06

76 14 9
                                    

Emilly Ferreira

Minha inocência é um traço ainda mais tóxico da minha personalidade do que ser boazinha, porque, quando escutei as batidas na minha porta quinze minutos depois de finalizar a chamada com o babaquinha, deveria ter desconfiado que não era minha bela barca de sessenta peças com uma coquinha gelada.

Ainda assim, levantei da cama, abaixei o short do pijama, e caminhei alegre para dar de cara com o babaca parado no meu corredor. Sem minha comida.

— Você falou que mandaria entregar minha comida! — exalto frustrada.

— Porque se eu tivesse dito que viria aqui, você não teria me falado que estava em casa ou passado seu endereço.

— Virou especialista em mentiras agora, é? — provoco, cruzando os braços e ele revira os olhos.

— E se eu fosse mandar entregar algo nesse seu… apartamento, seria espaço. Isso é uma caixa de sapatos.

— Não é tão pequeno — defendo meu lar. Posso achá-lo terrível, mas ele não tem direito algum de chegar aqui e falar mal da minha casa.

— Realmente, é ainda menor do que se visto de fora — comenta, espiando por cima da minha cabeça e pigarreio, não querendo que ele fique fuçando minhas coisas com os olhos.

— Não está com a minha comida, que tipo de agradecimento fajuto é esse? Na verdade, que diabos está fazendo na minha casa?

— Precisa ter uma coragem admirável para chamar isso aqui de casa — ele murmura. — Precisava conversar com você.

— Sobre ?

— Preciso que continue sendo a minha noiva falsa.

— É o que ? — indago com horror e sem pensar, belisco meu próprio antebraço com força, querendo acordar desse pesadelo o mais rápido possível, mas só me rende um grito de dor.

— Por que você fez isso? É maluca? — ele retruca, me olhando chocado e sem reação.

— Eu não sou maluca coisa nenhuma, é só que podia jurar que acabei de ouvir você falando que preciso continuar sendo a sua noiva falsa. Isso só pode ser invenção da minha cabeça. — rebato.

— Você é sempre dramática assim?

— Uai, você que sai por aí inventando noivas falsas e eu que sou dramática? Era só o que me faltava — exaspero minha frustração.

Caminho em direção à geladeira atrás dele, empurrando-o para o lado para pegar uma garrafa de água gelada. Ele me segue com o olhar, como se esperasse que eu desse outra resposta que não fosse essa e percebo que foi realmente um pedido verdadeiro.

— Você tá falando sério — constato em voz alta e ele me dá um aceno. — Isso só dá certo nos livros, só para te lembrar.

— Não sou exatamente o tipo de cara que passa meu tempo lendo romances, Emilly — diz, cruzando os braços e acompanhando cada passo
nervoso que dou. — E é uma situação… desesperada, ou não estaria pedindo isso.

— Por que falou para aquele esquisito que eu era a sua noiva? — questiono,
arqueando a sobrancelha.

— Desde que ele começou a se relacionar com a minha ex, Jorge tem essa história de que não superei o relacionamento deles. Não foi intencional te envolver — fala e inclino a cabeça para o lado. Jura, anjo?

— Eu estava no lugar errado, na hora errada.

— Algo assim.

— Por que não conta a verdade? — pergunto, porque parece algo óbvio a se fazer.

— Ele já espalhou para Deus e o mundo.

— Por que eu? Não pode achar outra pobre coitada? — indago.

— Porque ele já te viu e dificilmente se esquecerá do seu rosto a ponto de eu poder trocar de noiva falsa. Acredite em mim, eu já pensei em outra saída. Não é uma situação interessante para mim estar com você.

— Sabe mesmo como convencer uma mulher de fazer o que você deseja, não é mesmo? — resmungo.

— Se eu quisesse muito te convencer, Emilly, você já estaria falando sim, por favor — murmura, fitando meus olhos e sinto meu corpo tenso, precisando engolir em seco para conseguir encará-lo de volta sem falhar. — Quer saber, isso foi uma péssima ideia, eu estou mesmo começando a ficar insano se acho que pode ser uma boa ideia pedir um favor como esse para uma estranha maluca e dramática como você.

— Na verdade, isso foi extremamente ofensivo, sabia? Eu posso estar muito fodida, mas não sou uma… prostituta ou algo do tipo. Se está procurando por isso, deve saber que tem lugares específicos para procurar profissionais assim. Ora, era só o que me faltava.

— Já acabou? — indaga com descaso, me fazendo revirar os olhos. — Cem mil por 6 meses de noivado falso.

Meu Jesusinho, nem mesmo sei o que são cem mil reais em dinheiro. Preciso de um pequeno esforço para conseguir colocar até mesmo a quantia certa de zeros nesse número na minha mente.

— Está falando sério? — indago, observando cada pedacinho do seu
rosto em busca da piada, todavia, ele acena sério. — Cinquenta antes, cinquenta depois?

— Pode ser negociado — responde, dando de ombros. Cinquenta mil não é nada para esse homem, aparentemente. Deveria ter pedido mais.

— Preciso pensar — Ele me encara com sarcasmo e uma sobrancelha erguida.

— Preciso de uma resposta até amanhã à tard, se não mandar mensagem ou aparecer na porta do CT até às três da tarde, entenderei qual é a sua resposta — avisa e seguro minha respiração em nervosismo, conseguindo somente dar alguns acenos.

— CT ?

— Sim.

— Você é jogador ?

— Está de sacanagem com a minha cara né?

— É claro que estou. — mentira, eu não fazia ideia de que ele era jogador, eu nem acompanho jogos direito.

— Espero vê-la amanhã, Emilly.

— Obrigada pelo não jantar. —murmuro e posso jurar que, antes de sair, ele carrega um mínimo sorriso de canto.

Assim que ouço a porta bater, só consigo pensar que por essa reviravolta, nem mesmo o autor da novela das nove poderia esperar. Uma proposta de um noivado falso valendo cem mil reais. E eu, estou bastante tentada a aceitar.
___________________________________________

Nuestras mentirasOnde histórias criam vida. Descubra agora