No principio não havia nada [...]

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Alguns meses depois...

Helena despertou antes do amanhecer, sentindo a luz suave da manhã filtrando-se através das cortinas. O relógio marcava um horário inusitado, mas a quietude da casa a convidava a levantar-se. Com um gesto delicado, acariciou a cabeça de Kai, seu gato preto de pelagem lustrosa, que dormia tranquilamente sobre a mesa da cozinha, como se tivesse sido moldado pelo próprio sono. O felino abriu um olho, lançou um olhar preguiçoso e se ajeitou, como se estivesse a par de seus costumes matutinos.
Após o toque carinhoso, Helena dirigiu-se ao seu quarto para se preparar para o trabalho. Escolheu roupas leves, que dançavam suavemente com os seus movimentos. Os tons claros refletiam a luminosidade do dia, enquanto os cortes retos conferiam-lhe uma elegância discreta.
Ela sabia que, para enfrentar o que viria, precisava encontrar um equilíbrio delicado. Despir-se de sua individualidade era um ritual que adotara para preservar sua essência intocada, uma forma de se distanciar dos casos perturbadores que analisava. A separação entre o mundo profissional e o pessoal era, para Helena, uma linha tênue, e ela a atravessava com cuidado. 

O caminho até o escritório parecia surpreendentemente curto naquele dia. Cada passo ressoava em meio ao murmúrio da cidade que despertava. Ela se distraiu inúmeras vezes, observando as pessoas ao seu redor, havia algo fascinante na passagem dos rostos, nas expressões apressadas e nas conversas sussurradas.
Ao se aproximar das salas privativas, a familiaridade do espaço a acalmou.

Ao chegar à porta que a separava do escritório onde Will a aguardava, bateu suavemente, um gesto simples, mas carregado de expectativa.

-Entre.

A voz de Will ecoou do outro lado da porta, clara e confiante, preenchendo o espaço com um tom familiar. Helena, segurando a maçaneta com firmeza, empurrou a porta e adentrou o escritório. No entanto, ao cruzar o limiar, parou abruptamente, os olhos fixos no homem que estava sentado na poltrona.

Ele era alto, sua presença imponente quase dominava o ambiente. Embora aparentasse alguns anos a mais que Will, sua aparência mantinha um charme natural que parecia emanar dele, uma combinação de sofisticação e segurança que atraía a atenção da jovem moça.
O brilho de seus olhos e o leve sorriso que curvava seus lábios transmitiam uma aura de magnetismo.

Ele é elegante até os ossos. - Helena pensou correndo os olhos pelas duas figuras na sala.

O contraste entre os dois homens era notável. Will, com suas roupas em tons escuros e despojadas, exibia um estilo casual e acessível, marcado por cortes informais que transmitiam conforto. Em contrapartida, o visitante estava vestido com um terno de três peças perfeitamente ajustado, cujas linhas estruturadas acentuavam sua figura elegante. A gravata vermelho bordô que completava o visual era um toque ousado, adicionando um ponto de cor que se destacava contra a sobriedade do traje.

Helena observou a interação entre os dois, notando como a dinâmica se desdobrava no ambiente. Havia algo intrigante na forma como o homem de terno se acomodava, como se a cadeira fosse feita sob medida para ele, enquanto Will parecia mais solto, quase relaxado, em sua postura.

-Desculpem-me, eu estou interrompendo?

A voz de Helena emanava um cuidado ponderado, como se cada palavra fosse escolhida com precisão. Ela avaliava o visitante com atenção, evitando se perder na profundidade dos olhos castanhos que a observavam com uma mistura de interesse e astúcia. Havia algo intrigante naquele olhar e  ela se esforçava para manter a compostura.

Foi Will quem se adiantou, quebrando a tensão silenciosa que pairava no ar. Com três passos firmes, ele reduziu a distância entre os dois, sua presença ao mesmo tempo reconfortante e decidida.

Del'acour - HannigramOnde histórias criam vida. Descubra agora