Capítulo 8: A Jornada de Fé

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O tempo seguia seu curso, e Dídimo, que antes caminhava por caminhos tortuosos, agora trilhava uma estrada nova, pavimentada pela fé e pela generosidade. A vida parecia mais leve. As sombras que antes o envolviam haviam se dissipado, dando lugar a uma luz que ele ainda estava aprendendo a compreender. Mesmo assim, o peso do passado o acompanhava, e ele sabia que, embora tivesse mudado, seu coração ainda passaria por provações mais profundas.

Uma manhã, enquanto fazia sua caminhada diária pela praia, o mesmo lugar onde havia encontrado a Bíblia que transformara sua vida, Dídimo se viu envolto em pensamentos. A brisa suave do mar parecia soprar diretamente em sua alma, como se o convidasse a refletir sobre tudo o que havia vivido até ali. Ele olhou para o horizonte, e a vastidão do oceano o fez lembrar da imensidão do amor divino, algo que ele ainda estava tentando entender em sua plenitude.

Mesmo depois de suas boas ações, algo ainda o inquietava. Ele sentia que, apesar de estar fazendo o bem, sua transformação espiritual não estava completa. A fé que havia começado a nascer dentro dele precisava de raízes mais profundas. Ele se questionava se realmente havia entregue seu coração por completo a Deus ou se estava apenas tentando preencher o vazio com atos de caridade. Era como se uma voz dentro dele perguntasse: "Dídimo, você verdadeiramente acredita ou está apenas buscando redenção pelos seus erros passados?"

Essas perguntas o assombravam. Ele desejava ter a certeza e a paz que via nos olhos das pessoas de fé, como aquela senhora de cabelos brancos com quem havia conversado, mas sua mente ainda estava em guerra consigo mesma. Como ele, um homem que passara tantos anos desviado, poderia ter a mesma força espiritual daqueles que dedicaram suas vidas inteiras à fé?

Foi nesse estado de dúvida que Dídimo decidiu procurar ajuda. Ele sabia que não podia continuar sozinho nessa jornada de fé. Embora tivesse começado a participar das atividades da igreja local, algo em seu coração o levava a buscar conselhos mais profundos. Assim, numa tarde quente, ele decidiu visitar o pastor responsável pela igreja. Precisava entender melhor o que estava acontecendo dentro de si.

Ao chegar à igreja, foi recebido por um ambiente tranquilo e acolhedor. As grandes portas de madeira estavam abertas, e a luz do sol atravessava os vitrais coloridos, criando um efeito mágico dentro do templo. O pastor, um homem de cabelos grisalhos e olhar sereno, o recebeu com um sorriso calmo, como se soubesse que Dídimo vinha em busca de respostas.

— Pastor Samuel, eu preciso conversar com você, — disse Dídimo, com um tom de urgência que revelava sua angústia interior.

— Claro, meu filho, — respondeu o pastor, apontando para um banco perto do altar. — Vamos sentar. O que o está afligindo?

Dídimo se sentou ao lado do pastor, sentindo o peso das suas próprias dúvidas e incertezas.

— Tenho feito muitas mudanças em minha vida, — começou ele, olhando para o chão. — Comecei a ajudar os pobres, a doar parte de minha fortuna, e até me afastei do caminho de arrogância que seguia antes. Mas, mesmo assim, sinto que ainda não encontrei a paz que procuro. Por mais que eu tente, parece que algo dentro de mim ainda está torto, ainda está vazio. Será que estou realmente no caminho certo?

O pastor ouviu em silêncio, respeitando o momento de vulnerabilidade de Dídimo. Após uma breve pausa, ele colocou a mão sobre o ombro do homem, em um gesto de conforto.

— Dídimo, o que você está sentindo é normal em uma jornada de fé. O caminho para Deus não é feito de passos perfeitos, mas de sinceridade. E a dúvida faz parte dessa caminhada. Não é o que você faz com suas riquezas ou suas ações que vai garantir sua paz interior, mas o que você faz com o seu coração. O verdadeiro tesouro é a entrega total do coração a Deus.

Dídimo ouviu atentamente, e aquelas palavras começaram a fazer sentido. Ele havia feito muitas coisas boas, mas talvez não tivesse entregado seu coração por completo. Havia doado seus bens, ajudado os necessitados, mas ainda tentava controlar o que não podia ser controlado — seu destino espiritual.

— E como eu faço isso, pastor? — perguntou Dídimo, sentindo as lágrimas se acumularem nos olhos. — Como eu entrego meu coração a Deus?

O pastor sorriu com ternura.

— Não existe uma fórmula exata, Dídimo. A fé é um processo. Para uns, ela nasce rapidamente, como uma chama que de repente se acende. Para outros, como você, é algo que vai crescendo aos poucos, à medida que você abre espaço para Deus em sua vida. O importante é que você não se apresse. Continue no caminho que está, continue buscando, e, principalmente, ore. A oração é o canal pelo qual você vai abrir seu coração para Deus. Quando menos esperar, sentirá a paz de que tanto fala.

Dídimo assentiu, emocionado com aquelas palavras. Ele nunca havia aprendido a orar, mas algo dentro dele sabia que essa era a chave que faltava. O pastor se ofereceu para ensiná-lo, e ali, naquela igreja tranquila, Dídimo fez sua primeira oração sincera. Não foi longa, nem cheia de palavras rebuscadas, mas foi a oração de um homem que, pela primeira vez, estava verdadeiramente buscando um relacionamento com Deus.

Nos dias seguintes, Dídimo passou a orar todas as manhãs e noites. Aos poucos, sentia que algo em seu interior estava mudando. A ansiedade e o medo que antes o acompanhavam estavam dando lugar a uma leveza que ele nunca havia experimentado. Não era uma mudança abrupta, mas uma transformação lenta e constante. A fé, que antes era algo distante, começou a se tornar parte de quem ele era.

Certo dia, ao caminhar novamente pela praia, ele se deparou com algo que o fez parar. Era um menino pequeno, de cabelos desgrenhados e roupas gastas, que brincava sozinho na areia. Dídimo, movido por sua nova sensibilidade, se aproximou e perguntou:

— O que você está fazendo, garoto?

O menino, sem olhar para ele, continuou desenhando algo na areia com um pedaço de madeira.

— Estou desenhando o caminho para o céu, — respondeu o menino, com uma naturalidade que surpreendeu Dídimo.

— O caminho para o céu? — perguntou Dídimo, curioso. — E como você sabe para onde ele vai?

O menino parou o que estava fazendo, levantou os olhos e sorriu.

— Eu não sei, mas Deus sabe. E se eu confiar nele, ele vai me mostrar.

Aquelas palavras, vindas de uma criança, atingiram Dídimo com a força de uma revelação. A confiança, a simplicidade e a fé daquele menino eram a resposta que ele tanto procurava. Ele não precisava saber de tudo, nem controlar todos os aspectos de sua vida. Tudo o que precisava fazer era confiar. Confiar que, mesmo nos momentos de incerteza, Deus o guiaria.

Com os olhos marejados e o coração aquecido, Dídimo se afastou da criança e voltou a caminhar pela praia. Pela primeira vez em muito tempo, ele sentia uma paz profunda. A estrada para a fé era longa, mas ele agora sabia que não estava mais sozinho. Ele havia encontrado algo que não podia ser comprado ou conquistado: a fé verdadeira, aquela que nasce no coração e nos faz enxergar o mundo de uma forma completamente nova.

E assim, o homenzinho torto, que antes andava pelos caminhos da escuridão e da arrogância, agora caminhava de mãos dadas com a fé. Seus passos, antes incertos e vacilantes, começavam a se alinhar com a vontade divina, e ele sabia que, por mais que a jornada fosse difícil, estava no caminho certo.

O  Homenzinho TortoOnde histórias criam vida. Descubra agora