EPÍLOGO

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A chuva caía fina, um véu cinzento que cobria o cemitério. O som das gotas contra o mármore frio era a única coisa que quebrava o silêncio ao meu redor. Eu estava parado ali, diante do túmulo dela, como já fiz tantas vezes. Como sempre farei.

Mariana Almeida Morante. O nome gravado na pedra parecia uma ironia cruel. O sobrenome dela era meu, mas nunca mereci o privilégio de tê-la como minha esposa. A inscrição abaixo me cortava ainda mais fundo: "Amada por todos, perdida para o amor."

Minhas mãos seguravam um buquê de flores vermelhas, as favoritas de Mariana. Era algo tão pequeno, tão insignificante, comparado ao que eu gostaria de oferecer. Mas era tudo o que eu tinha agora. Com os dedos trêmulos, coloquei as flores cuidadosamente sobre a lápide, como se temesse perturbá-la.

— Oi, Mariana. — Minha voz saiu baixa, quase um sussurro. — Faz tempo que eu não venho aqui... mas você sabe que nunca me afasto por muito tempo.

A chuva molhava meu cabelo, meu rosto, mas eu não me importava. O peso que carregava era mais sufocante do que qualquer tempestade.

— Eu construí mais coisas, sabia? O império que você dizia que eu já tinha... agora é ainda maior. Tenho mais dinheiro do que jamais imaginei. Mais poder. Mais controle. — Dei uma risada amarga, desviando o olhar da lápide. — Mas não significa nada. Nunca significou nada, não sem você.

A garganta apertou, as palavras ficando presas. Pisquei, tentando conter as lágrimas, mas a lembrança dela era um golpe constante.

— Você era a única pessoa que me fazia sentir vivo, Mariana. Agora tudo parece... vazio.

Eu me ajoelhei, o buquê ainda fresco diante de mim, enquanto a dor que sempre carreguei se manifestava em lágrimas que não consegui conter.

— Eu matei você. — As palavras saíram como veneno, corroendo tudo em mim. — Fui eu. Não Lorenzo, não ninguém. Ele só mexeu na ferida que eu já carregava. Minha paranoia, minha maldita incapacidade de confiar...

Fechei os olhos, mas a imagem dela, naquela noite, voltou com força. O sangue manchando o tapete, o olhar dela cheio de dor, mas não de ódio. Nem mesmo em seus últimos momentos ela me odiou.

— Você estava grávida. — Minha voz quebrou. — Do nosso filho. Eu arranquei isso de nós dois. Arranquei sua vida, arranquei tudo o que poderíamos ter tido.

Toquei a aliança que ainda usava no dedo. Nunca a tirei. Nunca consegui.

— Eu penso muito em como seria... nossa vida juntos. Nosso filho correndo por aí, sua risada enchendo a casa. Mas tudo isso é só um sonho agora. Um sonho que eu destruí.

A chuva escorria pelo meu rosto, misturando-se com as lágrimas. Olhei para o céu, as nuvens pesadas refletindo o caos dentro de mim.

— Eu nunca poderei corrigir isso, Mariana. Nunca poderei me perdoar. Eu vivi todos esses anos tentando construir algo grande o suficiente para apagar o que fiz, mas tudo o que consegui foi criar um império vazio. Você era meu tudo. E eu acabei com isso.

Fiquei em silêncio por alguns minutos, deixando o vento levar minhas palavras. A dor era tão antiga quanto o amor que ainda queimava dentro de mim.

— Eu te amei. Amo você. Sempre amarei. — Beijei a lápide, a sensação gelada da pedra um lembrete cruel de que ela nunca mais me ouviria.

Levantei-me, com o coração pesado como sempre, e dei alguns passos para trás. Olhei uma última vez para o túmulo antes de virar as costas.

A chuva aumentou, mas eu não me importei. No fundo, sabia que aquele seria meu destino: viver na sombra do que poderia ter sido, carregando o peso de escolhas que não posso desfazer.  

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