Any despertou devagar, seu corpo ainda encolhido no sofá macio. Kyle, o ursinho que sempre lhe trazia conforto. O ar tinha o cheiro suave de café recém-feito, um aroma familiar que a fez se sentir segura, como se estivesse em um lar, algo que ela não sentia há muito tempo.
Ela abriu os olhos e piscou algumas vezes, ajustando-se à claridade suave que preenchia a sala. A sensação de segurança era quase estranha para ela, e o pensamento de que alguém estava cuidando dela a fazia sorrir. Any apertou o ursinho contra o peito e, ainda de olhos fechados, começou a sussurrar.
— Bom dia, Kyle - disse, sua voz suave e sonhadora. - Você sabia que tem o nome mais bonito do mundo?
Ela se lembrava perfeitamente do dia em que havia escolhido o nome para seu ursinho. Estava assistindo a uma reportagem na televisão sobre um homem perigoso que estava sendo procurado pela polícia. Josh "Kyle" Beauchamp, o líder do morro do Alemão, um nome que havia soado tão bonito em seus ouvidos, apesar do contexto sombrio. Any não pensou no perigo ou no crime, apenas achou o nome "Kyle" tão bonito que decidiu dá-lo ao seu ursinho.
O som de passos ecoou pelo corredor, interrompendo seus pensamentos. Josh entrou na sala com uma expressão tranquila, mas curiosa, ao ver que Any já estava acordada, envolvida em seu próprio mundinho.
— Bom dia, dorminhoca - ele disse, sorrindo de canto, ainda tentando entender aquela garota tão peculiar.
Any levantou os olhos e, diferente da noite anterior, seus olhos brilhavam. Seu rosto se iluminou ao vê-lo, e ela, imediatamente, começou a falar com a mesma leveza que reservava para seu ursinho.
— Oi! - disse ela alegremente, segurando Kyle com orgulho. - Esse é o Kyle! Ele dormiu comigo. E sabe o que mais? Eu adoro o nome dele. Kyle é um nome muito bonito, não acha?
Josh ficou surpreso por um instante, como se estivesse ouvindo algo inacreditável. Ele disfarçou sua reação e riu baixinho, mas uma pontada de curiosidade passou por sua mente. O nome "Kyle", o mesmo que ele carregava como seu segundo nome, um nome que usava para negócios obscuros, estava agora presente no ursinho daquela garota frágil e inocente. Era pura coincidência, mas algo nessa ligação o fez sentir algo diferente, uma espécie de ironia reconfortante.
— Kyle, hein? - Josh repetiu, sorrindo levemente. - Sim, é um nome bonito. Acho que combina com ele.
Any balançou a cabeça, animada, ainda sem fazer a conexão entre o nome do ursinho e o homem à sua frente. Para ela, era apenas um nome que soava bem, sem nada de perigoso ou ameaçador. Ela começou a balançar as pernas, como se estivesse cheia de energia, e então soltou uma enxurrada de palavras.
— Eu tô com muita fome! Tem pão? Eu gosto de pão com manteiga, mas o leite tem que ser bem quentinho, tá? E pode colocar açúcar no leite? Eu gosto de muito açúcar. E Kyle gosta de bolacha, você tem bolacha? Ele adora comer bolacha no café da manhã!
Josh ficou parado, observando o fluxo de palavras que Any despejava com tanta naturalidade, e não pôde deixar de rir um pouco. O contraste entre a inocência dela e o mundo brutal que ele vivia fazia algo se mexer dentro dele, algo que ele achava que tinha perdido há muito tempo.
— Tem tudo isso aí - ele respondeu, sorrindo enquanto a guiava até a cozinha. - Vamos ver o que conseguimos preparar.
Na cozinha, Josh esquentou o leite e arrumou a mesa, enquanto Any se sentava, balançando as pernas debaixo da cadeira. Ela parecia completamente à vontade agora, como se o medo da noite anterior tivesse se dissipado com o dia. Josh a observava.
— Tá quentinho! - Any exclamou, segurando a caneca com as duas mãos e soprando o leite antes de tomar um gole. - Sabe, Josh... você é legal. Eu não gosto de muita gente, mas gosto de você. E o Kyle também.
Josh ficou surpreso com a franqueza dela. Não estava acostumado a ouvir elogios, especialmente vindos de alguém tão fora de seu círculo usual. Ele puxou uma cadeira e sentou-se à frente dela, cruzando os braços sobre a mesa.
— É, eu também gosto de você, Any - ele disse, com um sorriso discreto. - Acho que você e o Kyle podem ficar aqui por um tempo, se quiserem.
Any parou por um instante, seus olhos grandes e brilhantes se fixaram nele. Ela colocou a caneca na mesa e olhou para o ursinho, como se estivesse confirmando a notícia com ele antes de responder.
— Sério? Eu e o Kyle podemos ficar? - sua voz transbordava de uma alegria genuína.
Josh acenou com a cabeça, ainda sentindo aquela estranha sensação de conexão. Ele nunca havia imaginado que alguém como Any pudesse afetá-lo dessa forma, mas ali estava ele, oferecendo abrigo e proteção a uma garota que, de todas as pessoas, parecia estar ainda mais perdida do que ele próprio.
— Sim, podem - disse ele, sua voz mais suave do que o normal. - Enquanto estiverem aqui, vou cuidar de vocês dois.
Any sorriu amplamente, e naquele instante, Josh sentiu algo mudar dentro de si. Pela primeira vez em muito tempo, ele se sentiu vulnerável, mas de uma maneira boa. Como se estivesse se permitindo sentir algo que há muito evitava.
E foi ali, naquele simples café da manhã, que Josh percebeu que sua vida, de alguma forma, estava começando a tomar um rumo inesperado.
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A Protegida do Morro
RomanceUma jovem de espírito doce e um olhar inocente, encontra-se desamparada até que cruza o caminho do temido líder do Morro do Alemão. Entre desenhos e risadas, ela revela sua esperteza e fragilidade, enquanto ele, marcado pela vida no crime, descobre...