BANE OF EXISTENCE - ASOIAF

ONE

Ser o primeiro cavaleiro da Guarda Real a ser destituído de sua posição era uma mancha em seu nome que jamais poderia ser limpa. Assim como a mancha de ter matado o rei que jurara defender.

Sempre tivera muita ciência disso, apesar de não concordar que merecia ouvir o que diziam dele. Sim, tinha sido destituído, mas porque era do interesse de Lorde Tywin Lannister que o filho reafirmasse a posição de herdeiro de Casterly Rock e se casasse. E sim, tinha matado o rei que jurou defender, mas o tinha feito porque ele pretendia queimar a cidade e matar o seu pai.

De qualquer forma, aceitou. Aceitou que seria chamado de Regicida para sempre. Aceitou que o tratariam com despeito e armou-se contra isso. Era um leão de Casterly Rock, independentemente de qualquer coisa e um leão não se incomodava com pouco.

Mas enquanto observava sua noiva caminhar de braços dados com Robert Baratheon pelo Septo de Baelor, sentia-se perdidamente incomodado.

Era um espetáculo, de fato. Myriah, com seus cabelos negros longos e ondulados e a pele cor de bronze, brilhava com o mesmo vigor que o sol de Dorne. Mas seus olhos que já foram radiantes como o sol ao meio-dia estavam agora soterrados sob uma sombra invisível que todos faziam questão de ignorar.

Fingiam que ela ainda era a princesa que uma vez iluminara a Fortaleza Vermelha com seu charme e risadas. O sol de Dorne, chamavam-na. Jaime lembrava-se de como Myriah era um furacão de vida, sempre cercada de admiradores, sempre encontrando formas de transformar até o mais sombrio dos dias em momentos de luz. O castanho claro de seus olhos sempre transbordando vida. Naquele tempo, ele rira de sua habilidade quase mágica de dobrar qualquer um à sua vontade. Até mesmo ele, não fora imune ao carisma da princesa.

No entanto, aquele brilho morrera no dia em que Elia Martell, sua irmã, foi brutalmente assassinada.

A vida de Myriah Martell tinha desabado no mesmo dia que a vida do Regicida.

A Fortaleza Vermelha estava mergulhada em caos enquanto a cidade era saqueada. Tinha saído da sala do trono após a chegada de Ned Stark e ido a procura dos outros alquimistas para terminar o que ele tinha começado, mas seus pés o levaram até a Fortaleza de Maegor e de repente se viu em frente aos aposentos da princesa Elia Martell e um grito fez com que ele irrompesse no quarto. Encontrou o corpo violado e morto de Elia, assim como os corpos sem vidas de seus filhos, Aegon e Rhaenys. E então vira Myriah, no chão e imóvel com um homem em cima dela prestes a rasgar suas vestes. Gritou ordens para que ele a soltasse, mas não esperou que o obedecesse, instantes depois, a cabeça dele caiu à esquerda de Myriah. Foi quando ele viu o horror nos olhos da Martell. Paralisada, ele se viu a tomando nos braços e a levando até o seu quarto, onde a trancou.

Perguntava-se se ela tinha se esquecido disso. "Eu a salvei, lembra-se? Como pode me culpar, sendo que fui eu quem impediu que tivesse o mesmo destino de sua irmã", foi o que teve vontade de gritar para ela no dia anterior quando foi a visitar e tudo que recebeu foi silêncio.

Jaime podia suportar os olhares de desdém dos lordes, mas o olhar vazio de Myriah Martell era como uma lâmina.

Quando finalmente se postou diante dele, sequer sorriu. "Você nunca mais foi a mesma", ele pensou, olhando para os olhos dela que agora pareciam abismos vazios.

Myriah estendeu a mão, como era de costume nos casamentos, e Jaime hesitou por um momento. "Ela merece isso?", uma voz sussurrava em sua mente. "Merece ser casada com o filho do homem que foi responsável pela violenta morte de sua irmã e sobrinhos?"

Ele apertou sua mão, sentindo a distância que os separava, mesmo que seus dedos estivessem entrelaçados.

Myriah não olhava para ele, seus olhos fixos no altar à frente. Para todos os presentes, ela ainda era o sol de Dorne, mas Jaime sabia a verdade. Por dentro, ela estava consumida pela escuridão, e ele era uma parte daquela sombra.

Não esperara grande amor daquele casamento, afinal, só amava uma mulher e era a sua irmã. Mas tinha sentido certo alívio quando o pai o comunicara que ele se casaria com Myriah. Ele sentia afeto pela princesa de Dorne e eles costumavam a ter uma boa relação. Em nenhum momento esperou receber aquele poço de indiferença e amargura.

E aquilo o irritou profundamente.

Bebeu mais vinho do que era indicado na festa de casamento. E quando o Robert Baratheon sugeriu que era hora da cerimônia de núpcias, esbravejou que enfiaria sua espada nas estranhas do primeiro homem que ousasse tocar em Myriah assim como fez com o Rei Aerys II. No quarto que foi preparado para eles, porém, nada foi feito. Bastou ver as lágrimas caírem pelos olhos de Myriah para que ele a ordenasse que ela dormisse e quando a madrugada avançou adentro, ele foi atrás de Cersei.

Foi feito espada juramentada da irmã para justificar sua estadia em Porto Real, enquanto mandava Myriah para Rochedo Casterly, sem suportar a presença dela perto de si por muito tempo.

O mesmo homem que podia ignorar o escárnio de todo um reino, agora desejava desesperadamente a aceitação de uma mulher que jamais o perdoaria.