Inevitável conta a história de Faye Malisorn e Yoko Apasra, duas pessoas com personalidades completamente diferentes mas que precisavam se encontrar. Faye é uma médica com um passado pesado mas com com uma personalidade leve, enquanto Yoko Apasra, u...
Após a linda garota aceitar meu convite para tomar milkshake, caminhamos lado a lado até o local. Era um pequeno quiosque perto da biblioteca, onde haviam algumas mesinhas em frente. Fizemos os nossos pedidos e nesse processo, descobri que seu sabor favorito é flocos. Nos sentamos em uma das mesas, ela organizou os papéis em um pequeno monte e se concentrou apenas na bebida. O calor do Sol se tornou ameno, o vento encostando em nossos rostos e o gelo do que estávamos consumindo também ajudavam nisso.
Finalmente pude reparar melhor na garota em minha frente. Ela usava uma regata branca e uma calça jeans clara, junto com seus tênis também brancos. Seus cabelos castanhos estavam completamente soltos e o vento vez o outra os colocava em seu rosto, logo ela os retirava com delicadeza e voltava a beber o milkshake. O silêncio entre nós se instalou, até o momento em que ela se pronunciou:
- Me desculpa pela irritação, acabei sendo grossa com você. - Disse envergonhada, olhando fixamente para o canudo.
- Tudo bem... Dia difícil? - Um sorriso simples surgiu em meu rosto e eu nem soube direito o porquê.
- Está mais para ano difícil. - Disse com desânimo e me olhou rindo sem humor. Eu a questionei com o olhar. - Trabalho.
- Com o que você trabalha? - Ela começou a brincar com o canudo sem parar de observá-lo.
- Sou escritora, escrevo livros infantis. - Nossos olhares se cruzaram por alguns segundos, mas logo o dela voltou para o canudo.
- Uau, que incrível! Sou apaixonada por crianças. - Ela sorriu e dessa vez pareceu mais sincero.
- Acabo de perceber que não perguntei o seu nome.
- Me chamo Faye Malisorn.
- P'Faye. - Foi inevitável não sorrir com a forma fofa que ela pronunciou meu nome. - Me chamo Yoko Apasra.
- É um prazer, Yo. - Ela pareceu ter gostado do apelido e talvez tenha ficado um pouco desconcertada.
- E... Com o que você trabalha?
- Sou médica plantonista.
- Nossa. - Yo realmente pareceu impressionada.
- Atendo muitas crianças, por isso as amo tanto. Vez ou outra leio livrinhos infantis para eles. - Sorri me lembrando e Yoko me olhou com admiração.
- Também amo crianças. - De repente, a vi reflexiva e seu sorriso se tornou melancólico aos meus olhos. - Crianças são extraordinárias, seres puros e que demonstram o que sentem de forma sincera. - Suspirou. - Sinto falta disso. Brincar, fantasiar, ver o mundo de outra forma.
- Mas isso não faz parte do seu trabalho? - Questionei e Yo assentiu.
- Deveria... - Riu sem humor.
- Por isso o "ano difícil"? - Perguntei realmente interessada.
- Exatamente. - A conversa cessou a partir daí, não me atreveria a perguntar mais se ela mesmo não continuasse o assunto.
O nosso momento juntas durou uma hora, vieram muitos outros tópicos banais e divertidos. Naquele dia, vi o sorriso de Yoko muitas vezes e me perguntei porque nunca o vi antes. Sempre a olhava de longe e estava exausta, aparentemente estressada. Ela me contou que trabalhava numa editora, a mesma que produziu os livros que ela escreveu. Não gostava do trabalho que fazia, achava entediante, mas foi a forma que conseguiu de ganhar dinheiro desde que "sua criatividade a deixou", nas palavras dela.
Diferente de mim, que sempre amei o meu trabalho e tinha muitas histórias interessantes para contar. Yoko pareceu muito envolvida com todas elas, especialmente as que incluíam famílias. Ela me fez muitas perguntas e foi fascinante encontrar uma pessoa que me entendia sem eu ao menos dizer em voz alta o que estava pensando.
Ela até se esqueceu do porquê eu a havia convidado para tomar milkshake:
- Podemos começar a organizá-los? - Sorri apontando para o pequeno monte de papéis e Yo riu.
- Caramba, esqueci completamente disso. - Ela me entregou metade deles e fomos ordenando.
- Yo, alguns não tem número. - Ela voltou o olhar para o papel que eu estava mostrando.
- Pode separar. - Começou outra pilha. - Esses são apenas rascunhos fracassados.
Comentou e então eu não disse nada, apenas continuei a ordenar os papéis até que não restasse nenhum em nossas mãos:
- Acabamos. - Eu disse sorrindo satisfeita e Yo me retribuiu.
A garota guardou os papéis em sua pequena mochila de costas preta e então olhou para o seu celular:
- Nossa, já está tarde! Ainda preciso passar na editora para entregar isso. - Voltou-se para mim. - Obrigada por me ajudar com os papéis e pelo milkshake, P'Faye. - Se levantou pondo sua mochila nas costas e por reflexo eu fiz o mesmo. - Até mais. - Sorriu e virou-se para ir, sem nem esperar minha resposta.
- Espera... - Eu disse por um impulso. Mais um momento incomum de coragem que eu nunca tive na vida amorosa, apenas com ela. - Posso ter seu número? Eu... Gostei muito de conversar com você hoje e... Devo admitir que te notei há um tempo. - Disse e Yo pareceu surpresa. - Penso que talvez... A gente possa se conhecer melhor? - Fiz tom de pergunta, deixando claro a minha insegurança.
- Olha, P'Faye... Eu também gostei muito de conversar com você hoje, de verdade, foi um momento de descontração e eu nem lembro qual foi a última vez que senti isso. Mas... Estou numa fase difícil e não tenho tempo para dar atenção a outras coisas ou pessoas a não ser meu trabalho. - Suspirei assentindo, levemente decepcionada. Ela pegou em minha mão, nosso primeiro toque. - Por favor, não me entenda mal.
- Não, tudo bem, eu entendo perfeitamente. Espero que você fique bem logo e que essa fase passe. - Sorrimos um para a outra com sinceridade.
- Obrigada... - Um silêncio se instalou enquanto nossos olhares permaneciam conectados. Ali eu senti algo diferente, senti como se meu corpo fosse atraído pelo dela... Quase como se ela não quisesse ir. - Eu... Preciso ir agora. - Soltou minha mão.
- Claro. Até mais, Yo.
- Até mais, P'Faye.
Yoko foi embora e eu voltei ao meu caminho inicial, em direção a biblioteca. Nesse percurso, acabei rindo de mim mesma. Um ato de coragem nunca visto e, mesmo assim, um ato fracassado. Mas sabe? Talvez as coisas precisassem ser assim.
📖
Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Segundo capítulo e não sei vocês, mas já consigo sentir coisas kkkk comentem o que acharam por favor, e não se esqueçam de votar.