audição

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Oie, gente!

Estamos adorando escrever essa. Muito bom ser maluca em dupla.

Aproveitem!

••

Diana tem alguma convicções certas em sua vida. A primeira delas, e a mais engraçada, é a de que nenhuma mulher no mundo gosta mesmo de ouvir o marido falar. Hugo é cansativo, machista muitas vezes, e repete a mesma ladainha o suficiente para que se torne maçante.

Então, Diana aprendeu logo no começo do casamento a fingir atenção enquanto reflete sobre qualquer outra coisa, as palavras de Hugo completamente surdas aos seus ouvidos.

"Você também acha?"

"O quê?" Ela para, observa a forma como Hugo a encara, e acha que é algo do trabalho. Deve ser.

"A Fátima." Ele ri. "Eu acho que não deve dar conta do Robson não."

E é por isso que ignorá-lo é sempre mais fácil.

"O que isso diz respeito a você, Hugo?"

Diana perde pontos então, porque é no momento que ele percebe que a está irritando que as investidas sempre ficam maiores. Hugo é obcecado por tirá-la do sério. Como se fosse um jogo.

Ele sorri. Ela revira os olhos.

Inferno.

"Nada. Não quis ofender sua amiguinha."

Diana quer discutir porque sabe que ele também não a escuta. Não ouve seus murmúrios nem as reclamações. São dois corpos ocupando o mesmo espaço, mas nunca uma mesma conversa. Monólogos. A solidão desacompanhada.

Ela finge, bufa, se põe de lado, termina o café e se arruma para correr. Porque não importa. Não importa o que Hugo pensa ou deixa de pensar sobre sua amiga. Ela é sua. No meio das pessoas, do sol, dos drinks malucos e do seu jeito quase tempestuoso. Não parece importar. Funciona. É diferente.

E Fátima parece não ter com quem falar. Por isso, Diana sempre a escuta.

Não é uma abertura imediata. Fátima não é uma daquelas pessoas - do tipo que sempre lhe deixa um pouco irritada - que começa a falar de sua vida no meio da fila do pão ou com qualquer um que esteja na sua frente. Ela precisa provocar, caçar uma palavra que a amiga solta quase sem perceber. Estranhar, para Fátima saber que nada daquilo que ela passa é normal. "Pianista?". Talvez seja disso que Diana goste tanto. De saber que é apenas com ela que Fátima se abre.

Diana carregou consigo por muito tempo a crença que a habilidade de desligar sua atenção e filtrar o que ouvia era um talento para manter as relações. Ouvir para ponderar e responder tomam um tempo precioso. Agora, cada palavra que Fátima fala parece um baú trancado a sete chaves com um tesouro. Ela se sente uma espécie de exploradora. É algo novo, diferente de Hugo. É bom.

Começa com a história sobre o piano. Os olhos acompanham sua voz enquanto ela conta, animada, como aprendeu a tocar. Acompanham seus dedos, a maneira como ela se enrola na frase, os olhos mais baixos, as frases falhas.

Depois, um milhão de segredos sussurrados como se Fátima não soubesse nem como colocá-los no mundo. A privação de comida, as dietas malucas, a agressividade doce de Robson.

Não faz muito sentido. Fátima é uma das mulheres mais bonitas que Diana já viu na vida. Quando ela reclama sobre os comentários de Robson envolvendo seu corpo, Diana não pode deixar de reparar nos seus braços definidos e coxas grossas. Ela se segura para não insinuar que Robson parece mais preocupado em apontar defeitos do que em amar a própria esposa. Que ela com certeza teria uma fila de homens querendo uma chance no momento em que desse um basta na situação toda. Mas se sente hipócrita. Ela própria não faz nenhum movimento resolutivo com relação ao seu casamento.

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