Quando acordou, ela não estava cansada, apesar das poucas horas. Apenas sorriu e desligou o celular. Preparou-se com tempo em um dos dois banheiros da casa e foi pra cozinha, deixando a mochila no sofá. Encontrou apenas um bilhete das garotas - avisando que elas começavam antes, devido a que a distância até Julliard era maior - ao lado da cafeteira e com um postit nos micro-ondas que guardava um misto quente. Simone sorriu e mandou uma mensagem para as amigas agradecendo o gesto, e finalmente saiu de casa.
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Já na faculdade viu o movimento constante de pessoas, alguns pareciam se conhecer de longas datas e outros estavam na mesma situação que ela. Apesar da simplicidade de sua família, sua paixão pela moda a ensinou como se vestir bem mesmo com pouco dinheiro, e nesse requisito ela não deixava a desejar. Caminhava pelo corredor com o papel dos horários nas mãos, olhando para os números na parede até que achou sua sala. A primeira aula era História da Arte com a senhora Sônia. Uma mulher de uns 60 anos, cabelo branco e vestida formalmente com uma calça social, sapato alto e um chale grande que cobria seu corpo. Caminhava pela sala enquanto mostrava os slides que explicavam os movimentos artísticos e a influência dos mesmos na moda. Definitivamente uma das melhores aulas que teve, porque logo depois chegou à aula de Economia, onde teria que fazer um trabalho em grupo, mas devido a sua timidez acabou a aula e ela não tinha ainda com quem fazer, e aquilo a deixou pra baixo. Ela não conseguiu estabelecer amizade com ninguém e o trabalho era complicado. Consistia em criar uma empresa relacionada com o meio, porém mesmo sendo fictícia, a apresentação da empresa deveria ser como um plano real. O nome único, burocracia que o estado e o país pediam para o registro, quantidade de empregados e dinheiro necessário para começar. Inclusive, tinha que preparar uma carta para pedir um empréstimo ao banco.
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Soraya ( Simoraya )
FanfictionSimone Tebet sempre foi uma jovem responsável e dedicada à família que se esforçava diariamente para sobreviver. Filha de um professor e uma costureira, a jovem cresceu com o sonho de um dia ser uma grande estilista de moda. Porém, a realidade era m...