6 ❀ O feixe de luz venceu o Arvoredo

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As aulas terminaram, o restante nem sequer foi importante, só quero voltar pra casa, a chuva já passou, o céu segue nublado, mas agora as nuvens não choram

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As aulas terminaram, o restante nem sequer foi importante, só quero voltar pra casa, a chuva já passou, o céu segue nublado, mas agora as nuvens não choram.

Meu entusiasmo retornou, assim como o sol deve retornar em breve, agora tenho um único professor que não irá me criticar, que gosta de mim, que não me despreza ou me acha incompetente, muito pelo contrário. Minha conquista é silenciosa, ninguém vai saber, não tenho ninguém pra contar sobre isso, ao contrário das conquistas de Aiko que sempre são públicas, mas ainda me sinto feliz, eu não preciso que outras pessoas saibam do meu sucesso para ser feliz no final das contas.

Ando pelas ruas, um sorriso satisfeito se estende pelo meu rosto, estou em paz comigo mesma, esquecendo dos meus problemas por algum tempo, a humilhação de hoje não parece me incomodar, os fatos de a comida ter sido ovo com arroz e feijão de novo, de a escola se recusar a nos dar suco pra beber porque de acordo com a nutricionista nós não somos nutricionistas pra saber o que é melhor pro nosso corpo, de Kiara ter me exposto e todas as outras desventuras foram automaticamente esquecidos, me mantendo hiperfocada em apenas algumas nuances: Kazuki me achou sábia, o projeto de artes retornou e o senhor Takumi me reconheceu.

Agora eu posso estudar pro Liceu tranquilamente, posso ficar umas boas semanas sem desenhar ou estudar arte, afinal, uma única aula do Takumi deve equivaler a uma semana minha estudando sozinha, não preciso me preocupar em apressar as coisas, mesmo que eu saiba claramente que, no final, eu vou ser teimosa e provavelmente vou desenhar hoje, simplesmente porque o entusiasmo de não precisar desenhar me faz querer desenhar.

Continuo andando pelas ruas, sem lembrar das minhas responsabilidades, fruto do fato de terem removido uma de minhas responsabilidades, estou contente e satisfeita com minha realidade, acabo pensando em um dos catalisadores da minha felicidade: o Kazuki; e logo me lembro do que ele me pediu pra fazer, isso eu não posso esquecer, de jeito nenhum eu posso esquecer de fazer o que o Kazuki me pediu pra fazer.

Preciso enviar o conteúdo para Maíra; preciso enviar não só o que o Kazuki me passou, como o que estudamos hoje, mesmo que ela já não me responda há muito tempo.

Na verdade, eu não faço a menor ideia do que aconteceu com ela, ela não responde as mensagens e também não tem comparecido nas aulas desde o começo desse mês, os professores disseram que ela está com um atestado de 2 meses, dizem que o CID do atestado é o S82, significando que ela fraturou a perna, já estamos no dia 20 de Março e ela não dá notícia alguma sobre seu estado há 20 dias.

Atravesso a rua saltitando e rodopiando, como se estivesse ouvindo alguma música, mesmo que não tenha música alguma tocando além da melodia da minha própria felicidade, uma melodia que só eu posso ouvir, quase tropeço, mas ainda assim, a música continua forte em meu coração.

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Agora em casa, removo meus sapatos, mas ainda não tiro o uniforme, minha mãe me enviou mensagem e disse que não vai poder vir hoje, ela vai passar o dia na casa da patroa, disse que a folga dela vai ser amanhã, na quinta, e também na sexta, mas que logo vai ter que voltar pra casa da patroa quando for sábado bem cedo, então ela não vai poder ficar no final de semana, vai passar o final de semana com a chefia.

Eu me sinto mal. A senhora Amelia vive tirando a minha mãe de mim, não posso passar tempo com ela nem nos finais de semana, ela faz a minha mãe trabalhar tanto, deve ser muito difícil limpar a casa daquela velha britânica, se é que dá pra chamar de casa, tá mais pra um palácio gigante lá no Jardim Paulista. Minha mãe trabalha tanto, e no final nem sequer sobra dinheiro pra se manter no mês, enquanto a Amelia não move um músculo e conseguiria se manter por mais 100 anos assim sem nem precisar de emprego. Uma coisa é certa: se todas as árvores da floresta tivessem o mesmo tamanho, seria muito melhor!

A Amelia é uma burguesa desgraçada de flores murchas, muito gananciosa, não gosto dela, ela poderia ajudar a minha mãe, mas não, pra ela os lírios dela são muito superiores às flores de pau brasil da minha mãe.

É irônico pensar que Amelia é um nome que significa trabalhadora ou agricultora, sendo que aquela burguesa safada nunca deve ter pego uma pá na vida, deve ter gosto as lavouras só em fins de supervisão, aparentemente mantenho esse costume estranho de procurar o significado dos nomes das pessoas constantemente, mas o que posso fazer? Meu nome é literalmente “flor”, e eu me sinto tão insignificante quanto meu nome, minha mãe deve ter acertado quando escolheu esse nome, sabia que eu não seria nada, então tudo que me resta é tentar descobrir o significado do nome dos outros, que muitas vezes são muito mais significativos que o meu.

Agarro uma vassoura e começo a varrer a casa, hoje eu preciso cozinhar, nossa casa é praticamente uma relíquia, ainda tem as estruturas japonesas tradicionais: como um telhado estilo samurai. É uma casa bem velha mesmo, ou pelo menos era quando chegamos aqui, minha mãe reconstruiu tudo sozinha, com as próprias mãos, deixou tudo como novo, colocou pisos e removeu o chão que, antes de nossa chegada, era feito de madeira. Bem... Não é bem nossa casa, moramos de aluguel.

Mesmo que seja uma casa praticamente oriental, a decoração entrega que seus moradores não são nada orientais.

Raízes da Inveja (Demo oficial)Onde histórias criam vida. Descubra agora