O peso da vitória

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A luz, finalmente livre das garras de Malachar, começou a se espalhar pelo mundo como um bálsamo para uma ferida aberta. O sol, que há tanto tempo fora eclipsado, apareceu timidamente no horizonte, lançando seus primeiros raios sobre uma terra devastada. Contudo, a luz que voltou não trouxe a alegria esperada; ao invés disso, revelou a extensão do desespero e da destruição que as sombras haviam deixado para trás.

As cidades, antes pulsantes de vida e atividade, agora eram ruínas silenciosas. Os campos, outrora férteis e verdes, estavam estéreis e cobertos de cinzas. As águas dos oceanos, rios e lagos, que refletiam o brilho dourado de Seraphina, estavam turvas e contaminadas. A natureza, que fora um dia harmoniosa e vibrante, agora lamentava em uma melodia de tristeza e perda.

Seraphina, livre das correntes de escuridão, vagava pelas terras com um coração pesado. Sua canção de redenção havia trazido a luz de volta, mas não podia apagar as cicatrizes profundas no mundo e em seu próprio espírito. Ela encontrou Eamon, caído onde havia enfrentado Malachar, e ajoelhou-se ao seu lado, lágrimas cristalinas escorrendo por seu rosto. "Você trouxe a luz de volta," sussurrou ela, sua voz quebrada pela dor, "mas a que custo?"

Ela ergueu seu corpo sem vida e o carregou até a beira do mar, onde as ondas murmuravam uma sinfonia de luto. Ali, ela o deitou suavemente na areia, suas mãos pálidas acariciando seus cabelos uma última vez. "Que as águas te levem para um lugar de paz, onde a escuridão nunca mais poderá te alcançar," murmurou, enquanto seu canto melancólico ecoava pelo litoral, uma oferta de descanso eterno para aqueles que se sacrificaram pela luz.

Os sobreviventes, aqueles poucos que tinham conseguido resistir ao domínio das sombras, começaram a emergir de seus esconderijos. Seus rostos estavam marcados pelo sofrimento e pela perda, seus olhos refletindo a dor de um mundo que havia mudado para sempre. Eles se reuniram ao redor de Seraphina, buscando conforto e guia, mas encontraram apenas uma bruxa quebrada, cuja luz interior estava quase extinta.

Naquele momento, Seraphina percebeu que sua tarefa estava longe de ser concluída. A luz havia retornado, mas o mundo precisava de cura, e ela era a única que podia iniciar esse processo. Respirando fundo, ela ergueu-se e começou a caminhar, seus passos determinados, mas pesados. Ela sabia que precisaria de cada fragmento de sua força e de sua magia para restaurar a vida à Terra.

A jornada de Seraphina a levou a muitos lugares devastados. Ela visitou os campos queimados, onde cada planta morta parecia um grito congelado de agonia. Com seus poderes, começou a restaurar a vida, uma folha de cada vez, mas o processo era lento e exaustivo. Em cada passo, sentia o peso das almas que haviam sido perdidas, e a melancolia de um mundo que talvez nunca voltasse a ser o que era antes.

Nos oceanos, Seraphina mergulhou nas profundezas, tentando purificar as águas contaminadas. As criaturas marinhas, que outrora tinham nadado com alegria, agora eram sombras de si mesmas, magras e doentes. Ela cantou para elas, um lamento que prometia cura e renovação, mas sabia que levaria gerações para que os mares voltassem à sua antiga glória.

Enquanto Seraphina lutava para restaurar o mundo, os sobreviventes também enfrentavam batalhas próprias. Famílias tentavam se reunir, mas muitos haviam sido separados para sempre. Crianças choravam por pais que nunca voltariam, e os idosos olhavam para o horizonte com olhos vazios, sem saber se ainda tinham forças para continuar. A luz havia retornado, mas a escuridão deixara marcas indeléveis em suas almas.

Eamon, cujo sacrifício fora fundamental para a derrota de Malachar, tornou-se um símbolo de esperança e dor. Os sobreviventes construíram um memorial em sua honra, um farol que brilhava na costa, onde Seraphina havia deixado seu corpo para descansar. Todos os dias, ao pôr do sol, eles se reuniam ao redor do farol, lembrando os que haviam caído e buscando forças para continuar.

Mas mesmo com todos os esforços de Seraphina e dos sobreviventes, a sombra de Malachar ainda pairava sobre eles. O mundo havia sido quebrado de maneiras que nem mesmo a magia mais poderosa poderia consertar completamente. E, em seus momentos mais sombrios, Seraphina sentia a presença de Malachar, sussurrando em seus sonhos, lembrando-a de que a escuridão nunca estava longe.

A luz havia retornado ao mundo, mas era uma luz frágil, constantemente ameaçada pela memória das trevas. E enquanto Seraphina continuava sua jornada de cura, sabia que a verdadeira batalha estava apenas começando. A Terra poderia se recuperar, mas jamais seria a mesma. E, no fundo de seu coração, ela sentia uma tristeza profunda, uma melancolia que a acompanharia até o fim de seus dias.

O canto da última maré Onde histórias criam vida. Descubra agora