Além das sombras

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Os Segredos no Baú

O som do relógio da sala ecoava pela casa silenciosa enquanto Clara Belmonte terminava de limpar o sótão empoeirado. Era um trabalho que sua tia Augusta, com a usual severidade, havia imposto naquela manhã. "Se tiver tempo para ler romances, tem tempo para limpar a casa", dissera ela.

Clara suspirou, erguendo a lâmpada para iluminar o espaço cheio de caixas e móveis antigos. Apesar do incômodo da tarefa, ela adorava explorar o passado escondido nesses objetos esquecidos. Cada item parecia contar uma história, e Clara nunca resistia à tentação de imaginar a vida de quem os possuíra.

Ao afastar uma velha cadeira de balanço, ela notou algo diferente. Um baú pequeno e de aparência delicada estava meio enterrado sob uma pilha de panos desgastados. Suas ferragens douradas estavam gastas pelo tempo, mas o baú parecia guardar algo importante.

Curiosa, Clara se ajoelhou e tentou abrir a fechadura, que cedeu com facilidade surpreendente. Dentro, encontrou uma pilha de papéis amarelados e cuidadosamente dobrados. Ao pegar a primeira folha, percebeu que era uma carta escrita com uma caligrafia elegante, mas com traços de urgência.

"Minha querida Anna,
Nunca desejei que as coisas chegassem a este ponto, mas sei que nosso amor jamais será aceito. A promessa que me obrigaram a fazer me pesa como um fardo insuportável. No entanto, se você acreditar em nós, eu estarei lá, sob as rosas do jardim, à meia-noite."

Clara sentiu o coração acelerar. Anna era o nome de sua mãe, que ela mal conhecera antes de sua morte precoce. Quem teria escrito algo tão apaixonado para ela? E por que essas cartas estavam escondidas aqui, no sótão que a tia Augusta mantinha trancado por tantos anos?

Virando-se para pegar mais cartas, Clara ouviu os passos apressados de sua tia subindo a escada. Sem pensar duas vezes, ela escondeu o pacote sob a saia. A porta do sótão se abriu com um rangido.

— Clara, você ainda está aí? O que está demorando tanto? — perguntou tia Augusta, franzindo a testa.
— Desculpe, tia. Estou quase terminando — respondeu Clara, tentando manter a voz firme.
— Pois apresse-se. Temos visitas importantes esta noite, e quero que você esteja apresentável.

Com um aceno autoritário, tia Augusta se retirou, deixando Clara sozinha novamente. Ela soltou o ar que nem percebera estar prendendo.

A mente de Clara já fervilhava de perguntas. Quem era o autor da carta? E por que sua mãe parecia ter vivido um romance tão diferente da vida simples e disciplinada que sempre lhe haviam contado?

Enquanto descia as escadas, as cartas escondidas sob o avental, Clara sabia de uma coisa: sua vida estava prestes a mudar.

Além das SombrasWhere stories live. Discover now