Yara
Onde esse gato se enfiou? Eu havia desistido de acompanhar Martin durante seus passeios noturnos, então apenas deixava o animal sair e esperava até que me acordasse no meio da noite, arranhando a porta para entrar e se aconchegar nos cobertores comigo. Mas, nas últimas noites, ele estava inquieto demais e não voltava para o quarto, o que me obrigava a sair desbravando a mansão para procurá-lo. E, levando em consideração minhas experiências anteriores perambulando pela mansão nesse horário, eu só queria voltar o mais rápido possível para o quarto.Martin já não se aventurava mais no jardim, estava muito frio, então ele limitava suas atividades noturnas dentro da mansão. Normalmente, eu o encontrava arranhando a porta do quarto de Alfred, atormentando o pobre mordomo em busca de comida, mas desta vez ele não estava lá. Procurei também na biblioteca, já que o carregava para lá durante o dia, mas nada do gato.
Ao longe, escutei notas de piano ecoando pelos corredores e repousando, tristes e castas, em minha mente. Quem estaria tocando piano a essa hora? Na pequena lista de habitantes da mansão, era pouco provável que Alfred ou os seguranças tivessem permissão para tocar o instrumento. O único que sobrava era Erik.
A ideia de encontrá-lo ali, sozinho, me deixou inquieta. Nos últimos dias, Erik estava me evitando deliberadamente, como se o episódio daquela noite, quando eu tentei confortá-lo durante um de seus pesadelos, tivesse colocado uma barreira ainda maior entre nós. Mesmo assim, não pude evitar a curiosidade. Minhas pernas pareciam se mover sozinhas em direção à melodia, como se algo me atraísse, algo que eu não conseguia compreender completamente.
Segui o som até a ala oeste da mansão, uma parte reservada e, de certo modo, misteriosa. Não ousava me aventurar por lá justamente por ser a área onde os aposentos de Erik ficam. Mas quanto mais me aproximava, mais claras as notas do piano se tornavam. Elas carregavam uma tristeza tão palpável que meu coração apertou no peito. Quando cheguei à sala, vi pela porta entreaberta a figura de Erik, sentado ao piano, com os dedos correndo suavemente pelas teclas.
Apenas a luz da lua iluminava o cômodo, projetando sombras suaves ao redor. Havia um certo ar melancólico no ambiente. Fotografias antigas decoravam as estantes, e uma janela aberta dava para um jardim privado. O ar frio da noite se misturava à música, criando uma atmosfera quase surreal.
Também notei seu cabelo, sempre muito bem penteado, desarrumado, a camisa social azul marinho entreaberta e a garrafa de vodka quase vazia em cima do piano.
Meu olhar pousou em Martin, que estava ali, acomodado ao lado do instrumento, como se fosse o guardião silencioso daquela cena. O gato, assim como eu, parecia hipnotizado pela música.
Erik não me viu. Sua expressão era fechada, os olhos fixos nas teclas, como se o peso do mundo estivesse sobre seus ombros. A máscara que escondia suas cicatrizes estava ainda mais evidente à luz da lua, mas, vi algo além do perigo e da autoridade que ele sempre exalava. Vi dor. Uma dor profunda e antiga, que as notas melancólicas do piano pareciam traduzir perfeitamente. Novamente a dor do passado de Erik estava ali, emaranhando-se em volta dele.
Fiquei ali, na porta, sem saber se deveria interromper aquele momento ou simplesmente ir embora. O silêncio da sala era tão denso quanto a música que Erik tocava. Eu estava prestes a dar meia-volta e deixar que ele tivesse seu momento quando, de repente, suas mãos pararam sobre as teclas, e ele levantou a cabeça.
— Yara — sua voz era fria e afiada como sempre, cortou o silêncio como uma lâmina. Seus olhos se fixaram nos meus, e naquele instante, percebi que ele sabia que eu estava ali o tempo todo.
Por um momento, me senti paralisada. Aquele tom, aquele olhar gélido me perfurando, me fez questionar por que eu estava ali, o que esperava encontrar ao bisbilhotar sua privacidade. Mas recuei um passo, ajeitando o corpo, tentando não deixar que ele percebesse o impacto que sua presença sempre tinha sobre mim.
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Mafioso Mascarado
RomanceYara Rogulski, filha do mafioso mais poderoso do distrito central russo, nunca se deu bem no círculo social em que nasceu. Passava seus dias tentando viver como uma pessoa comum, até ser convocada para firmar um acordo de paz entre famílias. Para qu...