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O dinheiro para a conta de luz era o necessário.

O último mês tinha sido um delírio, bebidas tinham ferrado com o seu cartão de crédito e as contas não desapareciam com facilidade.

- Meia-noite. - Celeste sussurrou para si, tentando não ceder ao pavor que crescia nas rachaduras da sua alma.

Enquanto caminhava pelas ruas, ela temia que mais alguma desgraça caísse sobre os seus olhos, que outro assassinato ocorresse em um beco ou em uma rua deserta, quando somente a lua solitária era testemunha do medo que afligia Celeste a cada segundo.

Temia a solidão.

Temia o escuro.

Temia o retrato.

•••

Diferente da maioria dos clientes, esse preferiu buscá-la em uma avenida movimentada, provavelmente a levaria até um motel ou um terreno abandonado qualquer.

E depois a deixaria lá mesmo, largada à própria sorte, ela esperava que esse cliente não fosse criativo.

- Lúcio? - Celeste indagou com o sabor amargo das palavras escorrendo pelos lábios e sujando sua alma.

O cliente assentiu.

O carro era o mais luxuoso que Celeste já tinha entrado, a cor era um deslumbre mesmo na escuridão e até o conjunto das rodas continham beleza.

- Celeste? - um arrepio familiar se alastrou pelo corpo da garota ao ouvir aquela voz.

Celeste confirmou, entrando no carro.

Lúcio quis rir, ele sabia que aquele nome era tão falso quanto os rubis.

- Você é barata. - Lúcio comentou ao começar a dirigir.

Essa era uma pergunta que Celeste não sabia como responder.

- Acessível. - Celeste afirmou sem humor. - para que homens como você consigam ter algum conforto, querido.

Lúcio sorriu.

Celeste sorriu.

Ela não sabia quem ele desejava naquela noite, quem ele estava procurando ao olhar para uma prostituta tão "barata", mas certamente ele gostava de um pouco de ousadia.

Talvez essa fosse a parte mais perigosa de todas, descobrir quem ser para agradar a diversidade de pessoas que passavam por ela, que a atropelavam enquanto seu corpo tornava-se somente uma conjuntura de carne misturada aos seus ossos quebrados e sangue viscoso.

Que a destruíam até ela tranformar-se em algo tão atraente que somente os vermes a desejavam.

- Para onde vamos, minha querida?- Lúcio falou com a voz mergulhada em um sarcasmo depressivo.

- Não decido isso, querido.

- Lúcio.

- Lúcio?

- Esse é o meu nome, como você sabe.

- Quer ser chamado pelo nome?

- Você não?

Celeste calou-se, será que esse cliente era tão inexperiente que não sabia dos riscos? não sabia que a ausência do nome verdadeiro afastava aquela fantasia nefasta de qualquer realidade.

AdeusOnde histórias criam vida. Descubra agora