As noites mal dormidas, a obsessão crescente, os jogos mentais... tudo culminou naquele momento. Eu não sabia ao certo o que me levou até aquele lugar isolado, uma casa de campo que eu raramente usava. Era onde Mariana havia dito que passaria a tarde, "precisando de um tempo para trabalhar em paz". Mas, para mim, tudo aquilo soava como uma desculpa. Um disfarce.
O céu estava tingido de um cinza pesado, as nuvens densas pareciam espelhar o caos na minha mente. Ao estacionar o carro, vi o dela já parado na entrada. O coração batia tão rápido que eu mal conseguia respirar. Entrei sem hesitar, a raiva crescendo a cada passo.
Ela estava no salão principal, sentada em uma poltrona próxima à lareira, um livro no colo. Quando me viu, levantou-se imediatamente, surpresa.
— Victor? O que você está fazendo aqui? — perguntou, seus olhos arregalados.
Havia algo no tom da voz dela, algo que eu interpretei como nervosismo, mas talvez fosse apenas cansaço. Eu já não sabia distinguir.
— Me diga você, Mariana. O que está fazendo aqui? Sozinha. Isolada. Ou deveria dizer... acompanhada? — As palavras saíram como lâminas, cortantes e amargas.
Ela piscou, confusa.
— O que está acontecendo com você? Eu vim para cá porque precisava de um tempo para trabalhar longe da cidade, longe de tudo.
De tudo. Aquelas palavras me atingiram como um golpe.
— Longe de mim, você quer dizer? — retruquei, cruzando os braços. — Ou será que estava esperando alguém? Talvez aquele 'amigo' que você insiste em dizer que é só isso?
Mariana deu um passo à frente, os olhos brilhando com algo entre tristeza e indignação.
— Amigo? Você está me seguindo agora, Victor? — Ela balançou a cabeça, incrédula. — Isso não é sobre mim, é? Isso é sobre o que está acontecendo dentro de você.
— Não tente virar isso contra mim, Mariana! — gritei, a voz ecoando pelo salão vazio. — Eu sei o que você está fazendo. Eu sei que está me traindo.
Ela deu um passo para trás, como se minhas palavras a tivessem atingido fisicamente.
— Você perdeu completamente o juízo — disse ela, a voz tremendo. — Eu nunca te traí, Victor. Nunca! Tudo o que eu fiz foi te amar, mesmo quando você se fecha, mesmo quando se recusa a confiar em mim.
Mas suas palavras, por mais sinceras que parecessem, eram abafadas pelo ruído em minha mente. Cada gesto, cada palavra dela nos últimos meses agora parecia suspeito.
— E espera que eu acredite nisso? — Eu avancei, sem me dar conta do quão ameaçador meu tom havia se tornado. — Você acha que pode me enganar, Mariana? Eu sei exatamente como esse mundo funciona. Você pode manipular os outros, mas não a mim.
Ela olhou para mim com lágrimas nos olhos, mas também com raiva.
— Eu não estou manipulando ninguém! É você quem está destruindo isso, Victor. Você e sua maldita obsessão por controle, por traição. Desde quando amar você virou um crime?
Houve um silêncio, pesado e cortante, enquanto ela se aproximava, encarando-me de perto.
— A pergunta é: você ainda me ama, Victor? Ou essa desconfiança já tomou o lugar de tudo?
Por um segundo, só um segundo, a dúvida em meus olhos deve ter dado a resposta. Mariana suspirou, balançando a cabeça, sua expressão uma mistura de dor e frustração.
— Eu não posso lutar contra você e seus demônios ao mesmo tempo — disse ela, a voz baixa, como se estivesse desistindo.
Algo dentro de mim se quebrou. Não era uma confissão. Não era a verdade que eu esperava. Era um espelho que ela havia segurado para mim, mostrando no reflexo o que eu estava me tornando. Mas ao invés de encarar isso, ao invés de me render à possibilidade de que eu estava errado, meu orgulho assumiu o controle.
— Vá em frente, Mariana. Continue fingindo ser a vítima. Continue me dizendo que sou o louco aqui. Mas saiba disso — minha voz baixou, sombria —, se você está mentindo, se eu descobrir que tudo isso foi uma farsa, eu não vou perdoar.
Ela não respondeu. Apenas ficou ali, imóvel, enquanto as lágrimas finalmente escorriam pelo seu rosto.
E eu, em vez de confortá-la, em vez de pedir desculpas, virei as costas e saí.
A porta se fechou atrás de mim com um estrondo, mas o eco que ficou foi o som do que nós dois sabíamos: algo essencial havia se rompido entre nós. E, desta vez, talvez não houvesse volta.
A raiva tem um jeito de nos transformar em algo que juramos nunca ser. E naquele momento, eu era mais uma sombra do que homem. As palavras de Mariana, seus apelos, pareciam ecos distantes, abafados pelo rugido ensurdecedor do ciúme que tomava conta de mim.
Ela estava parada na minha frente, seus olhos arregalados, úmidos de lágrimas, tentando desesperadamente explicar.
— Victor, por favor, me escute! Tudo isso é uma mentira! Não há ninguém além de você! Eu nunca... nunca faria isso com você! — Sua voz falhava, entrecortada por soluços.
Eu não queria ouvir. Não podia ouvir. Cada palavra dela parecia um desafio à minha raiva, um teste àquela narrativa venenosa que Lorenzo havia plantado.
— Mentirosa! — gritei, cortando sua explicação. — Não se atreva a me tratar como um idiota, Mariana! Você acha que eu não sei? Você acha que eu não vejo?
Ela deu um passo para trás, as lágrimas agora escorrendo livremente por suas bochechas.
— Ver o quê, Victor? Sua própria paranoia? É isso que você está vendo? Porque não há nada para esconder! Não há ninguém além de você na minha vida! — Sua voz agora era de desespero, mas também de indignação.
— Pare! — gritei novamente, avançando um passo. — Pare de mentir para mim! Eu confiei em você, Mariana. Eu te dei tudo, e é assim que você me retribui?
Ela segurou o rosto com as mãos por um momento, tentando se recompor. Então me encarou novamente, a dor em seus olhos se misturando com uma determinação que me desarmou por um instante.
— Eu te amo, Victor. Mas você está se destruindo. Não fui eu quem colocou essas dúvidas na sua cabeça. Não fui eu quem escolheu acreditar nelas.
Mas a raiva era como uma tempestade. Eu não podia pará-la.
— Claro, sempre tão inocente. Sempre tão perfeita — eu disse, com sarcasmo pingando de cada palavra. — Você aprendeu bem a jogar, Mariana. Deve ter sido fácil, me fazer acreditar que você era diferente.
Ela balançou a cabeça, incrédula, como se estivesse vendo alguém que não reconhecia.
— Victor, o que fizeram com você? Quem colocou essas ideias na sua cabeça? Você não é esse homem. Você não é assim.
Eu ri, um som seco e amargo, completamente diferente de qualquer risada que ela já tinha ouvido de mim.
— Eu sou exatamente quem sempre fui, Mariana. Um homem que não aceita traições. Um homem que não tolera mentiras.
Ela tentou se aproximar, colocando as mãos nos meus braços, mas eu me afastei bruscamente, como se seu toque fosse ácido.
— Victor... você está sendo manipulado. Não por mim, mas por alguém que quer nos destruir. Por favor, olhe para mim. Você sabe que estou dizendo a verdade. Você sente isso.
Por um breve momento, algo dentro de mim vacilou. Seus olhos me encaravam, implorando, honestos como sempre foram. Eu quis acreditar. Quis admitir que talvez eu estivesse errado. Mas a raiva e o orgulho ainda eram mais fortes.
— Acabou, Mariana. Eu não posso confiar em você.
Essas palavras. Elas saíram como facas da minha boca, cortando tudo o que construímos juntos. E, no momento em que as disse, vi algo mudar nela. Mariana parou de chorar. Sua postura se endireitou, e ela respirou fundo, como se estivesse aceitando uma derrota que não deveria ser sua.
— Se é assim que você quer... — disse ela, sua voz agora quase inaudível, como se estivesse falando mais para si mesma do que para mim.
Ela deu meia-volta e saiu, cada passo ecoando no silêncio cortante da sala. Eu fiquei parado, observando-a ir, incapaz de mover um músculo. Parte de mim queria correr atrás dela, segurá-la, pedir desculpas, implorar que ficasse.
Mas eu não fiz nada.
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Sementes de Vingança
Historia CortaVictor Morante é um bilionário poderoso, CEO de uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, e filho de um mafioso com conexões perigosas no submundo. Acostumado a comandar todos os aspectos de sua vida com frieza e controle, ele vê sua rotina i...