Prólogo 🔥⚔️⛰️

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O céu negro banhava-se nas estrelas fulminantes, dançarinas esotéricas da meia noite

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O céu negro banhava-se nas estrelas fulminantes, dançarinas esotéricas da meia noite. Silenciosas contemplavam sobre o ar a fumaça branca que subia das fogueiras, absorviam intrépidas os cânticos e as preces dos adoradores do fogo que dançavam ao redor das chamas tremeluzentes em um quintal apertado e esquecido nas vielas úmidas de Arden.

O velho quintal servia como templo para os crentes do deus Pyro, o criador das chamas e da vida. Os derradeiros que se atreviam a adorar tal deus esgueiravam-se pelas sombras da noite até o casebre que salvaguardava aquele pedaço modesto de terra que para a maioria se tratava de heresia. Mas para aquelas pessoas se tratava de esperança e unidade.

A fogueira no chão está alta e ilumina os rostos dos irmãos reunidos em prece. Tocos podres e pedras úmidas circundam a pira flamejante enquanto três rapazes sem camisa dançam ao redor utilizando máscaras. Cada máscara com uma expressão: fúria, prazer e sabedoria. Em pé atrás da fogueira a sacerdotisa deixava seus cabelos ruivos esvoaçarem-se  pelo vento noturno enquanto entoava a Pyro um cântico à capela.

Os olhos verdes de Eldric percorreram por todos lados procurando Aranys, afinal era seu batismo e desejava que a irmã estivesse presente. A voz aguda preenchia o lugar aproximando as pessoas da divindade. Eldric usava apenas um calção de trapos. Descalço aguardava diante da sacerdotisa enquanto os mestres pintavam seus braços, peito e rosto com tinta vermelha. Símbolos preenchem cada espaço de pele vazio: espirais, runas antigas e pontilhados.

A música aproximava-se de seu fim e Eldric ainda buscava ansioso por sua irmãzinha. ‘Talvez ela tenha medo da música gótica.’ ele tentava consolar-se. Prestes a desistir ao ouvir o fim da última estrofe, ele a avista correndo em suas pernas curtas esforçando-se por arrastar um saco pesado em meio a multidão. “Ecky, eu trouxe seu presente. Seu presente de batismo…” Então uma explosão de cores rompe do fogo inundando o local sagrado com diversas cores - azul, púrpura, laranja, amarelo, verde.

As marcas na pele de Eldric começam a queimar como brasa e ele rende-se caindo de joelhos por terra. Aranys congela estupefata, agarrando firmemente o saco com o presente enquanto observa o transe do irmão.

“Eldric Craven” começou a voz da sacerdotisa. “Sua oferta pacífica foi aceita” os olhos da mulher não são mais somente verdes, são chamas ardentes que espirram para fora das órbitas, mas não queimam seu rosto. “O Deus da vida purifica seu coração.” Os símbolos ardiam intensamente, gradativamente, como se ele próprio estivesse pegando fogo. A dor crescia quase o dilacerando e quando caiu no chão percebeu que não estava em casa.

A terra era vermelha, arenosa e brilhante. Não havia nada naquele lugar além desta terra e da sarça. Uma sarça gigantesca que no lugar de folhas tinha chamas, fogo vivo. Conforme percebe o lugar a sua volta a dor diminui e as imagens retorcidas tornam-se vivas; e ele vê embaixo da árvore sua mãe - a sacerdotisa. A reconheceu primeiramente pelo vestido negro, depois pelos cabelos ruivos e por fim teve certeza que era ela ao ouvir sua voz doce.

“Que lugar é esse, mamãe?” Ele lutava para ficar de pé. “Que vês tu no céu?” ela indagou.

“Vejo nuvens verdes como esmeraldas.”

“Sabes o significado delas?” Ela virou-se e encarou o menino. Seus olhos ainda ardiam em fogo.

“Diga-me, pois não sei.” Eldric tentou caminhar e percebeu que a terra era densa e que engolia suas pernas cada vez que se esforçava para chegar até a árvore. “O céu é o limite para seus cofres e feitos. A cor que vês é o quão longe serão tuas terras e teus tesouros, pois tua benevolência achou graça aos olhos do grande pai.” Ela analisou o esforço de Eldric ao tentar levantar-se e caminhar.

“E a terra que vês, o que me diz que ela é?” O rapaz parou, olhou para baixo de si e agarrou na mão um punhado dos dejetos vermelhos. Se o céu era os limites de seus feitos, a terra seria… “O preço pago pelas dádivas prometidas.”

“Que preço é esse Eldric?” Sua mãe caminhava pesadamente até ele sem que a absorção tivesse poder sobre ela. Acariciou seu rosto com o afã. A pele morna da mãe trazia-lhe conforto para ouvir a resposta. “O preço de uma vida no campo de guerra.” Ela beijou-lhe a testa e pôs ao redor de seu pescoço um colar. O colar era feito de bronze, entrelaçado como serpentinas formavam uma corrente forte; na base do colar havia um broche quadrado, semelhante há uma arapuca de pássaros, dentro dele havia uma chama que tremulava bem acima de seu peito. “Este colar é o símbolo da aliança que fez com Pyro. E que aliança é esta?” Um vento rarefeito começa a mover a terra solta na superfície, avivando as chamas da sarça, trazendo consigo a sensação de queimadura que Eldric sentiu.

“Prometi proteger com sua fúria os mais fracos. Garantir os prazeres da vida aos merecedores de sua graça. E aplicar com sabedoria os efeitos de sua palavra.” Os símbolos brilharam novamente, com mais força, o calor percorreu seu corpo sendo canalizado e armazenado na caixinha do colar, dando força ao fogo que já queimava ali.

A terra abriu sua boca voraz, engolindo Eldric até o pescoço. O ar arfando sob seu peito lhe trouxe desespero enquanto o que sobrara da luz verde escurecia-se lentamente. A quentura mordaz aumentava enquanto o som do vento ia ficando cada vez mais longe. Agora imerso na escuridão deparou-se inconsciente no chão do quintal de sua casa.

Gritos e aplausos eclodiram da multidão alegre ao seu redor. Aranys agora estava ao seu lado, de joelhos, balançando seus ombros e insistindo que seus olhos abrissem. “Ecky, Ecky, acorde.” Ele apoiou-se sobre as mãos e ficou sentado, ainda desnorteado coçou os olhos para desembaçar as vistas. “Seu presente.” Aranys estendeu o saco velho e foi puxada para um abraço, ao desvencilhar a irmã de seus braços percebeu que as marcas haviam sumido. Os olhos arregalados procuraram a mãe, e encontraram uma fogueira apagada, superada pelas cinzas; cinzas densas e escuras. Sua mãe encarava o que sobrou do fogo, seus olhos impassíveis não moviam-se para lado algum. Eldric levantou cambaleando, ainda sentia as pernas pesadas e aproximou-se da mãe.

“O que as cinzas falam?” Ela levantou seu rosto, assustada, talvez com dúvida do que viu, e gaguejando fez a prédica: “Além do espelho salgado, um príncipe nascerá. Do fruto de três ovos a justiça se estabelecerá.”

Eldric, O BravoOnde histórias criam vida. Descubra agora