Capítulo 4

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O último sinal do dia tocou, e Louis saiu da escola com passos cuidadosos, sentindo as dores dos hematomas sob as roupas.

O caminho para casa era uma mistura de alívio e apreensão.

Por um lado, a escola, com Justin e sua turma, ficava para trás. Por outro, ele se aproximava de um ambiente igualmente hostil.

Chegou em casa e abriu a porta com cuidado, o som dos rangidos ecoando na sala vazia. Como sempre, não havia ninguém ali para recebê-lo.

Seu pai, Mark, passava a maior parte do tempo em algum bar, afundado entre garrafas vazias. E quando estava em casa, ele fazia o inferno de Louis.

Louis fechou a porta, tentando fazer o mínimo de barulho possível. Ele havia aprendido que era melhor não chamar a atenção do pai. Qualquer som poderia ser o suficiente para atrair a ira dele, e ele não estava em condições de enfrentar mais uma rodada de gritos ou agressões. Subiu as escadas e foi direto para o banheiro, trancando a porta atrás de si.

Ele tirou a roupa devagar, franzindo o rosto ao ver as marcas novas que Derek e Justin tinham deixado. Observou-se no espelho, analisando o corte no lábio e a mancha arroxeada que começava a aparecer no rosto.

Louis pegou a pomada no armário e começou a aplicá-la nos machucados, mesmo tocando da forma mais suave que conseguia, ele ainda sentiu a dor ardente quando seus dedos tocaram os machucados. Ele mordeu os lábios, tentando ignorar.

Enquanto cuidava das feridas, flashes do passado surgiram em sua mente. Sua mãe sempre cuidava dele quando se machucava. O fazia carinho e logo em seguida cozinhava seu prato favorito... Louis sentia falta dela. Muita.

Louis fungou, limpando as lágrimas. Sentia-se mais sozinho do que nunca.

Ele tinha apenas 10 anos quando sua mãe morreu. Era sua lembrança mais clara e dolorosa, a perda que marcara o começo de tudo. Desde então, vivia com seu pai, que, ao longo dos anos, se tornara um homem amargo, oprimido por uma tristeza que ele transformava em ódio e agressividade.

No início, as ofensas de Mark eram apenas palavras, jogadas com amargura. Mas quando Louis decidiu ser honesto sobre sua sexualidade, e seus gostos, o pai transformou as palavras em golpes.

A primeira vez que Louis se assumiu para o pai, ele já sabia que não seria fácil. Estava ciente de que Mark não aceitaria bem a notícia. Mas nada poderia ter preparado Louis para a reação brutal que viria.

Naquele dia, quando Mark entendeu o que Louis tentava dizer, ele ficou em silêncio, os olhos carregados de um desprezo que Louis jamais havia visto. Sem qualquer aviso, seu pai partiu para cima dele, os golpes firmes e violentos atingindo seu rosto e corpo. Louis sentiu o mundo escurecer, e quando acordou, estava sozinho, deitado em uma poça de seu próprio sangue, o rosto inchado e o corpo dolorido.

Ele tinha 14 anos.

Aquela foi a primeira vez que Louis conheceu o que era ser ferido fisicamente por alguém que deveria protegê-lo.

Mas, apesar de tudo, ele se recusava a ceder. As palavras de sua mãe ecoavam em sua mente. Ela sempre dizia que ele era especial, que não deveria ter medo de ser quem era.

Mesmo criança, Louis lembrava daquela promessa. Sua mãe lhe fizera prometer que nunca esconderia sua essência, que viveria a verdade, mesmo que fosse difícil. E Louis estava determinado a honrar isso, apesar de toda a dor.

Sabia que algum dia aquilo iria acabar. Louis passaria por tudo aquilo e realizaria seus sonhos.

Ele só precisava ser paciente e aguentar tudo.

Suspirou, deixando a água do chuveiro escorrer pelo corpo e lavar um pouco da angústia que o cercava.

Ele se limpou com cuidado, tentando remover os resquícios do dia. Depois de se secar, vestiu uma camiseta velha e foi para o quarto, onde tentaria se concentrar nos deveres da escola.

****
Na manhã seguinte, Louis acordou cedo e foi para a escola, enfrentando a rotina pesada de sempre. Quando chegou, manteve a cabeça erguida, ignorando os olhares de pena ou desprezo dos outros alunos. Ele já estava acostumado com os comentários e risos contidos que o cercavam.

Ao longo das aulas, ele se pegou observando Harry. O novo aluno parecia alheio a tudo ao seu redor, com um ar de indiferença que intrigava Louis.

Ele nunca olhava diretamente para ninguém, nunca parecia se importar com o que os outros diziam. Havia algo de desafiador naquela indiferença, algo que despertava a curiosidade de Louis.

Quando o sinal do intervalo tocou, Louis decidiu ficar na sala, sem vontade de enfrentar o refeitório e as pessoas.

Puxou seu caderno de desenhos e começou a rabiscar, criando formas e rostos enquanto o tempo passava. Não notou que Harry também permanecera na sala até que ouviu o som de passos se aproximando.

Ele levantou a cabeça e viu Harry parado ao lado de sua mesa, com as mãos nos bolsos e uma expressão neutra.

— Por que não sai para o intervalo? — Harry perguntou, a voz baixa.

Louis deu de ombros, voltando os olhos para o caderno. — Prefiro ficar aqui.

Harry permaneceu em silêncio por alguns segundos, observando-o. Louis estava cheio de hematomas.

— Você parece atrair problemas — ele disse finalmente, como se fosse uma simples constatação.

Louis riu, um riso seco. — Eu não tenho culpa de querer viver sendo eu mesmo. — Deu de ombros.

Harry assentiu, como se entendesse, mas havia algo em seu olhar que Louis não conseguia decifrar. Depois de um longo silêncio, Harry se inclinou um pouco, mantendo o olhar fixo em Louis.

— Eu posso proteger você desses idiotas, se quiser — disse, direto.

Louis franziu o cenho, surpreso com a proposta repentina. — Por que você faria isso?

Harry deu um leve sorriso, um sorriso que não chegava aos olhos. — Porque eu achei você interessante. Você daria uma boneca perfeita.

Louis o encarou, uma mistura de incredulidade e inquietação crescendo dentro dele. Havia algo perigoso e tentador na forma como Harry falava, algo que fazia seu estômago revirar.

— O que você quer dizer com isso?

Harry inclinou-se um pouco mais, a voz quase num sussurro. — Você seria meu, Tomlinson. E, em troca, ninguém jamais tocaria em você de novo.

A sala ficou em um silêncio intenso. Louis sentiu o ar faltar por um segundo, o coração batendo acelerado.

The Perfect Doll {I'm not fine... help me}Onde histórias criam vida. Descubra agora