Capítulo 2 - Diaba de Saia

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FELIPE

"Crawling back to you / Ever thought of calling when you've had a few? / 'Cause I always do / Maybe I'm too busy being yours to fall for somebody new." 
- Arctic Monkeys, "Do I Wanna Know?"

Eu tava de frente pro computador, mergulhado nas linhas de código, como sempre. Hacking nunca foi só uma habilidade pra mim; era quase um instinto. Uma saída rápida pra grana, mas também um jeito de sentir a adrenalina correndo nas veias. A luz azul da tela iluminava o quarto escuro enquanto eu invadia uma conta importante. Dessa vez, era algo grande. Eu precisava daquela grana, mas ainda não tinha contado pra Cleo. Não dava pra prever como ela ia reagir, mesmo sabendo que ela sempre segurava minha barra.

Cleo sabia da minha vida dupla. Na verdade, ela era a única que sabia. Qualquer outra pessoa, se descobrisse, sairia correndo ou tentaria me fazer parar. Mas não a Cleo. Ela nunca me julgou, nunca veio com aquele papo de "isso é errado". Pelo contrário, ela sempre me protegia, cuidava pra ninguém se meter no meu caminho. E talvez tenha sido por isso que, lá atrás, eu me apaixonei por ela. Não porque ela era perfeita ou qualquer coisa assim, mas porque ela era ela — brava, boca suja, com aquele maldito rostinho de anjo que ela odiava tanto.

— Tá hackeando alguém aí, nerd? — A voz dela cortou meus pensamentos como uma faca afiada. Ela entrou no quarto sem bater, como de costume, e se jogou na minha cama com aquela despreocupação que era a marca registrada dela.

— Tô, e você sabe que não é qualquer um. Isso aqui é pesado. — Respondi sem tirar os olhos da tela, os dedos ainda correndo pelo teclado.

Ela deu de ombros, fingindo desinteresse, mas eu sabia que ela se importava. Cleo era assim, não tratava a parada como crime, apenas como mais uma das coisas que eu fazia. Sempre tirando sarro, mas nunca me condenando.

— E aí, tá precisando de grana, né? — Ela perguntou casualmente, mexendo no celular, como se o que eu estivesse fazendo fosse tão comum quanto pedir pizza numa sexta à noite. Essa naturalidade dela era algo que me deixava à vontade. Nunca rolava aquele peso moral que as outras pessoas colocariam.

— A gente sempre tá, né? — Respondi, rindo de leve, enquanto esticava os braços e tirava o capuz.

Ela deu uma risada baixa, e o som me fez lembrar de uns anos atrás, quando soltou aquela provocação infeliz: "Se não fosse meu melhor amigo..." Aquilo tinha me deixado com a cabeça cheia naquele tempo, a gente quase estragou tudo. Porque, apesar de já termos cruzado essa linha antes — e quase destruído nossa amizade no processo —, a provocação não saia da minha mente desde aquele tempo. Era como se, cada vez que ela jogava algo assim no ar, eu tivesse que me forçar a não pensar besteira. A real é que eu sempre fui louco por ela. Mas perder a Cleo? Isso era muito mais apavorante do que qualquer atração.

Fechei o notebook, missão cumprida, grana garantida. Quando me virei, ela ainda tava largada na cama, concentrada no celular, resolvendo coisas da loja online. Sempre focada no trabalho, mesmo que estivesse ali jogada de qualquer jeito, de moletom e camiseta velha, ainda parecia incrível.

— Você vai com essa roupa de pijama pra balada ou vai se arrumar? — Perguntei, observando seu look confortável, e ela levantou os olhos, erguendo uma sobrancelha com aquela expressão debochada que só ela sabia fazer.

— Relaxa, nerd, já já me arrumo. — Ela riu, preguiçosa, levantando devagar. — Mas e você, vai continuar nessa de bom moço ou vai colocar alguma roupa que faça as meninas surtarem?

Eu sorri, balançando a cabeça. Cleo sempre sabia como me atingir. Ela me conhecia como ninguém. Sabia que, por trás desse visual de badboy tatuado, eu era só um nerd viciado em tecnologia e uma boa adrenalina. E ela? Ela era o caos em forma de gente. A única que fazia a minha vida dupla parecer equilibrada.

Mais tarde, na sala, eu ajustava a camiseta que ela tinha me dado pra usar. Parecia ter sido feita sob medida, o tecido caindo perfeitamente nos meus ombros, me fazendo sentir mais confortável do que eu queria admitir. Mas antes que eu pudesse terminar de ajeitar tudo, Cleo apareceu. E, mano... eu sabia que ela gostava de brincar com a minha cabeça, de me provocar. Mas naquela noite, ela tava jogando pesado, num nível que eu nunca tinha visto.

Ela entrou na sala de um jeito que fazia tudo ao redor parecer insignificante. Uma saia preta curta, aquelas botas de salto que ela adorava, e um top que... Jesus, deixava à mostra a parte de baixo dos seios. A parte de baixo dos seios, mano! Era óbvio que ela tinha feito de propósito, só pra ver a minha reação. E, claro, eu reagi do jeito esperado.

— Caralho, Cleo, cê vai mesmo sair assim? — falei, sem conseguir disfarçar a irritação.

Ela sorriu. Mas não era qualquer sorriso. Era aquele sorriso atrevido, cheio de malícia, o tipo de sorriso que mexia com tudo dentro de mim. O tipo de sorriso que fazia meu estômago dar voltas.

— Qual o problema? Tá morrendo de ciúmes agora, é? — Ela respondeu, com a voz leve, mas com um brilho nos olhos que me dizia que sabia exatamente o que tava fazendo comigo.

— Não é ciúmes, é bom senso. — Tentei controlar o tom da voz, mas já sabia que era inútil. — Cê parece que tá indo matar alguém com essa roupa.

— Boa. Esse é o objetivo. — Ela piscou, ajeitando o top como se fosse a coisa mais natural do mundo sair com quase metade daqueles peitos à mostra.

O coração bateu mais rápido. Eu sabia que ela adorava brincar desse jeito, sempre testando meus limites, me deixando num vai e vem entre desejo e frustração. E, mesmo assim, toda vez que ela fazia isso, eu me sentia como se fosse a primeira vez. Minha mente voltou praquela maldita provocação de mais cedo, quando ela brincou sobre me pegar se eu não fosse o melhor amigo. O problema é que, às vezes, eu pensava o mesmo. Só que, diferente dela, eu guardava isso bem fundo, porque sabia o risco que corríamos. A experiência de cinco anos atrás não me deixava esquecer. Tentamos uma vez. E quase perdemos tudo.

Mas ali, parado, olhando pra ela... Como diabos eu conseguia segurar qualquer atração que sentia? Cleo estava deslumbrante, uma mistura de anjo e diaba, irresistível de um jeito que ninguém mais era. Eu queria protegê-la, sempre quis. Só que a Cleo não era o tipo de pessoa que deixava alguém fazer isso. Ela era forte, livre, impossível de ser controlada.

— Vem, nerdão. A balada nos espera. — Ela riu, já indo em direção à porta, me puxando de volta pra realidade.

Engoli em seco, tentando disfarçar o caos que ela sempre causava dentro de mim. Não era só aquela roupa, era ela. Cleo podia estar vestida de pijama ou naquele look matador, e o efeito seria o mesmo. Ela tinha um poder sobre mim que eu nunca conseguia explicar, e mesmo que eu soubesse que ela me amava como amigo, tinha que manter o que eu sentia sob controle. Porque o que a gente tinha — essa amizade, essa cumplicidade — era a coisa mais preciosa da minha vida.

E a última coisa que eu queria era perder Cleo.

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