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Levei o dia explorando cada canto e cada escada da escola. Aicha fez questão de me mostrar tudo, detalhadamente, com um brilho nos olhos. E, entre um corredor e outro, insistiu que eu fosse na “noite das garotas” com as amigas dela. Apesar de eu preferir uma noite tranquila, acabei cedendo à sua empolgação. Talvez conhecer novas pessoas pudesse ajudar de alguma forma.

O resto do dia foi calmo: mais aulas, até um jantar no refeitório, onde o cheiro de comida caseira impregnava o ar. As mesas de madeira rústica estavam repletas de opções, e confesso que provei um pouco de tudo.

Por volta das nove, eu e Aicha subimos as escadas para o dormitório das amigas dela. Quando entramos, vi três garotas. A primeira, uma baixinha de cabelos castanhos e bochechas fofas, acenou para mim com um sorriso tímido. Em outra cama, uma loira encaracolada deu um salto, quase que correndo para abraçar Aicha, como se não se vissem há dias, apesar de estarem a um quarto de distância. A última garota estava quieta, sentada sobre o tapete, comendo pipocas cobertas de chocolate e observando tudo.

Nos sentamos juntas no carpete, e, num movimento rápido, Aicha tomou o balde de pipoca da mão da garota quieta e puxou para si, com aquele jeito divertido. Sorri e aproveitei a deixa para me apresentar.

— Prazer, sou a América.

Como esperado, as três congelaram por um segundo, provavelmente impactadas pelo meu nome. Sempre foi assim. Após a pausa, a primeira garota, que tinha acenado para mim, sorriu e disse:

— Merina. Prazer.

Fiquei feliz em conhecer outra pessoa com um nome diferente; parecia um sinal de que eu realmente não estava sozinha. Em seguida, a loira, que parecia ser a mais agitada, tomou a palavra:

— Bem-vinda ao clube, América! Eu sou Genevive, mas todo mundo me chama de Vive... ou Gen...

Antes que pudesse continuar, a garota do tapete — a quieta e observadora — falou com uma voz tranquila:

— Gen, calma. Você vai assustar ela falando desse jeito. Eu sou a Regine.

Rimos, e eu estendi a mão para cumprimentá-las uma a uma. Coloquei a mão no balde de pipoca, e a primeira mordida me trouxe uma sensação doce e confortável. Essas meninas, diferentes de tudo que eu conhecia, pareciam iluminar a sala com suas personalidades distintas.

De repente, me dei conta: apesar de toda a bagagem que eu trouxera comigo, a vida ali tinha começado.

Passar a noite com elas, rindo e jogando cartas, me trazia uma sensação leve, dessas que eu já nem lembrava. Estávamos envolvidas num jogo de perguntas e desafios, cada uma mais absurda que a outra. Houve uma hora em que Gen teve que pular pela sala como um macaco-prego, e o nosso riso tomou conta do quarto.

De repente, Regine me lançou um olhar provocador, acompanhada de um sorriso suspeito.

— América… — ela puxou, em um tom de brincadeira, com um toque desafiador — Qual o garoto mais quente da escola?

Todas se viraram para mim, esperando minha resposta, rindo e tentando adivinhar. Rolei os olhos, fazendo charme.

— Que tipo de pergunta é essa? — resmunguei, rindo, enquanto tentava fugir da resposta.

Mas, claro, elas não iam deixar barato.

— É o Carl, né, América? — Aicha adivinhou com um olhar malicioso.

Instantaneamente, as garotas explodiram em risadas e ficaram me olhando com aqueles olhares de "sabemos o que está acontecendo aqui". Eu não disse nada, apenas sorri, mas isso foi suficiente para elas começarem com seus comentários, murmurando "hummmm" como se estivéssemos na quinta série.

— É ele! — Merina declarou entre risadas, e as outras se aproximaram, me cercando como leões prontos para atacar a presa.

— Carl, hum? O que tem de interessante nele? — Gen perguntou, tentando puxar mais alguma coisa.

Respirei fundo, tentando pensar em uma resposta que não revelasse o que nem eu sabia direito. O que tinha de interessante nele? Bom, ele me lembrava Michel, meu ex-namorado, morto… mas dizer isso ali, naquele momento, era impossível. Também não era “atração” o que eu sentia. Era um tipo de conforto, como se ele fosse uma memória perdida que se materializava diante de mim.

— Ele tem… um cabelo bonito — disse por fim, sem graça, apenas para desviar. Era uma resposta simples, mas pareceu ser o suficiente, porque elas soltaram o ar e se afastaram, satisfeitas, ainda rindo e brincando.

A conversa logo seguiu, mas fiquei com a sensação de que, de alguma forma, eu realmente podia estar criando laços ali.

Por um momento, uma ideia desconcertante passou pela minha cabeça: será que eu estava me apaixonando pelo Carl? E não pelo Carl em si, mas pela maneira como ele lembrava Michel, alguém que ainda parecia tão presente em mim, impossível de superar. Era estranho me sentir assim, quase como se estivesse me apaixonando por uma lembrança, uma sombra do que Michel foi para mim.

A noite continuou, leve, cheia de risadas e bobagens. Depois dos jogos, decidimos fazer penteados umas nas outras. Regine começou a trançar meus cabelos com uma delicadeza que eu nem sabia que tinha; Aicha, que sempre falava sem parar, parecia um pouco mais quieta, talvez perdida em pensamentos, mas ainda estava ali, rindo com o canto da boca.

— Então, Selena ou Hailey? — Marine lançou a pergunta, referindo-se à esposa de Justin Bieber.

— Selena, é claro! — Gen respondeu sem hesitar, recebendo de volta um olhar julgador de Regine.

— Hailey! — ela rebateu, como se fosse uma escolha óbvia, levantando a sobrancelha com ar de quem tinha a resposta certa.

Era incrível como elas podiam transformar qualquer assunto em uma pequena disputa, e de repente todos estávamos rindo de novo.

— A Selena Gomez é o amor da vida do Justin, mas a Hailey é o amor pra vida dele! — Merina exclamou entre risadas, lembrando do meme que viralizou nas redes.

Não consegui me conter, uma risada instantânea escapou dos meus lábios. A atmosfera era tão leve e divertida, e eu me sentia tão bem ali, como se estivesse vivendo um episódio de Heartstopper, cheio de risadas e momentos de cumplicidade. Era estranho, mas de uma maneira muito boa.

Aicha começou a imitar a expressão de Justin quando estava em conflito entre as duas, o que fez todas nós explodirmos em gargalhadas. Cada piada parecia desvanecer os ecos de dor e perda que eu carregava, mesmo que por um breve momento. O calor da amizade e a alegria simples de estar rodeada de garotas incríveis criavam um espaço seguro, onde a dor do passado se tornava um sussurro distante.

As risadas se misturavam às vozes e ao cheiro de pipoca, criando uma sensação de pertencimento que eu não sabia que precisava tanto. Eu olhei para cada uma delas — Merina, Gen, Regine e Aicha — e percebi que, embora estivesse em um lugar novo e desconhecido, essas garotas estavam se tornando uma parte da minha nova história.


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⏰ Última atualização: Oct 27 ⏰

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