6 - você acha?

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— POV: Selena

Faz quase uma semana desde que tivemos a nossa exploração de sucesso. O carro com metralhadora definitivamente foi a melhor aquisição que tivemos aqui dentro. Eu arriscaria dizer que foi a melhor aquisição da história de Hells Angels, na verdade, mas acho que Cristal não ficaria muito feliz.

Os pensamentos sobre a Cecília continuam a todo vapor. Nós continuamos como antes, é claro, só vem sendo mais difícil lidar com essa batalha interna.

     No momento, inclusive, eu estou junto com Cecília, subindo as escadas para ir até topo do nossa base. Já passou da meia noite e as pessoas, em sua maioria, já estão em seus respectivos abrigos. Eu e Cecília não estávamos com sono e, para não incomodar as meninas que já estavam indo dormir, viemos para cá.

     O inverno está se aproximando, então sentir a brisa fria aqui em cima é uma sensação bem boa. Seria melhor se tivéssemos alguma bebidinha com a gente, mas acho que já é pedir demais.

     Ajudo Cecília a sair da escada e andamos até a beirada do terraço. Eu sento com as pernas sobre as dela e observo o ambiente parado.

     Nós começamos a conversar e simplesmente não paramos. É sempre assim quando eu estou com ela. A gente não percebe o tempo passar quando estamos desse jeito, falando sobre qualquer coisa, apenas aproveitando a companhia uma da outra. São sempre momentos bons, mas que ultimamente têm mexido um pouco comigo.

- Acho que na próxima vez que a gente subir aqui vamos ter que usar casaco — Eu falo, tentando mudar meu foco.

- Com certeza. Eu já to ficando com frio, imagina depois — Cecília fala, esfregando os braços.

- Eu também — Eu falo.

Desejo ter falado outra coisa ao sentir Cecília se se aproximar ainda mais e alisar meu braço. Seu olhar entrega que ela percebeu que eu me arrepiei com o toque.

- Assim a gente... se esquenta — Ela fala com certa incerteza.

Acredito que essa tenha sido sua intenção inicial, mas um clima acabou se formando. Certamente não é a primeira vez que isso acontece, mas eu tenho tido... pensamentos... que, por mais que eu tente evitar, tomam conta da minha cabeça.

     Quando Cecília se vira para mim, sorrindo com os olhos, é difícil não pensar em como seria beijar ela. Me arrependo um pouco de ter sentado nessa posição quando percebo que estamos tão próximas que eu consigo escutar sua respiração pesada enquanto seu olhar oscila entre minha boca e meus olhos.

Também sem conseguir manter meus olhos focados em um ponto só, tomo coragem de abrir a boca.

- Cecília... já faz muito tempo que nós tivemos essa conversa mas... — Eu hesito.

Preciso ser um pouco cuidadosa com as palavras. Não quero que ela acabe entendendo da forma errada.

- Que conversa? — Cecília pergunta.

- Sobre existir um... é... clima... entre nós — Eu falo e vejo seus olhos subirem para o meus, as pupilas dilatadas.

- Tá... onde você quer- é- chegar?

Deixo meus instintos agirem naturalmente, deslizando minhas unhas no seu braço. Ela fica arrepiada assim como eu fiquei minutos atrás.

- Você... você não acha que ainda existe? — Eu pergunto, torcendo para não me arrepender.

- Eu... você acha?

- Eu que perguntei, Cecília.

Sinto sua mão apertar logo embaixo do meu joelho, não me deixando esquecer o quão coladas estamos.

- Eu- é- sim? — Ela gagueja — Eu... eu acho que existe, sim. E... e você?

- Eu também acho.

De alguma forma, nossos rostos estão ainda mais próximos. Por mais que eu goste de olhar Cecília nos olhos, não consigo parar de fitar sua boca, e sei que ela está fazendo o mesmo.

Umedeço os lábios e vejo ela engolir seco antes de imitar a ação. Seu toque está mais firme na minha perna e eu já não penso mais racionalmente.

Movo meu rosto devagar, esperando para ver se ela vai se afastar, mas não é isso que acontece. Procuro seus olhos uma última vez e os encontro fechados. Consigo fechar os meus antes de de sentir a boca de Cecília na minha.

Beijo é uma questão de encaixe. Claro que existem pessoas que beijam bem, e eu sou uma delas, mas um beijo só é realmente bom se ele encaixar bem. E esse aqui... caralho.

É como se já tivéssemos feito isso antes. Como se eu não estivesse nervosa por estar beijando minha melhor amiga - depois de ter imaginado isso mais vezes do que gostaria de admitir. Meu coração está acelerado, mas isso não me impede de aproveitar o que está acontecendo.

Sinto falta do beijo no mesmo momento em que ele acaba. Demoro para abrir meus olhos, mas fico feliz ao ver a felicidade transparente nos de Cecília.

Ela sorri e olha para a minha boca novamente. Quando penso em retomar o beijo, porém, escuto a porta do abrigo se abrir. Me inclino levemente para ver quem é e sorrio involuntariamente quando Cecília segura meu braço para que eu não caia.

Vejo Xulia entrando antes da porta se fechar. Se ela está entrando, significa que ela estava voltando de algum lugar. Provavelmente estava com a namorada. Mas... se ela em algum momento olhou para cima no caminho para cá... é provável que ela tenha visto nós duas aqui.

Não que eu quisesse que isso fosse um segredo, é que eu não posso me preocupar com o que os outros vão pensar se eu nem sei o que eu estou pensando.

- Quem era? — Escuto Cecília perguntar e volto à realidade.

- A Xulia. Acho que ela tava com aquela Gabriella — Eu falo, me virando para ela — Acho melhor a gente tentar dormir né? Tem expedição amanhã.

É verdade. Amanhã vamos para uma "expedição extensa", sem voltar para o abrigo para dormir ou qualquer coisa assim. Vamos sair sem hora ou dia para voltar.

- É, tem razão — Ela hesita antes de continuar — Posso te beijar mais uma vez antes?

Deixo um sorriso escapar e, em vez de responder, apenas me aproximo e inicio o beijo eu mesma. É mais rápido dessa vez, mas deixa a minha noite ainda melhor.

Dentro da base, procuro por sinais de que Xulia sabe de algo, mas só escuto ela dando boa noite para Hanna e Mafe, em seguida indo para a sua cama.

- Quer dormir na minha hoje, princesa? — Cecília pergunta e eu concordo. Como não concordaria com esse apelido soando tão bem na sua voz?

E, bem... a minha cama fica no segundo andar e não estou com muita vontade de subir mais escadas.

Deitada ao lado de Cecília, a vontade de beijar permanece. Nunca foi embora, para ser sincera. Porém, eu não vou arriscar fazer isso aqui dentro. Além disso, duas vezes é suficiente para uma noite. Não quero parecer desesperada ou... enfim.

Sinto meus olhos pesarem e me entrego, deixando o sono tomar conta de mim. Hoje eu estou indo dormir feliz, definitivamente.

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OBSERVAÇÕES

E veio aí, né?

em meio ao caos - cecilenaOnde histórias criam vida. Descubra agora