DOIS

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Desde meu último pedido, senti que Michael tem ignorado o assunto, no dia em questão ele não discordou, somente continuou com a impressão de que descartou algo que não queria escutar.
De certa forma, não entendo em que momento nos desconectamos ao ponto de nem pensar em formar uma família, além disso, nunca chegamos ao assunto em si, deixei que minhas esperanças de casamento feliz se mantivessem, que talvez uma criança viria de uma hora para outra, que iriamos criá-la com nossas condições favoráveis e nos uniríamos como amantes outra vez.

O problema é que meu marido ignorou meus desejos, me pediu para se prevenir desde o começo de nossa vida sexual, ele sempre foi inteligente e nunca passou dos limites. Mas agora, me sentindo mais velha, menos fértil e vendo que estamos desmoronando, por que não podemos tentar?

A verdade é que não há empecilhos no caminho, temos carreira estruturada, Michael não tem motivos para dissipar meus sentimentos como nuvens no verão.

— Você está bem? Parece cansada

Erick perguntou de forma singela, mesmo que suas intenções sejam dizer "Você não dormiu? Está horrível". E, de fato eu não dormi, passamos a noite inteira fazendo amor, mesmo cansados, Michael continuava me puxando contra seu corpo inúmeras vezes, com poucos minutos para respirar entre um prazer e outro.

Sua maior fala da noite foi me dizer que eu era sua mulher, e somente sua, que iria me tirar as dúvidas do seu desejo por mim, mesmo que isso levasse a noite toda.
Não precisou de muito, em alguns momentos tive fagulhas de pensamentos do tipo, realmente achei que talvez aquele homem que eu tanto ansiava, não sentisse mais atração por mim.

Mas não durou, e quando levantei tonta para ir trabalhar, tentando dormir nos cantos em que encostava ou tirando curtas sonecas no avião que se limitavam a quantas vezes um bebê aleatório chorava alto do outro lado da classe econômica, percebi que nossas vidas eram boas, mas faltava algo.

— Bem, problemas com insônia.

Dado que Erick estava lá apenas para cuidar de minha maquiagem e figurino, não questionou mais, apenas continuou a passar o gel em minha pálpebra por cima da sombra azul.

O trabalho atual consistia em um tipo de cyber propaganda para uma marca de roupas, onde minha imagem seria maior parte do catálogo principal. Apesar de saber que a marca queria crescer com meu rosto, me contentei em aceitar a proposta exacerbada de cachê por apenas alguns dias trabalhados. Além disso, precisaria realizar um desfile como fechamento, mostrando a nova peça principal da linha.
Sinceramente as roupas pareciam de mal gosto, tal qual desconfortáveis, a típica moda rica onde quanto maior o desconforto maior sua fortuna. Algumas não tinham nexo, muito tecido, pouca seda e bastante couro, mas outras eram de se engolir.

Após as posições para fotos que com certeza saíram da minha rotina de pilates - talvez por culpa de Michael - voltei para o hotel me desvencilhando de toda roupa e com dor em cada extensão dos meus músculos.

Ao ficar debaixo do chuveiro, deixei que a água escorresse a partir do pescoço, acariciando as curvas da minha pele enquanto demoradamente espalhava o vapor quente manchando os espelhos, onde outrora fora minha imagem encarando os pensamentos perdidos da mulher do outro lado.
Levei minhas mãos até o colo, acariciando minha barriga enquanto finas gotas rolavam entre minha mão e região uterina, Michael não me deu nem ao menos o benefício da dúvida, sei que não ejaculou em mim pois vi seu esforço em se desvencilhar de meu corpo toda vez que chegava perto do ato, era frio e vazio.

Assim como naquele dia, novas lágrimas saltaram de meus olhos, onde deixei que tomassem conta de meu rosto. Agora, agachada ao chão e pedindo respostas, deixo que meu corpo fale por mim. Quando o chuveiro não é mais tão quente e as lágrimas se misturam com a maquiagem pesada, sinto-me atônita e cansada, com a necessidade de reprimir esse desejo para que eu possa continuar tendo a vida que ansiei, as fortunas que me aguardavam.

Culpada CecíliaOnde histórias criam vida. Descubra agora