Capítulo 1: Correntes Invisíveis

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EVELYN

O som da chuva batendo contra as janelas do meu quarto ecoava pelo silêncio, criando uma trilha sonora melancólica para o que parecia ser o dia mais longo da minha vida. A tempestade lá fora era o reflexo perfeito da tormenta que eu sentia dentro de mim. Cada batida de gota contra o vidro me lembrava do que estava por vir: o casamento.

Eu me virei para o espelho à minha frente, vendo uma estranha no reflexo. Quem era aquela garota com o vestido dourado de seda e os cachos arrumados meticulosamente? Certamente, não era eu. A coroa pequena em minha cabeça parecia pesar mais a cada minuto. Não era o peso do ouro que me oprimia, mas o que ela representava. O fardo de ser uma princesa, de pertencer ao reino antes de pertencer a mim mesma.

O som da porta se abrindo suavemente me tirou dos meus pensamentos, e a figura familiar de Lady Amara entrou no quarto. Seus olhos encontraram os meus através do espelho, e mesmo antes de ela falar, eu já sabia o que viria a seguir. Ela estava com a expressão que usava sempre que carregava notícias das quais eu não queria ouvir.

— Princesa, está na hora — sua voz era gentil, mas havia algo no tom dela que parecia pesar tanto quanto o que eu sentia. Ela sabia o que isso significava para mim.

Eu não disse nada no início. Apenas continuei a olhar para o reflexo daquela versão de mim que parecia estar sendo levada, aos poucos, para um abismo do qual eu jamais escaparia. O vestido brilhava, cintilando à luz das velas que queimavam tranquilamente no quarto. Não havia nada de tranquilo em mim. Senti a necessidade de fazer algo, qualquer coisa. Sair correndo pela porta, rasgar o vestido, ou gritar. Mas tudo o que consegui fazer foi murmurar:

— Ele já chegou?

Minha voz soou fraca, quase um sussurro. Parte de mim esperava uma resposta diferente, talvez que o príncipe tivesse desaparecido, ou que um milagre tivesse acontecido, e esse casamento não fosse mais necessário. Mas milagres não acontecem para garotas como eu.

Amara suspirou, um som leve, quase imperceptível, mas cheio de compreensão.

— Sim, o príncipe Edric está no salão com o rei. Eles aguardam sua presença para o anúncio oficial.

Claro que ele já estava aqui. Edric sempre foi pontual, como qualquer pessoa que estivesse ansiosa para reclamar algo que acreditava ser seu por direito. E, para ele, eu não passava de uma posse. Eu não o conhecia bem, mas conhecia sua reputação. Cruel. Calculista. Um homem que nunca amaria nada além de poder e controle. E eu, sua futura esposa, seria apenas mais um símbolo de sua conquista.

Olhei para Amara pelo espelho. Ela estava com uma expressão de pena, mas também de aceitação. Ela entendia que eu estava sendo sacrificada em nome da paz, como tantas princesas antes de mim. Mas, ao contrário delas, eu não tinha a intenção de aceitar o meu destino sem lutar.

— Eu não posso fazer isso, Amara — soltei, finalmente virando meu olhar para ela diretamente. Minhas palavras eram afiadas, mas desesperadas ao mesmo tempo.

— Eu sei que não é o que deseja, minha senhora — ela disse, caminhando até mim. Segurou minhas mãos, tentando me oferecer algum conforto. — Mas o rei acredita que essa é a melhor aliança para o reino. Ravaryn é poderoso, e seu pai está determinado a manter a paz.

A paz. Sempre essa maldita palavra. Desde pequena, essa palavra era usada para me controlar, para justificar cada sacrifício que me pediam. A paz do reino. A paz entre as nações. Mas e a minha paz? Quem se importava com isso? Certamente não meu pai. Para ele, eu era apenas uma ponte para assegurar sua aliança com Ravaryn.

Levantei-me da cadeira, meus movimentos mais bruscos do que eu pretendia. Caminhei até a janela e fiquei ali, olhando para os jardins. As flores que enfeitavam o gramado estavam encharcadas pela chuva. Pareciam tão frágeis quanto eu me sentia. Tudo parecia tão grandioso, tão imutável. E, ainda assim, eu me sentia completamente fora de lugar, como se aquele mundo todo fosse uma prisão dourada.

— Não há outra forma, Amara? — perguntei, com os olhos fixos na tempestade lá fora. A chuva parecia oferecer mais consolo do que qualquer palavra que Amara pudesse me dizer. — Não há outro caminho?

O silêncio de Amara durou mais tempo do que eu esperava. Quando finalmente falou, seu tom era cuidadoso, como se estivesse pisando em um terreno perigoso.

— Existem sempre outras formas, minha senhora — ela disse calmamente. — Mas elas não vêm sem sacrifícios.

Virei-me para ela, absorvendo aquelas palavras. Eu sabia o que ela queria dizer, e meu coração acelerou com a ideia. Fugir. Deixar tudo para trás. Correr para longe desse destino que me foi imposto. Mas seria mesmo possível? Eu sempre ouvi histórias de nobres que desapareceram, que escolheram uma vida diferente, longe das correntes da corte. Mas eram apenas histórias. Não era?

— Se eu me casar com ele — comecei, sentindo as palavras saírem mais fortes do que antes —, estarei condenada a uma vida que não escolhi. Não quero ser uma peça no jogo de poder de meu pai, ou de Edric. Eu quero... viver, Amara. Quero fazer minhas próprias escolhas. E, com ele, não serei nada além de uma prisioneira.

— O que está sugerindo, princesa? — Amara perguntou, seus olhos fixos nos meus. Havia preocupação em sua voz, mas também uma leve fagulha de compreensão.

Eu respirei fundo, lutando para controlar a adrenalina que subia. Estava sugerindo o impossível, eu sabia disso. Mas, ao mesmo tempo, aquele "impossível" parecia ser minha única saída.

— Estou sugerindo que talvez... seja hora de eu desaparecer.

Minha voz mal passava de um sussurro, mas o impacto foi sentido no ar pesado do quarto. Amara me olhava fixamente, sem falar. O choque era palpável, mas ela não me julgava. Ela sabia que eu estava falando sério, que eu estava disposta a pagar qualquer preço para fugir da vida que me esperava. E, por um breve momento, eu vi a compreensão em seus olhos.

Antes que ela pudesse responder, no entanto, houve uma batida firme na porta.

— Princesa, o rei a aguarda — disse a voz grave do Capitão Rowan do lado de fora.

Meu coração parou por um instante. A realidade se fechava ao meu redor novamente, como correntes invisíveis me prendendo ao destino que eu tanto queria evitar. Mas algo dentro de mim já havia mudado. Eu já não era a mesma princesa submissa de antes. Havia uma nova chama queimando em meu peito. A ideia de fugir, de ser livre, já tinha sido plantada. E eu sabia que, cedo ou tarde, teria que agir.

Com um último olhar para Amara, caminhei até a porta. Senti o peso de cada passo, como se estivesse indo em direção a minha própria prisão. Mas agora, eu tinha um segredo. Eu sabia que, no fundo, esse casamento não aconteceria. Eu não seria prisioneira de ninguém. Não de Edric, não de meu pai, e certamente não do reino.

Meu destino estava lá fora, além das muralhas do castelo. Longe da corte, longe das intrigas políticas. E eu o encontraria. Custasse o que custasse.




















CONTINUA...






• desculpem o atraso pra postar, ocorreu alguns problemas e só consegui postar agora, essa semana vou postar mais um capítulo, espero que gostem🥰

Amor nas Ondas do DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora