CAPÍTULO 1

101 7 2
                                    


MAYDAY, MAYDAY! PT-YES para a torre de comando. Me ouvem? Estamos perdendo altitude. Preciso de orientações para um pouso forçado.

INTERFERÊNCIA DO SINAL>>>> 

Torre de comando: >>>>>>>repita o prefixo da aeronav...interferência>>>>>

Y: papa tango yanque echo sierra. copiou?? Me ouvem???? MAYDAY, MAYDAY...preciso de orientações para um pouso de emergência...

NOTICIÁRIO: Esta manhã um avião Cessna 210 que fazia a rota Istambul-Izmir sumiu dos radares depois do último contato com a torre de comando por volta das dez horas da manhã. O piloto e mais duas pessoas estão desaparecidos. Foi relatado que houve uma tempestade com raios na rota. Equipes de buscas estão em reunião para traçar um plano de resgate, já que há possibilidade de que o avião tenha caído na floresta. Voltaremos a qualquer momento assim que tivermos novas informações.

FICHA: SEHER KERIMOGLU

             27 ANOS

             SOLTEIRA

      EMPRESÁRIA - DONA DE UMA REDE DE RESTAURANTES ESPECIALIZADOS EM COMIDA DO MEDITERRÂNEO.

FICHA: YAMAN KIRIMLI

             34 ANOS

             SOLTEIRO

         PILOTO DE AERONAVE - DONO DO MONOMOTOR CESSNA 210- 5 lugares

FICHA: HAKAN MACAR

              36 ANOS 

              DIVORCIADO

         CHEF DE CUISINE- FUNCIONÁRIO DA REDE DE RESTAURANTES SEHER'S.

15 HORAS ANTES DO IMPACTO.

Seher observa as reservas no computador. O seu restaurante em uma área nobre de Istambul é um sucesso. Diz: Hakan estaremos lotados esta noite para o jantar. Está tudo certo na cozinha?

H: tivemos um probleminha com um dos cozinheiros, mas já resolvi.

S: Que probleminha??

H: Veio trabalhar com a mesma roupa de ontem e estava suja.

S: Esse tipo de coisa não pode acontecer. Os uniformes devem estar sempre impecavelmente limpos. Se quisermos manter nossa fama em qualidade, todos os detalhes são importantes. E como você resolveu?

H: eu mandei que somente voltasse com o uniforme limpo.

S: Mas e se ele não voltar? Não podemos ficar sem ninguém hoje. A casa está lotada!

H: Caso ele não volte, eu mesmo o substituirei. Faço o meu serviço e o dele, e com um pé nas costas. Falou debochando.

Seher conhecia muito bem a falácia de Hakan, tudo o que ele dizia que faria com um pé nas costas ele mandava o sous chef fazer.

S: Bem, não me interessa o que você fará. Só não quero atrasos, ok?

Seher Kerimoglu era uma menina pobre que viva com seu pai em um bairro de Istambul. Seu pai era pedreiro e ganhava somente o suficiente para sustentá-los, até que sofreu um ataque cardíaco, que o impossibilitou de trabalhar como antes. Seu Yusuf, depois do infarto, não foi capaz de pegar grandes obras, apenas pequenas reformas, por isso, mesmo contra a vontade do pai, ela se empregou aos 14 anos em um pequeno restaurante do bairro onde vivia, executava, a princípio, pequenas tarefas como lavar louças, preparar saladas e molhos e depois passou a cozinhar também. Estudava de manhã e trabalhava de tarde até à noite. Lá, naquele pequeno restaurante, descobriu sua paixão pela arte da cozinha. Seu sonho era fazer a faculdade de gastronomia, mas não tinha tempo e nem dinheiro para isso. Trabalhou incansavelmente até que, aos dezenove anos, conseguiu abrir seu primeiro restaurante, lá mesmo no bairro em que morava. Um estabelecimento muito simples em que atendia principalmente os trabalhadores na hora do almoço. Não demorou muito para que seu tempero ficasse famoso e que pessoas de outros bairros e até mesmo do centro viessem saborear seus pratos. Era tão organizada e tão determinada que dois anos depois abriu outro restaurante no centro de Istambul. Ainda não era do jeito que ela sonhara, mas era bem maior e mais bem localizado que o do bairro. Naquela época já tinha condições financeiras de frequentar uma escola de gastronomia, mas trabalhava tanto que não lhe sobrava tempo. Quanto mais sucesso tinha, mais trabalhava. Era difícil dar conta dos dois restaurantes. Não abandonou o do bairro, onde vendia os pratos mais triviais com preços menores, a fim de que os trabalhadores pudessem continuar desfrutando de sua boa comida. Tinha um coração enorme, jamais deixaria de estender a mão àqueles que, de alguma forma, a ajudaram. Ela contratou cozinheiros para trabalhar lá e Sr.Yusuf, seu pai, e Kiraz, sua amiga de infância, a ajudavam a administrar o pequeno restaurante do bairro. Embora dedicasse o seu tempo quase que exclusivamente ao restaurante do centro, estava sempre organizando as coisas da cozinha do restaurante do bairro, porque não admitia que a qualidade de um fosse inferior ao do outro. Mais três anos se passaram até que finalmente conseguiu abrir um outro restaurante, em uma área nobre de Istambul. Esse sim, era o que ela sempre sonhou. Um lugar amplo, bonito, arejado, com uma cozinha enorme em uma área nobre da cidade. Aos 24 anos, a mocinha pobre do bairro já era proprietária de uma rede de três restaurantes e não pensava em parar por aí. Reformou os dois primeiros restaurantes, tornando os três padronizados em estilo, atendimento e culinária. Mesmo assim, o do bairro ainda tinha preços mais em conta para que pudesse ficar ao nível dos moradores e trabalhadores. Tinha sonhos de entrar para os guias gastronômicos do mundo, como o famosíssimo Michelin. Acontece que para ser reconhecida internacionalmente e ter estrelas do Michelin, entre outras coisas, é necessário ter um chef de cuisine (chefe de cozinha), então cada vez mais sem tempo de se aventurar em uma escola de gastronomia, teve de contratar um.

Hakan Macar era um chefe de cozinha, nascido e criado em Istambul e diferentemente de Seher, sua família era abastada. Viveu sempre na área nobre de Istambul. Tinha sido casado, mas seu casamento foi por água abaixo quando a mulher o pegou traindo com sua melhor amiga dentro da casa deles. Pediu o divórcio e tratou de tirar tudo o que pudesse dele para ela e para o filho que tinha 2 anos na época. Como era de família conhecida, seu pai, ordenou que ele atendesse a todas as reivindicações da esposa traída para evitar um escândalo. Depois disso, ficou praticamente falido, porque não teve mais auxílio financeiro de seu revoltado pai e teve de ir à luta. Era um homem bonito, alto, louro, olhos azuis e um mulherengo. Quando foi trabalhar para ela não esperava que fosse uma mulher tão bonita, mas quando a viu, ficou impressionado com sua beleza, assim como noventa e nove porcento dos homens que a conheciam. Tinha um interesse absurdo nela, mas ela tratou de deixar claro que se ele quisesse trabalhar com ela, deveria manter um comportamento adequado, sem envolvimentos emocionais. Seher na verdade o achou pretensioso demais desde o início, mas precisava dele, então resolveu deixar veladas as questões pessoais.

Seher tinha sido convidada para uma reunião em um hotel, para que talvez instalasse lá seu restaurante. Aceitou.

S: tudo pronto para amanhã? Conseguiu fretar o avião?

H: sim, já está tudo certo. Amanhã vamos ao rumo do seu quarto restaurante, moça bonita!

13 HORAS ANTES DO IMPACTO:

Yaman chegou no hangar perto das 19 horas. Tinha acabado de chegar de um voo curto. No hangar, Ali, seu sócio o esperava.

A: Demorou, hein? Pensei que não ia conseguir te pegar aqui.

Y: O que foi? Algum problema?

A: Não pelo contrário, conseguimos um fretamento para amanhã às nove da manhã para Izmir. Já até pagaram, à vista. Ufa, finalmente algum dinheiro entrando.

Y: quantas pessoas?

A: duas, uma mulher e um homem.

Y: Casal? Não por favor que não sejam. Lembra da última vez? Que aquele casal queria fazer meu colibri de motel?

A: Não sei se são um casal, mas não estamos em condições de recusar. Aliás, já fechei o fretamento.

Y: tá, tem razão. Vamos para casa descansar então, porque amanhã teremos de estar cedo aqui para o abastecimento e o check-list.

Yaman Kirimli sempre sonhou em ser piloto. Trabalhou duro desde menino e sempre que podia guardava algum dinheiro para pagar a escolinha de aviação. Quando completou a maioridade, iniciou as aulas e tirou seu primeiro brevê e com o tempo foi se especializando, até que conseguiu a habilitação de aviação civil para ser piloto de aeronaves de pequenos portes. Ele e Ali foram criados no mesmo bairro. Tinham 2 anos de diferença de idade. Eram amigos. Cresceram juntos. Yaman por ser mais velho, sempre protegeu Ali. Até que um dia, quando tinha mais ou menos 16 anos, Ali foi atropelado e ficou entre a vida e a morte. Uma campanha grande foi feita no bairro para doação de sangue. O sangue dele, doador universal O-, só era receptor do mesmo tipo. Todos fizeram testes, mas não conseguiram ninguém com o mesmo tipo sanguíneo. Nessa época Yaman estava com sua mãe visitando uma tia no interior. Recebeu um telefonema da mãe de Ali, pedindo ajuda, já que ela sabia que os dois tinham o mesmo tipo sanguíneo. Yaman voltou, doou e milagrosamente Ali se salvou sem sequelas. Apenas algumas cicatrizes sobraram daquele acontecimento terrível. Mais ou menos um ano depois, quando os rapazes tinham 17 e 19 anos, a mãe de Ali chamou os dois e, como estava muito doente, contou que eles eram irmãos. Ela tinha tido um relacionamento com o pai de Yaman e ficou grávida de Ali. Como estava com medo de morrer e levar esse segredo para o túmulo, resolveu contar. Não queria deixar Ali sozinho no mundo. Em um primeiro momento, os dois ficaram assustados, mas depois muito felizes. Na verdade, eles sempre foram irmãos, só não sabiam. Depois de uns três anos, uma tia do pai deles faleceu e como não havia herdeiros próximos e o pai deles já havia morrido, herdaram o patrimônio que a tia deixou. Constituía em uma mansão em Istambul e uma fazenda no interior do país. Venderam a fazenda e ficaram com a casa. Com o dinheiro compraram o Cessna 210 e abriram um negócio de fretamento de voo. O negócio era: um avião, um piloto e um agenciador de voos. Tinham uma mesa de escritório dentro do hangar onde o "colibri" de Yaman dormia. 

A Flor e o ColibriOnde histórias criam vida. Descubra agora