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História inspirada nas músicas "Aliança" de tribalistas e "Depois" da Marisa monte
..............................................................................................Uma senhora de cabelos grisalhos e curtos, vestido preto que vai até um pouco abaixo dos joelhos, sandálias ortopédicas e com um buquê na mão enrugada, caminha lentamente até parar em frente a um túmulo. Na lápide está escrito: "Lizzie dos Santos, o raio de sol depois da chuva. 1949 a 2024."
Aquele era o túmulo da amiga de Hanna, a senhora com o buquê, amiga de longa data e talvez um pouco mais do que apenas amiga.
- Oi, Lili, eu te trouxe flores, copos-de-leite, as suas preferidas. Como está hoje? Eu finalmente consegui vir te visitar, me desculpe pela demora. Lembra quando a gente se conheceu? Era verão, nos vimos pela primeira vez na sorveteria, pedimos o mesmo sabor de sorvete, morango com calda de limão.
A senhora se sentou no chão, mergulhada em memórias.
- A gente se tornou amiga na hora e começamos a crescer juntas. Lembra do dia que você perdeu seu primeiro dente de leite? Você chorou muito, então eu amarrei um barbante no meu dente e a outra ponta na porta e a fechei com tudo, só para perder um dente também e você não precisar chorar sozinha. Eu era tão boba... Lembra quando aprendemos a andar de bicicleta? Tenho até hoje a cicatriz no joelho depois de ter caído tanto. Oh, minha bela, éramos tão felizes.
A senhora olhava a lápide chorando, querendo Lizzie ali ao seu lado.
- Lembra de quando éramos adolescentes? Você se apaixonava tão rápido e tão intensamente que era facilmente iludida por qualquer um, e eu... bem, eu era a sua amiga, que te consolava toda vez que seu coração era partido. Consolo? É, parece que isso combina comigo. Lembra quando pintamos o cabelo pela primeira vez? Eu de preto e você de rosa. Eu mantive o preto até os brancos aparecerem, e você voltou para a cor natural... que era... eu não lembro. Faz tanto tempo que eu fui embora. Me desculpe, Lili, por ter ido, mas eu não podia ficar, não depois de tudo aquilo.
A senhora enxugava as lágrimas que caíam como uma cachoeira, chorando enquanto lembrava de tudo, lembrava de quando ela e Lizzie cantavam na garagem dos pais dela, com a pequena banda que tinham. Hanna era a guitarrista, Lizzie a vocalista. Kelly, uma terceira amiga da dupla, cuidava do teclado; a loira tinha conhecido as duas na escola. Na bateria estava Viviane, melhor amiga de Kelly. A garota negra não era só a baterista como também a mais velha das quatro.
- Lembra como você cantava bem? Você prometeu cantar comigo para sempre. Essa não foi a sua única promessa, né? Lembra quando eu te beijei? Eu me declarei aos 18 anos e te beijei. Foi meu primeiro beijo. Você correspondeu e depois ficou desesperada e saiu correndo. No dia seguinte, você disse que prometia não contar aquele "erro" para ninguém. Eu nunca chorei tanto na minha vida. Fui na casa de Viviane, e ela me disse a frase mais dolorosa que já ouvi: "Lizzie não veria problema em te namorar se isso não significasse namorar uma mulher." Na época eu fiquei com raiva, mas agora te entendo. Éramos jovens, e você nem se entendia.
Hanna não chorava mais; agora só falava.
- Lembra de quando fomos ao centro? Entramos em várias lojas. A gente entrou em uma que tinha vários itens de porcelana, e você viu dois pratos brancos com um galho cheio de flores rosas desenhadas e os amou na hora. Viu e me perguntou se nós seríamos amigas para sempre, e eu respondi: "Amigas? É claro, amigas para sempre." Lembro disso como uma piada sem graça, mas você ficou feliz com minha resposta e falou que um dia iríamos morar juntas e que aqueles pratos seriam nossos. Não aconteceu. Anos depois, você se casou com o Rodrigo. O engraçado é que ele era igual a mim: o mesmo cabelo preto, a mesma jaqueta de couro, as mesmas calças jeans, os mesmos coturnos, as mesmas camisetas de banda e a mesma marca de cigarro. Se eu não te conhecesse, diria que estava tentando me substituir. Você me imaginava no lugar dele, Lili? Eu fui sua dama de honra e madrinha de casamento, chorei bastante. Lembro da sua mãe dizendo que não sabia que eu chorava em casamentos; ela não sabia o motivo das minhas lágrimas. Eu peguei o buquê quando você jogou, copos-de-leite, iguais a esses que eu trouxe. Depois disso, eu não aguentei mais, eu tive que ir embora. E fui. Só deixei uma carta para você e entrei no trem. Desde então, não nos vimos mais. Falei com Viviane, e ela te entregou a carta, disse que você chorou e gritou perguntando: "Me diz que eu não cometi um erro?" A Vivi te respondeu dizendo que não podia mentir. Eu não acho que você cometeu um erro. Tá, eu sofri, você também, mas também fomos felizes. Você teve a sua família da forma que queria, e eu explorei o mundo da forma que eu queria. Também visitei Rodrigo. Ele disse que depois do casamento você foi abrir os presentes e o meu foi o primeiro: eram os pratos com flores que você gostou tanto. Ele disse que você ficou muito feliz com o presente e disse que eu era muito atenciosa, mas que nunca deixou ninguém usar os pratos. Eles ficaram em um suporte na estante da sala; você dizia que ia usá-los quando eu voltasse. Desculpa, a gente nunca vai usá-los. Oh, minha bela, eu me sinto cansada. Acho que vou deitar um pouco com você, tá bom?
Hanna deitou, fechou os olhos e não levantou mais. Morreu enquanto dormia, não sofreu e não sentiu dor, pelo menos não dor física. Talvez agora Lizzie e Hanna fiquem juntas e felizes.
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Espero que gostem, não é algo super empolgante, mas pode ser legal
Se puderem, me sigam no tt/ X
@ trizoliv15
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Memórias de um quase algo
RomanceHanna e Lizzie são amigas desde de sempre, mas conflitos internos e desejos reprimidos podem ser o motivo da separação delas