Eu quero mesmo é viver pra esperar, esperar, devorar você.

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De longe, essa foi a corrida de maior impacto da minha vida desde que estourei a bolsa para ter Esther no hospital que ficava a 20km da minha casa. Acompanhava sob a guarda do retrovisor o carro de Stênio me seguindo noite afora, e só conseguia pensar em poucas coisas, mas focava na maior delas: o desejo.


O desejo de mudar as coisas tinha me levado até aquele restaurante, e o mesmo desejo tinha me conduzido para as mãos gentis e a boca ardilosa de Stênio, que me fazia praguejar insultos e pedidos na mesma proporção.


A boca que fantasiei por 4 anos, se voltando para mim em uma noite inédita, bonita. Ninguém poderia dizer que o destino não tinha sido generoso comigo, porque nessa oportunidade única, dentre todos os homens que poderiam estar em Petrópolis naquele fim de semana... eis ele, sem mais nem menos.


Em meio ao complexo de chalés, subimos uma das ruas que davam para o chalé que eu estava hospedada: Uma casinha clássica, varanda com namoradeira e mesa, janela lateral que dava para o quarto de dormir, toda trabalhada na madeira. Uma luz quente que adormecia as ideias ruins e despertava as ideias melhores. Coisas assim, prontas para os dois.


Eu desci do carro respirando fundo, com a chave em mãos. Fazia frio como toda noite de julho, mas no momento que ele me desceu do carro alto, com a boca vermelha e a cara de receio e vontade... eu sabia que o fim da noite seria exatamente bom.


— É aqui que você se esconde?


— Um pouco longe daqui. – disse, erguendo o queixo, fingindo que ele não vinha me abalando. – Mas pra você.... pode ser aqui.


— Eita que mulher difícil. — disse, me pegando pela cintura de uma vez, me fazendo soltar uma gargalhada abafada.


Lambi os lábios de tesão e roubei um beijo dele, na porta da casa. Se estivesse em Niterói, não recomendaria estar dando tanta sopa na porta de casa, mas aqui somos desconhecidos, e bem...  a vizinhança estava distante. Travei a mão livre na sua nuca, puxando os fios acinzentados para mim, e em um movimento de espelho, ele fez o mesmo.


Stênio subiu uma das mãos que estavam na minha cintura até a nuca, percorrendo o decote cavado do meu vestido e me arrepiando, obviamente. Eu arfei por um descuido na sua boca, e ele decidiu reagir, puxando meus fios com um pouco mais de força, me encarando de frente, investido em me fazer delirar.


— Falta de educação manter a visita na porta de casa, hein? — ele disse, me deixando um beijo no pescoço logo em seguida.


Por encrenca, eu dei um empurrão nele e subi as escadas do chalé, olhando pra trás com um sorriso tão malicioso quanto as suas pretensões. Ele subia as escadas morrendo, lento demais, parado no tempo demais... Que mal da demora era aquele, hein?


A chave abriu a casa, eu entrei, sinalizei que o mesmo entrasse também. Aquele cheiro de homem perigoso entrou junto com a corrente de ar fria, junto com ele, e junto com seu desejo. O desejo ainda cabia ali?


Stenio aguardou parado o meu ato de trancar a porta e ligar as luzes, observando o ambiente, analítico. Eu parei, prensada contra a porta de entrada, mãos para trás do corpo, pescoço inclinado para frente, lábios mordidos, sem saber muito o que fazer ou como lidar com a presença dele ali.


Não deixamos de ser velhos desconhecidos. Embora agora... eu saiba mais um pouco sobre ele.


O que sei sobre Stênio: ele tem horror a vinho branco desde uma viagem que fez a Bruxelas. Inclusive ele adora viajar, e disse que tem uma viagem marcada para Patagônia daqui a uns meses, no recesso forense. Inclusive ele disse que se encontrou na carreira de Promotor, e conseguiu montar um gabinete fantástico nos últimos anos. Sei que ele cheira muito bem. Sei também que ele vem cogitando adotar um cachorro. Sei que a sua boca faz absurdos na minha. Ele também comentou algo sobre titularidade de comarca, que eu não dei a mínima importância, pois já estava na quarta taça de vinho.


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