O plano

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A lua fazia-se presente no céu quando Chan acordou, seu corpo suado e a boca seca. O moreno se levantou, caminhando até a pequena pia e ligando a torneira, suspirando satisfeito quando a água saiu. "Eles ainda não desligaram, não deve ser muito tarde, então", pensou. Formou uma concha com as mãos, jogando-a em seu rosto, limpando o suor e as marcas de lágrimas. Nem ao menos percebeu quando chorou. Em seguida, retirou a camiseta para que pudesse molhar os braços, nuca, pescoço e peito. Desligou a torneira, passando as mãos molhadas pelo cabelo longo, jogando-os para trás; foi até a janela pequena e quadrada, sentindo a brisa bater em seu corpo molhado. Seus pelos se eriçam pelo frio, mas sente-se bem, o calor causado pelo veneno deixa seu corpo aos poucos. Essa é mais uma rotina em seus dias monótonos.

Acorda por volta das dez, mesmo que ele não saiba que esse é o horário. Ao meio-dia, alguém vem trazer seu almoço. Entre uma e duas da tarde, o médico aplica a dose diária, dorme durante a tarde, acorda por volta das oito e as nove, para outra refeição. O homem observa a lua, um costume adquirido de sua cidade natal, traça as constelações e viaja em sua mente sobre seu passado, idealiza formas e rotas de fuga – que sabe que não seriam bem-sucedidas sem ajuda -, se pergunta sobre seus pais e Kaleo, desejando que estejam bem. Faz alguns exercícios básicos - prancha, flexão, abdominal, agachamento etc. - apenas para não atrofiar os músculos e se manter em forma e saudável na medida do possível.

O guarda vem trazer sua refeição - arroz empapado e ensopado de verduras e legumes aguado e sem sal –, passando pela abertura pequena na porta. A estrutura pesada de ferro é grossa e tem duas aberturas: uma pequena para refeições e outra quadrada, na altura do rosto, com grades verticais de ferro, para que os guardas pudessem observar a movimentação do Bang. Atento aos passos do lado de fora enquanto come, Chan percebe que está na hora da troca de turnos e logo o vigia noturno estará em frente ao quarto. Termina de comer, se aproximando da porta, dando duas batidas e colocando o prato no espaço para ele, sendo puxado para fora.

Por volta de meia-noite, escuta um chamado, já sabendo de quem se trata. O vigia noturno, Jisung, é o único que fala consigo. Um menino novo de madeixas azuis, olhos também azuis tão claros quanto o mar sob o sol do verão, corpo aparentemente magro, mas com músculos - pelo pouco que Chan pode observar pela grade -, e de sorriso fácil e bonito. Inicialmente, perguntou-se o que alguém como ele estava fazendo nesse trabalho. Parecia ser um garoto gentil e bondoso, não combinava em nada com aquele ambiente e pessoas. Pelas suas contas, tem em torno de um ano e quatro meses que Jisung apareceu. De início, o menino não falava nada, mantendo sua postura. Alguns meses depois, com um pouco de coragem e menos medo de ser pego, tendo noção de horários e de como tudo funcionava, começou a puxar papo. Eram somente sobre o clima e o que ocorria no reino, depois vieram as fofocas das aldeias próximas e, com mais intimidade, falaram um pouco sobre suas vidas. Cerca de três meses atrás, o Han, abatido, lhe contou sobre seu namorado que sumiu há dois anos e que, por meio de contatos, descobriu ter sido sequestrado pelo rei e agora ali estava ele, infiltrado para que pudesse achá-lo, porém, depois de tanto tempo, descobriu que seu amor foi usado como moeda de troca. Tudo sendo falado por sussurros para que ninguém os pudesse ouvir ou através de papéis que o garoto levava escondido em seu coturno.

Encostou na porta, podendo ver o perfil do menino pela abertura. Jisung virou para si, sorrindo.

          - Boa noite, Chan. - Foi respondido com um acenar de cabeça e um boa noite baixo. - Todos já foram dormir, ainda bem, não aguentava mais os ouvir.

         - O que falavam dessa vez?

         - Sobre a nova conquista no Reino de Étoile. Pelo visto, o exército conquistou a faixa beira-mar, tomou os portos e capturou um zoomorfo de Lumière. - Seus ombros caem e sua fala murcha. Tudo o que está acontecendo é tão injusto. Terras sendo ocupadas e colonizadas, pessoas sendo mortas, perseguidas e escravizadas. O garoto não entende o porquê disso tudo. Expandir território? Para quê! Ter mais poder? Deprimente! Somente um velho sádico brincando com a vida dos outros.

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