III. se enlouquecer não se apaixone.

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oii, boa noite!!!
demorou um pouquinho, mas aqui está...


POV PEDRO.

Acordei com a sensação de estar preso entre um sonho e a realidade, o mundo à minha volta ainda parecia enevoado, e minha cabeça pulsava de forma intensa, e dor e a confusão se espalhando pela minha mente. O desconforto se expandia para o corpo todo, que doía como se eu tivesse corrido por horas a fio, chegando ao limite da exaustão. Meus músculos pareciam rígidos e pesados, os movimentos lentos e cautelosos. Pisquei, forçando a visão a focar no teto abobadado acima de mim, uma estrutura familiar e reconfortante que me fez perceber que eu estava em meu antigo quarto na casa dos meus pais.

Ao redor, cada detalhe era como uma peça viva da memória. O espaço amplo com sua imponente cama de casal de dossel, os tecidos pendendo das laterais, formando uma moldura que parecia intocada, como se tivesse sido planejada para uma pintura renascentista. As paredes eram um espetáculo de decoração neoclássica: na parte inferior, madeira de um verde pálido, elegante e sofisticado; acima, boiseries de um tom off-white suave emolduravam as paredes. Olhei para as cortinas, pesadas e robustas, com seus bordados detalhados cheios de flores e folhagens que pareciam saídas de um jardim oriental, inspiradas nas tapeçarias chinesas que minha mãe tanto adorava.

E por falar nela, estou com tanta saudade. Esse quarto me traz uma nostalgia gostosa a respeito da minha infância, especialmente pelo lustre, o ponto alto do ambiente. É uma peça encantadora, com pendentes de vidro translúcido em formato de luas, com suas camadas delicadas, representando cada fase. Quando criança, eu gostava de deitar e observar como a luz refletia ali, criando pequenas sombras que dançavam no teto amadeirado.

Respirei fundo, sentindo o leve cheiro de madeira misturado com o perfume discreto das flores que sempre adornavam algum canto do quarto. O peso dos cobertores era um pouco sufocante, mas, à medida que fui me livrando deles, senti que meu corpo estava até que bem descansado. Estranho, sempre que bebo muito eu acordo destruído. Quando coloquei os pés descalços no chão de linóleo escuro e polido, o toque congelante ajudou a despertar o que restava de minha mente nebulosa. Foi então que, como fragmentos rebeldes, as lembranças da noite anterior começaram a se formar, em flashes assustadoramente confusos.

João Romania. Minha mente invariavelmente se voltou para ele: lembrei-me de seu sorriso de canto e do seu corpo ao meu lado, me segurando firme, envolvido por seu cheiro tão intenso que parecia uma droga. Me recordei do broche que ele colocou em minha lapela e a forma como todos me olhavam, como se eu fosse sua mais nova propriedade. Senti minhas bochechas esquentarem quando me lembrei de um comentário específico feito por uma senhora indiscreta que eu mal conhecia: "Você ganhou na loteria, meu jovem... se eu fosse você não perderia tempo e engravidaria o quanto antes. Só pra garantir, sabe?"

Será que é isso que todos estão pensando de mim?
Que eu sou um aproveitador que só quer uma oportunidade para dar o golpe da barriga?
Isso nem faz sentido, minha família não é pobre. Somos ricos. Só não somos milionários que nem os Romania, mas isso é só um detalhe, certo?

Perdi um tempo sentado olhando para o nada tentando me recordar de todos os fatos da noite passada, mas depois de uma certa taça de champagne a noite se tornou um borrão. Eu devia ter me mantido apenas no ponche. Por mais que tentasse, não conseguia remeter cada detalhe com exatidão em seu devido lugar, eram como peças de um quebra cabeças confuso demais para eu conseguir organizar.

Contudo, pequenos flashes vinham à tona: minha tentativa de pegar mais uma taça de champanhe enquanto o Romania me impedia, o calor que tomou conta de mim depois de beber demais, e a memória confusa de João falando algo muito próximo de mim, um toque breve e proibido em sua boca. Será que sonhei que nossos lábios se tocaram? O pensamento me encheu de um nervosismo indefinível, pois o mero vislumbre da lembrança era suficiente para me fazer questionar se tudo nessa noite não passara de um delírio. A maciez de seus lábios, mesmo em uma lembrança fragmentada, parecia tão real que me inquietava.

PEJÃO | HEAT • ABOOnde histórias criam vida. Descubra agora