Tradições

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10/04/2025 - Bangkok, Tailândia | 9:00

Ponto de Vista - Yoko Apasra

Hospitais - frios, monótonos, mas sempre à beira da agitação, uma metáfora da minha própria vida; a sala de espera se tornou meu segundo lar.

—  Yoko Malisorn? - O médico, já familiar para mim, sua presença diária nos tornou próximos o suficiente para receber um sorriso de conforto, algo que raramente vejo nos outros médicos aqui.

—  Sim, sou eu. - Levanto-me da cadeira e sigo em direção ao quarto 503, onde minha avó está internada. Ao entrar, o ar gélido me abraça, ecoando o gelo que parece dominar o coração de quem está ali.

—  Você já está ciente do estado dela, mas por procedimento padrão, preciso perguntar se deseja desligar os aparelhos.

"Desejar?" Não desejo isso, não quero isso. Como chegamos a este ponto? Aproximo-me da cama dela, uma única lágrima escorrendo pelo meu rosto. Mesmo agora, eu ainda te amo, vovó.

Flashback - 14/04/23

Narrador

Após a cerimônia, Malisorn deixou o local sem rumo, caminhando exausta pelas ruas da cidade. Seus pés doíam, seu vestido estava sujo e manchado, refletindo o estado de sua alma traída por alguém em quem sempre confiara. Como poderia viver com alguém que não a amava da mesma forma? Ferida, magoada, desolada.

Um pouco mais adiante, Yoko foi conduzida à sua nova residência, que estranhamente lhe parecia familiar. Ao entrar, desabou em lágrimas no hall de entrada, ignorando os olhares dos empregados. Seus soluços eram quase inaudíveis, cabeça baixa, sentindo a pressão que a casa parecia emitir. Ficou ali até que uma funcionária acendeu as luzes, quebrando a escuridão ao redor.

— Senhora Malisorn? - chamou a funcionária, sem resposta.

— Senhora Malisorn? - insistiu, até que Apasra ergueu a cabeça para encará-la.

— Você não percebe que não sou a Faye? - respondeu firmemente. A ficha caiu: ela estava realmente casada. A funcionária então perguntou se gostaria de ir para seus aposentos, ajudando-a a se levantar.

— Não posso. Preciso ir para minha casa. Minha avó está me esperando - murmurou, encarando novamente a dura realidade. Com determinação, afastou-se da funcionária e saiu rapidamente pelas portas, sentindo o frio cortante do vestido. O motorista, que a trouxera até ali, ainda esperava.
— A senhora está bem? - perguntou, visivelmente surpreso.

— Leve-me até minha avó. - pediu ela, sem mais delongas. Ao chegar em frente à modesta casa da avó, um arrepio percorreu sua espinha. Ela sabia o que a esperava.

— Espere aqui. - ordenou ao motorista, que assentiu. Entrou silenciosamente, encontrando a chave sob o velho tapete como sempre. Ao acender as luzes, viu sua avó sentada no sofá, como se já soubesse que ela chegaria.

— Pensei que não viria, Yoko. Ou devo chamá-la de Senhora Malisorn? - disse Apasra, a garganta apertada.

— Vovó, posso explicar, prometo... - começou Yoko, desesperada, aproximando-se.

— Não se atreva a se aproximar de mim. Não reconheço você — palavras ásperas.

— Por favor, não faça isso. Eu te amo - implorou Yoko, aos pés da avó.

— Como ousa falar de amor? Você me traiu, assim como sua mãe, envergonhou nossa família - acusou Apasra, levantando-se e fazendo Yoko perder o equilíbrio.

— O que aconteceu? Está sem palavras, querida neta? - provocou, estendendo as mãos. Yoko sentiu uma pontada de esperança.

— Que belo vestido... tão belo que é uma pena estar em alguém tão imunda como você - começou a despojar Yoko de seu vestido. Ela gritava, implorava para parar.

— Você está louca? - chorou Yoko, vendo seu vestido ser rasgado.

— Estou fazendo um favor a você. - respondeu, sorrindo maliciosamente. Yoko não resistiu. Sentia que merecia aquilo por ter enganado sua avó. Seu coração doía, os pedaços do vestido no chão refletiam seu próprio estado destruído.

Fim do Flashback.

— Posso ter mais tempo para pensar? Algumas semanas, se possível. - Falo, e ele assente, retirando-se. Volto para a frente do hospital, onde meu motorista espera. Sim, motorista - não era algo que desejava, mas não tive escolha; minha esposa não permite escolhas, e isso tem sido um dos motivos de nossas recentes discussões.

— Beto, vamos para casa, por favor. Preciso resolver algumas coisas. - Roberto, agora meu motorista, antes porteiro, e eu desenvolvemos uma boa relação ao longo dos anos.

— Desculpe me intrometer, Yoko, mas Faye está em casa. - Ele diz, meio hesitante, olhando para o banco de trás onde ela está.

— Em casa? Não deveria estar em sua "importante reunião de negócios" hoje? Por que diabos ela... - Não consigo terminar minha própria frase, vendo Roberto sorrir de forma divertida. Opto por ficar calada, antecipando o estresse que virá.

Ao estacionarmos em frente à nossa casa, que depois do casamento se tornou nossa; na família Supapporn, as tradições são seguidas rigorosamente; entre elas, a prática de que, após o casamento do filho herdeiro, os pais cedem a casa para que o recém-casado a ocupe. Abro a porta com cuidado, esperando que ela esteja absorta em seu escritório. Erro meu.

— Chegando sorrateiramente em sua própria casa? - Faye diz, arrastando as palavras com mistério e ironia, algo que sempre detestei. — Onde você estava? - Ela completa após meu silêncio.

— Poupe-me, não comece a agir como uma esposa preocupada agora. - Respondo, dirigindo-me às escadas, ignorando sua presença. Não quero uma discussão agora.

— Lertprasert! Volte aqui agora e me conte onde esteve.

— Qual é o seu problema? Não finja que se importa; você deveria estar em sua "importante reunião de negócios", não é? - Digo com desdém, sentindo seu aperto em meu braço.

— Almoce comigo. - Isso com certeza não é um pedido.

— Apenas em seus sonhos, P'Faye. - Ela desiste de tentar me deter enquanto entro no meu quarto. Nossas discussões são frequentes, mas por que ela precisa ser tão obstinada?

Decido tomar um banho para aliviar a tensão que surge sempre que nos esbarramos. Não demora muito até que uma das funcionárias da casa bata à porta do quarto, anunciando que o almoço está sendo servido. Apesar da minha relutância, decido não desobedecê-la.

Os sons de talheres e pratos são os únicos a preencher o ambiente, enquanto nossos olhares se encontram esporadicamente.

— Posso saber por que minha querida esposa não está trabalhando?

— Não me zombe, Yoko, a reunião foi apenas adiada — ela responde secamente.

— Então você vai ficar em casa até o final do dia? — Eu sabia que a resposta seria breve e ríspida. Ela fecha os olhos e suspira, como se procurasse uma resposta dentro de si. Sem sucesso, apenas larga os talheres e se levanta, me deixando sozinho à mesa. Será que ela nunca me perdoará?

———

Eu sei eu sei, vocês sentiram muita falta, e eu peço perdão pela demora e pelo capítulo pequeno, estou apenas querendo inseri-los nessa nova etapa, logo teremos um novo capítulo com 3 mil palavras.

Queria agradecer também todo apoio e carinho que vocês tem dado a essa história.

X:@mandyanj

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⏰ Última atualização: Aug 04 ⏰

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