Capítulo 21: Coração Partido

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Sábado, 26 de fevereiro de 2022

Querido diário,

Hoje era para ser o dia mais feliz da minha vida. Acordei cedo, com o coração batendo mais forte, uma mistura de ansiedade e felicidade. Eu estava prestes a ver o Miguel de novo, e só de pensar nisso, meu rosto já abria um sorriso bobo. Passei horas me arrumando, escolhendo cada detalhe do meu look. Peguei a bicicleta e saí pedalando pelas ruas do Rio, o vento batendo no meu rosto e a sensação de liberdade me preenchendo por completo. A vida estava perfeita.

Cheguei na casa do Miguel com um sorriso de orelha a orelha. Nem bati na porta, só gritei: "Miguel! Cheguei!" Esperei um pouco, e nada. Chamei de novo, mas a resposta que veio de dentro era fria. Ele saiu do quarto, com aquela cara de quem não tá nem aí. Senti um frio na espinha, mas fingi que não percebi.

“Oi, Liz...” ele disse, desviando o olhar.

“Oi? Só isso, Miguel? É assim que você me recebe?” tentei brincar, mas por dentro algo já estava quebrando.

“Olha, a gente precisa conversar,” ele continuou, com um tom que me deixou desconfortável. Meu sorriso desapareceu na hora. Ele só podia estar de sacanagem, né?

“O que foi? Aconteceu alguma coisa?” perguntei, sentindo um nó se formar na garganta.

Miguel respirou fundo, parecendo estar em uma batalha interna. “Sobre ontem… Eu não sei se foi uma boa ideia.”

Aquilo bateu como uma tonelada de tijolos. “O quê?” Minha voz saiu mais alta do que eu esperava, e a mão que segurava o guidão da bike começou a tremer.

Ele hesitou, como se estivesse tentando encontrar as palavras certas. “Eu só… acho que não estamos na mesma vibe.”

Meu corpo inteiro congelou. Eu não conseguia acreditar no que estava ouvindo. “Não estamos na mesma vibe? Então o que foi aquilo ontem, Miguel? Não significou nada pra você?” A raiva misturada com tristeza começou a subir, e minha voz ficou trêmula.

Ele passou a mão pelos cabelos, claramente desconfortável. “Eu… Eu não sei, Liz. Talvez eu tenha me empolgado demais. Não quero que você se machuque.”

“Se machuque?” Minha voz subiu de tom, o peito já ardendo de frustração. “E agora você tá preocupado comigo? Depois de tudo o que aconteceu, você vem com esse papinho furado?”

Miguel tentou se aproximar, mas eu recuei, os olhos já cheios de lágrimas. “Não é isso, eu só…”

“Só o quê, Miguel? Você acha que pode brincar com meus sentimentos assim? Me usar e depois jogar fora? Você é um idiota!” gritei, sentindo a dor transbordar.

“Liz, calma…” Ele levantou as mãos, como se estivesse tentando apaziguar a situação, mas aquilo só me deixou ainda mais irritada.

“Calma? Como é que você me pede calma depois de tudo isso? Eu confiei em você, Miguel! Eu te amei de verdade…” As palavras saíam como lâminas afiadas, cada uma cortando mais fundo.

Não aguentando mais, eu o empurrei com toda a força que tinha, e ele deu um passo para trás, surpreso. A raiva explodiu dentro de mim, e antes que pudesse me controlar, minha mão se levantou e o estalo do tapa ecoou pelo corredor. As lágrimas já desciam livremente pelo meu rosto, mas eu nem me importava mais. “Você é um grande babaca! Eu nunca devia ter confiado em você!”

Miguel ficou parado, a mão no rosto onde o tapa havia acertado. Ele não disse nada, e aquilo só me enfureceu ainda mais. Sem esperar resposta, virei as costas e saí correndo. Peguei a bicicleta e pedalei com toda a força, tentando deixar a dor para trás, mas ela me perseguia, mais intensa a cada pedalada.

Quando finalmente cheguei em casa, o mundo parecia ter desmoronado. Minha visão estava embaçada pelas lágrimas, e minhas pernas tremiam tanto que mal conseguiam me sustentar. Abri a porta com pressa, corri para o meu quarto e me joguei no chão, sem forças para mais nada. O choro veio como uma avalanche, forte e incontrolável. Bati a cabeça na parede, tentando expulsar a dor, mas ela só aumentava. Gritei no travesseiro, tentando abafar o som, mas parecia que o grito nunca seria suficiente para expressar o que eu estava sentindo.

Meus gritos ecoavam pelo quarto, mas ninguém veio. Nem queria que viessem. Estava tão perdida na dor que nada mais importava. Me arrastei até o guarda-roupa, peguei o pijama mais confortável que tinha, e me vesti, as lágrimas escorrendo sem parar. Maggie, Marie e Medusa entraram no quarto, como se soubessem que eu precisava delas. Maggie foi a primeira a se aproximar, se esfregando na minha perna. Peguei ela no colo e chorei ainda mais, o som do meu choro ecoando pelo quarto vazio.

As três gatinhas se aninharam ao meu redor, oferecendo o único consolo que eu podia aceitar naquele momento. Me encolhi na cama, abraçando o travesseiro com tanta força que meus dedos doíam. Fiquei ali, deitada, o rosto molhado de lágrimas e o coração em pedaços, enquanto mastigava um pedaço de chocolate que nem conseguia sentir o gosto. Liguei a TV, só para tentar distrair a mente, mas nada conseguia me tirar daquele abismo.

Escolhi um filme qualquer, algo dramático, porque nada mais fazia sentido. As cenas passavam na tela, mas eu mal prestava atenção. Estava perdida na minha própria dor, tentando entender como algo que parecia tão perfeito podia se transformar em um pesadelo tão rápido.

A madrugada passou lentamente, cada minuto um tormento. Continuei chorando até não ter mais forças, até os olhos arderem e o corpo estar completamente exausto. Me arrastei para o chão, sem forças para me levantar, o rosto afundado no travesseiro enquanto os soluços faziam meu corpo inteiro tremer. Cada vez que fechava os olhos, via o rosto dele, a voz dele ecoando na minha mente, me destruindo ainda mais.

Eventualmente, o cansaço venceu. Fechei os olhos, o corpo entregue à exaustão. Mas mesmo no sono, a dor não foi embora. Ela ficou ali, presa dentro de mim, esperando para me atormentar de novo quando eu acordasse.

Boa noite, diário.

Liz

Entre Faíscas e Suspiros | Enemies To LoversOnde histórias criam vida. Descubra agora